Reproduzo
uma entrevista com
o historiador israelense dissidente Ilan Pappé, publicada pelo site
Operamundi.
Ele é um dos “historiadores revisionistas” de Israel, que reescreveram a
história
da independência do país em 1948 à luz da expulsão de quase 700 mil
palestinos
da região.
A Palestinian man looks through a hole at his destroyed housein the
West Bank town of Hebron. REUTERS/Nayef Hashlamoun OP/AA MIDEAST
HEBRON Photo by NAYEF HASHLAMOUN
Pouco conhecido no Brasil, Pappé tem se dedicado a escrever
sobre a
exclusão sistemática do povo palestino pela política expansionista de
sucessivos governos do Estado de Israel.
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The Israelis passed through town today. A family checks out the safety level of their home. |
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Palestinian Christian prayers during their mass on Sunday in the
Church of the Nativity in the West Bank city of Bethlehem. REUTERS/Nayef Hashlamoun |
O historiador renunciou à
cidadania israelense
por se opor à política opressiva do Estado de Israel em relação aos
palestinos.
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A Palestinian boy looks at Israeli soldiers who stopped Palestinian
worshipers to enter the Ibraheemi mosque for the last Friday pray of
the holy month of Ramadan in the West Bank city of Hebron. Several
thousand Palestinians pray in the Ibraheemi mosque under Israeli
soldiers control in the last Friday pray of the holy month of Ramadan.
The Muslim festival of Eid-al-Fitr is then celebrated at the end of
Ramadan. REUTERS/Nayef Hashlamoun |
Ele faz o que Walter Benjamin recomendava aos historiadores:
"fazer a história a contrapelo", incluindo a versão dos vencidos.
Aqui,
o texto da entrevista:
“O historiador israelense
Ilan Pappé mudou a forma como a história de Israel é contada. Após a publicação
do livro The Ethnic Cleasing of
Palestine, em 2006, as
discussões sobre a criação do país, em 1948, não foram mais as mesmas.
An Israeli soldier shouts at a woman preventing her to walk back home.
Photo by Nayef Hashlamoun
A versão
oficial israelense, cunhada na máxima “uma terra sem povo para um povo sem
terra”, ganhou um adversário forte o suficiente para ter dificuldades de
se sustentar.
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O êxodo dos palestinos em 1948 |
De acordo com Pappé, foi
cultivada a impressão de que o que ocorreu na década de 40 foi a criação de um
país para os judeus numa terra quase ou completamente desabitada, em paz e
harmonia com o povo palestino, se apenas este assim desejasse.
An Israeli soldier stand guards detained Palestinians in the West Bank
city of Hebron. REUTERS/Nayef Hashlamoun
Porém, usando documentação
histórica, Pappé sustenta que a ideia de eliminar a Palestina de sua população
nativa, dos árabes, surgiu como um conceito claro nos anos 1930 e foi
idealizada por David Ben Gurion, posteriormente primeiro-ministro de Israel. E
segue até hoje.
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Jerusalem Arches |
Mais tarde, Pappé
escreveu outros estudos, entre eles The Forgotten Palestinians: a history of
the Palestinians in Israel. Em entrevista exclusiva ao Opera
Mundi, Pappé falou sobre o atual estágio da questão palestina e a
criação de um único Estado para palestinos e israelenses na terra onde ele
nasceu, mas onde já não vive. Pappé leciona no Reino Unido desde 2007.
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An Israeli soldier poins his gun at a Palestinian man during imposing
an Israeli curfew in the occupied West Bank city of Hebron.
REUTERS/Nayef Hashlamoun |
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A social worker visits an orphanage run by the Palestinian Red
Crescent Society in the West Bank city of Tulkarem. (Mouid Ashqar,
Maan Images) |
OM: Como o senhor
analisa o atual estágio da questão palestina? Com os assentamentos e o avanço
do controle de Israel sobre os Territórios Ocupados, quais as chances de uma
solução de dois Estados, com a criação de um palestino na Cisjordânia e Gaza?
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Radiance. A Palestinian student girl Fida' al-Rujoub attends her lectures at
Hebron University after seven months of Israeli closure of her
University in the West Bank city of Hebron August 16, 2003. The
Israeli army gave allowed to reopen Hebron University and Palestine
Polytechnic University after they had closed them on last January 11
in Hebron city by Israeli military order. REUTERS/Nayef Hashlamoun
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IP: A situação
atual é em grande parte a continuação dos anos mais recentes. Não há nenhum
movimento na sociedade, qualquer que seja, o que permite a Israel aprofundar e
expandir o projeto de assentamentos na Cisjordânia e na área da Grande
Jerusalém.
Palestinians observe the bodies of boys Ahmed Abu Zbeida and Zaher
al-Majdalawi, killed while playing with kites in the Gaza Strip.
(Wissam Nassar/MaanImages)
Cada expansão faz com que a ideia de dois Estados seja cada dia mais
irreal.
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Checkpoint |
OM: No longo prazo, a solução
de um Estado parece mais provável?
IP: Sim. Já há a
solução de um Estado, mas sob o regime da colonização, apartheid e discriminação.
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Such beauty. A Palestine woman |
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A Palestinian vegetable grower displays some of the produce he can no
longer sell because the West Bank separation wall blocks him from his
former market. (Edward Parsons, IRIN) |
A
resistência pacífica não violenta, de um lado, e uma forte pressão externa, de
outro, podem ajudar e transformar a base da relação árabe-judaica na terra.
