quinta-feira, 13 de novembro de 2014

O CÁLICE AMARGO ARGENTINO QUE BEBEU A SENHORA KIRCHINER

 

A TECNOCRACIA NO COMANDO OU DE COMO AS BANANAS COMEM OS MACACOS



“Tecnocracia e democracia são antitéticas [..] A democracia sustenta-se sobre a hipótese de que todos os cidadãos podem decidir a respeito de tudo. A tecnocracia, ao contrário, pretende que sejam convocados para decidir apenas aqueles poucos que detêm conhecimentos específicos”
(Norberto Bobbio, O futuro da democracia)




Buenos Aires, ano de 2009, a presidenta da Argentina, Cristina Kirchner, destituiu o presidente do Banco Central, Martín Redrado, por ele se recusar a cumprir a decisão do governo de criar um fundo fiscal com reservas do BC. 

A exoneração soou como um acinte para a "pátria financeira"; segundo alguns jornais, essa foi mais uma manifestação autoritária e populista - eles adoram essa palavra! - da Casa Rosada. Cristina Kirchner pode ser populista e ter pendores autoritários, mas ela foi eleita democraticamente. Como bem lembrou o Clóvis Rossi, não vem ao caso se a decisão presidencial é melhor ou pior para o país do ponto de vista técnico; o que interessa é que, politicamente, como presidente da República, Cristina tem legitimidade para tomá-la. Ao subalterno - no caso o presidente do BC - caberia obedecê-la. Mas na Argentina uma lei dos tempos de Menem concede independência ao BC para formular a política monetária. A Justiça, que já restituiu o presidente do BC ao seu cargo, deu a palavra final.

Sem entrar na discussão técnica da questão - a utilização das reservas é um problema de ordem fiscal e não monetária - cabe lembrar que a idéia da independência do BC foi gerada pelo malfadado "Consenso de Washington" e adotada por vários países, alguns de maneira informal, como o Brasil, outros explicitamente, como a Argentina. Que tal preceito tenha virado lei no país vizinho não muda em nada o fato de que ele subverte completamente o conceito de democracia, pois admite que técnicos sem mandatos tenham mais poder que o mandatário legitimamente eleito. É a "ditadura dos técnicos" na definição de Luiz Carlos Bresser-Pereira. De maneira mais macunaímica, poderíamos dizer que é como se a banana estivesse comendo o macaco.
 

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