quinta-feira, 10 de abril de 2014

BRINCANDO COM O BEM MAIS SAGRADO - ALCKMIN, A IMPRENSA E A ÁGUA. UM SHOW DE INCOMPETÊNCIA, IRRESPONSABILIDADE E POLITICAGEM



Por Fernando Brito:



Hoje se completam dois meses que este blog, cá do Rio de Janeiro, vem azucrinando seus leitores sobre a situação dramática do abastecimento de água em São Paulo, quase que diariamente.

Àquela altura, havia 19,8% de todo o volume possível nos reservatórios do Sistema Cantareira e o principal deles tinha 15,5% de seus 800 bilhões de litros de capacidade.
Hoje, tem 12% e a principal represa vai baixar, amanhã, para 4%.
Qual foi a providência tomada pelo Governador?
Dar desconto a quem consumir menos água, correto.
Mas insuficiente.

Saíam, há dois meses, pouco mais de 30 m³/segundo do sistema. Hoje, saem 26 m³, 15% a menos.
Entram, na média de março e de abril, 13,8 m³, dos quais 3,2 m³ saem para os rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí, ficando fora do balanço.
Não é difícil fazer a conta, não é?
Perde-se, todo dia, 1,6 bilhão de litros.
Na média, porque ontem, por exemplo, entrou muito menos água e a perda chegou pertinho de 2 bilhões de litros.
Hoje havia 118 bilhões de litros ainda, somadas todas as represas.
73 dias, isso se o sistema conseguisse funcionar até a última gota acima das comportas, o que não é provável que aconteça, porque as vazões passam a ser insuficiente para preencher os túneis de adução.
Que providência tomou o Governador?

Ressuscitar um projeto que já havia sido abandonado, por inadequado, pelos técnicos da Sabesp (quem testemunha é o engenheiro tucano Jerson Kelman, do Instituto FHC), o de tirar água do Rio Paraíba do Sul, porque isso permitia criar uma falsa disputa com o Rio de Janeiro e “federalizar” o problema.

No que o Datafolha o ajuda, agora, colocando “num balde só” do risco de racionamento o Cantareira, com 12% de água, e o Sistema Elétrico Nacional que, somando todas as regiões – que são interligadas e podem gerar, de forma quase indistinta, energia para qualquer região do país – que têm hoje, no total, 40,5% de sua capacidade de reserva.
Anteontem, este blog que não é, absolutamente, dotado de poderes paranormais, afirmou que a semana não terminaria sem que começasse, “de fato, o racionamento de água em São Paulo.”
Já começou, embora só hoje tenha sido feita uma reportagem com características de “curiosidade”.
Hoje, embora continue negando, Alckmin admitiu que pode partir para um “rodízio” no abastecimento.
Ora, “rodízio” é em churrascaria, Governador.
Entrar água por dois dias e secar em um é r-a-c-i-o-n-a-m-e-n-t-o.
É essa a forma de racionar possível, porque de outra forma não é possível controlar o gasto.
O senhor não vai colocar estas simpáticas e prestativas senhoras que estão atuando como “guardiãs da água” do lado de cada torneira, de cada chuveiro, de cada vaso sanitário, não é?
Tão triste quanto este espetáculo de cinismo é o que a imprensa paulista faz.
Aceita qualquer versão.
Volume morto, que jamais foi usado e ninguém sabe o quanto poderá ser aproveitado, vira “reserva técnica”.
O racionamento vira “rodízio”.

As obras do bombeamento do Atibainha não mereceram um reportagem sequer. Ninguém sabe como andam.
As duas últimas saídas de água do Jaguari-Jacareí estão no estado que você vê na foto ao lado, publicada pela Folha sem nenhum tipo de informação.
Essa torre está 31 metros abaixo de seu nível máximo e resta 1,7 metro de água acima do final das grades da comporta gradeada que, como é obvio, admite cada vez menos líquido quanto mais o nível abaixa.
Este é o tamanho da cumplicidade da imprensa de São Paulo diante do problema e das atitudes de Geraldo Alckmin.
E da covardia da Agência Nacional de Águas, que não assumiu aos quatro ventos o que foi dito ao Governador em janeiro: racione, evite que isso tenha de ser feito de forma mais drástica e permanente.
Este blog, antes de defender ou atacar governos ou partidos, defende a responsabilidade para com a população e ataca tudo aquilo que possa submete-la a sacrifícios além do necessário.
E defende o jornalismo, que está num nível mais baixo que o do Cantareira.
Não é possível que, com todas as informações públicas, ao alcance de um clique de mouse , nem assim os jornais possam dar a dimensão de um problema que afeta e afetará por muitos e muitos meses oito milhões de paulistanos.

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