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Palestine drawing for healing. Photo by Raken Hashlamoun |
OM: Discute-se a resistência
dentro dos Territórios Ocupados. Porém, há a possibilidade de uma Terceira
Intifada (levante popular) começar com os palestinos de Israel, os
árabe-israelenses?
On becoming a widow. A Palestinian woman mourns the loss of her husband in Hebron (Al
Khalil). REUTERS/Nayef Hashlamoun
IP: É um cenário
provável. O nível de afirmação, especialmente entre a juventude palestina de
Israel, tem aumentado muito nos últimos anos. Por outro lado, as políticas
étnicas opressivas destinadas à minoria palestina dentro das fronteiras de 1967,
vindas do governo de Benjamin Netanyahu, nunca foram tão ruins como hoje,
complementadas por uma série de legislações racistas contra esses cidadãos.
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Apartheid looks like this. An Israeli soldier prevents Palestinians from passing Beit Iba
checkpoint, during a demonstration against Israeli checkpoints near
the West Bank city of Nablus. |
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Apartheid looks like this. An Israeli soldier prevents Palestinians from passing Beit Iba
checkpoint, during a demonstration against Israeli checkpoints near
the West Bank city of Nablus. |
Se
forem levadas em conta as áreas das comunidades palestinas dentro do Estado
acometidas pela pobreza - onde pequenos crimes crescem a um passo alarmante –,
é possível ver os fatores que podem ser a ignição para o levante.
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The way to school in Hebron. Photo by Nayef Hashlamoun |
OM: Para se chegar a qualquer
solução, o que aconteceu em 1948 precisa ser abordado (Pappé descreve a criação
de Israel como um processo de limpeza étnica, com a expulsão de milhares de
palestinos por coerção e meios violentos)?
IP: Sim. Não é
apenas o que Israel fez. Ou que não permita o retorno dos refugiados, ou que
não pague compensação. É também o fato de que as políticas de limpeza étnica
israelenses continuam até hoje.
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Two Israeli soldiers detain a Palestinian man in Hebron. Photo by Abed
Hashlamoun |
Dessa forma, se o que aconteceu em 1948 for
reconhecido, condena as políticas de Israel desde então e pode, através disso,
dar um fim a elas.
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Israeli soldiers prevent Palestinian schoolboys to pass in their way
back homes during a military operation to arrest Palestinians and
search houses in their neighborhood of Issa in the West Bank city of
Hebron. REUTERS/Nayef Hashlamoun |
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Jovem palestino contra tanque na primeira Intifada |
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Downtown Ramallah |
OM: Uma grande
quantidade de conhecimento foi produzida por acadêmicos nos últimos 25 anos com
novas informações sobre o conflito, que contradizem a versão oficial. Qual o
legado desses novos historiadores, o senhor incluído, para Israel e para a
questão palestina? É possível falar de uma ideologia pós-sionista?
IP: Até o momento,
os novos historiadores falharam em mover a sociedade judaica em Israel em
direção a uma compreensão e abertura sobre a questão palestina. A maior
contribuição foi legitimar a versão palestina, que por anos foi negada e
tratada como completa mentira.
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Photo by Nayef Hashlamoun: Israeli soldiers stand guard at the
entrance of a detained Palestinian family’s home while the Israeli
army searches their house in the West Bank city of al-Khalil (Hebron). |
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A Palestinian girl practices playing the violin at a cultural center
for children in the West Bank city of Ramallah. (Osama Silwadi, Apollo
Images) |
Não há uma ideologia pós-sionista. Há um
pequeno, mas crescente movimento antissionista dentro de Israel. O tempo dirá
se irá se tornar significante.
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Palestinian children in traditional dress smile during a wedding in
the West Bank village of Bil'in. (Osama Silwadi, Apollo Images)
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OM: Na abertura de The
Forgotten Palestinians, de 2011, o senhor reflete sobre sua própria vida. Qual
é o significado de Israel? O senhor se imagina voltando para um país “melhor”?
IP: Israel é meu
país e eu desejo voltar, ajudar a mudá-lo de dentro. Mas eu discordo sobre a
divisão de país e Estado. Um país é um dado: é o lugar onde nasci, pelo qual
meus sentimentos são muito fortes. Eu tenho problemas com Israel, o Estado. Eu
sonho e trabalho para que tenhamos uma mudança de regime – no qual haja a
promessa de igualdade a todos.
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A Palestinian man picks grapes near his home in the Gaza Strip. (Wesam
Saleh, Maan Images) |
Quero que o nome do país mude no processo, ou
mesmo que retorne ao que tinha antes de Israel ser estabelecido: Palestina.
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Church of the Nativity in Bethlehem |
Eu
não sou desencorajado por isso. Na África do Sul, tal transição foi marcada por
uma nova bandeira e hino.
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Palestinian Christians light candles in the grotto under the Church of
the Nativity, faithfully believed to be the birthplace of Jesus Christ,
in the West Bank city of Bethlehem.Add caption |
Em Israel e Palestina, as mudanças terão que ser
muito mais fundamentais e profundas, mesmo no nível simbólico, se a paz vier a
ser alcançada.
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