terça-feira, 5 de março de 2013

VENEZUELA DESVALORIZA A SUA MOEDA E O PIG INTERNACIONAL CAI MATANDO



O ministro do Planejamento e das Finanças da Venezuela, Jorge Giordani 
á uma série de distorções e problemas com a economia venezuelana, mas eles não representam uma ameaça sistêmica

A desvalorização monetária da Venezuela provocou um bocado de discussões na imprensa internacional. A oposição venezuelana naturalmente a classificou como um ato desesperado para desviar um colapso econômico inevitável.
O argumento da oposição, apoiado pela maior parte da mídia internacional (que confia nas fontes da oposição), é o seguinte: a Venezuela teve de desvalorizar sua moeda porque o governo está sem dinheiro. Mas a desvalorização monetária é pequena demais e chega tarde demais, a inflação vai fugir do controle, vão acontecer mais desvalorizações e mais dinheiro vai deixar o país e o governo vai quebrar e colapsar.


Os oponentes do governo venezuelano estão esperando por uma espiral de “inflação-desvalorização” que vai ajudar a derrubar o governo. Nesse cenário, a desvalorização aumenta os custos da importação, dando combustível para a inflação; com preços mais altos, a moeda é mais superavaliada em termos reais, e outra desvalorização acontece, e assim por diante. Conforme as pessoas perdem a confiança na moeda, mais pessoas trocam sua moeda doméstica por dólares, o que pressiona ainda mais a desvalorização e faz com que o país esgote as suas reservas de moeda estrangeira (uma crise no balanço de pagamento).
É claro que, até certo ponto, se a oposição consegue convencer as pessoas que isso está realmente acontecendo, ela pode ajudar o processo a se desenrolar – assim como rumores de falência podem causar uma corrida aos depósitos. Tanto na Venezuela como na Argentina, a mídia é essencialmente de oposição, e então não é surpresa que esse ponto de vista tenha cobertura proeminente nos dois países.
Vamos examinar o argumento. A primeira premissa – de que a Venezuela deveria se desvalorizar para ter mais moeda doméstica (o bolívar forte) para cada dólar de receita de petróleo, foi o fundamento da maior parte das notícias. Mas isso não faz sentido econômico. Quando o governo desvaloriza a moeda de 4.3 bolívares para 6.3 bolívares por dólar, o que ele faz? Ele credita a si mesmo dois bolívares fortes para cada dólar de receita de petróleo que recebe. Mas é claro que ele poderia criar a mesma quantia monetária sem se desvalorizar. A oposição faria uma objeção: “mas criação de moeda aumenta e inflação”.
Mas a criação de dois bolívares fortes para cada dólar recebido, feita pelo governo, também é criação de moeda, e não é diferente da criação monetária sem a desvalorização. A diferença principal é que, mais do que o impacto inflacionário de criar mais moeda, a desvalorização também contribui para a inflação ao aumentar o preço de bens importados.
O certo é que a criação monetária nem sempre contribui para a inflação. O Sistema de Reserva Federal dos Estados Unidos criou mais de US$ 2 trilhões desde 2008 e a inflação não aumentou significativamente. Se o governo venezuelano simplesmente quisesse ter mais bolívares para gastar, seria menos inflacionária apenas a criação monetária sem desvalorização.Por que desvalorizar então? A desvalorização tem outros efeitos. As importações mais caras contribuem para a inflação, mas elas também ajudam a produção doméstica que compete com as importações. E o que é talvez mais importante, a desvalorização torna os dólares mais caros, e, portanto, aumenta o custo da fuga de capitais. Isso ajuda o governo a manter mais dólares dentro do país.
Não surpreende ver que muito do que é analisado pela imprensa é baseado em números errados e em uma lógica falha. O prêmio para números errados dessa vez vai para Moisés Naím, que diz no Financial Times, que “durante o governo de Hugo Chávez, o bolívar forte foi desvalorizado em 992%”.
Fãs de aritmética vão logo notar que isso é impossível. Uma moeda não poderia ser desvalorizada em mais de 100%, e nesse ponto seria trocada por zero dólares. Aparentemente, um enorme leque de exageros é permissível quando se escreve sobre a Venezuela, desde que sejam comentários negativos.
No entanto, por uma série de motivos, as espirais de inflação-desvalorização na América Latina são uma coisa do passado – e uma desvalorização uma vez a cada par de anos é um grito distante de tal espiral. Na verdade, mesmo apesar de os relatos da imprensa dizerem que a inflação alcançaria 60% [na Venezuela] depois da desvalorização de janeiro de 2010 – que foi maior que a última – a inflação subjacente nem sequer aumentou e a inflação global aumentou apenas temporariamente. A inflação caiu depois por mais de dois anos, mesmo enquanto o crescimento econômico subia para 5.6% no ano passado.

O montante da inflação que vai seguir essa desvalorização vai depender de quais medidas o governo toma e quão efetivamente elas são implementadas: os controles de preço, a provisão dos dólares para os importadores (inclusive de alimentos), e controle de capitais. Mas se os últimos anos servem de indicador, o governo fará o que for preciso para não deixar a inflação e a escassez de produtos sair do controle.
No que tange a dívida pública da Venezuela, o governo está muito longe de ter um problema de dívida insustentável. O FMI projeta a dívida pública bruta da Venezuela para 2012 em 51.3% do PIB (em comparação com os mais de 90% para a Europa). Uma melhor medição é o peso da parte estrangeira dessa dívida, que em 2012 era de cerca de 1% do PIB ou 4.1% do lucro de exportações da Venezuela.
Há uma série de distorções e problemas com a economia da Venezuela – incluindo escassezes de produtos recorrentes – e algumas delas têm a ver com a administração do sistema de câmbio. Mas nenhum desses problemas representa uma ameaça sistêmica à economia, como – por exemplo – eram as bolhas imobiliárias nos Estados Unidos, no Reino Unido, na Espanha e em outros países em 2006. Estes eram desequilíbrios verdadeiramente insustentáveis que tornaram o colapso econômico inevitável. 


Apesar das ideais ilusórias que estão tomando conta da mídia, a economia da Venezuela vai muito provavelmente crescer por muitos anos ainda, desde que o governo continue a apoiar o crescimento e o emprego.
* Mark Weisbrot é co-diretor do Center for Economic and Policy Research, em Washington, D.C. Ele também é president do Just Foreign PolicyArtigo publicado no site do CEPR.

Fonte: Opera Mundi/Tradução: Kelly Cristina Spinelli/Free ilustration militanciaviva

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