sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

FALTA DE ENERGIA E FALTA DE VERGONHA



Não dá para falar no perigo da falta de energia sem debater quem fez campanha permanente 
contra hidroelétricas

por Paulo Moreira Leite

É inacreditável. Os cortes de energia ocorridos nos últimos dias têm sido usados por economistas e 
observadores ligados à oposição para sua revanche diante dos benefícios obtidos pela população mais 
pobre nos últimos anos e tentar desgastar o governo.
O argumento é sentimental: dizer que ocorreu uma grande ampliação do consumo, em particular de 
eletro-domésticos, mas lamentar em tom lacrimoso que não houve um aumento correspondente na 
oferta de energia.
O truque é esconder o que ocorreu com nossa oferta de energia — e quem é responsável pelo que 
acontece agora. Não estamos falando de um episódio que aconteceu ontem ou na semana passada nem 
há dois anos, mas de uma política de décadas.
Qualquer que seja a causa real para os cortes de energia dos últimos dias, a verdade é que o país estaria 
em situação muito mais segura e confortável se não tivesse sido obrigado a enfrentar — e ceder — 
diante de pressões poderosas, ocupadas em atrasar os principais investimentos no setor, com 
argumentos razoáveis, absurdos ou apenas estúpidos mas que, na prática, apenas contribuíram para 
enfraquecer o desenvolvimento do país. O governo Lula-Dilma encontrou o dinheiro, fez o projeto, 
definiu como seria feito — mas foi impedido de seguir em frente, por campanhas políticas, de 
marketing, ou através da judicialização do debate.
Segunda maior hidroelétrica do país, a terceira maior do mundo, Belo Monte é um projeto de três 
décadas, que sofre um massacre sistemático e agressivo, inclusive campanhas internacionais com 
estrelas de Hollywood, onde se multiplicaram ações na Justiça e repentinas preocupações com o bem-
estar dos trabalhadores dos canteiros de obras apenas para justificar o apoio a todo tipo de paralisação. 
Poderia estar pronta, contribuindo para acender lâmpadas no país inteiro, mas só vai entrar em 
funcionamento no ano que vem. Irá produzir menos da metade de seu potencial porque a pressão 
ecológica levou a uma reforma do projeto para agradar entidades ambientais.
Contra a usina de Madeira se insurgiram os amigos de um tipo especial de bagres que se reproduzem 
pelo rio — e poderiam ser ameaçados pelas turbinas.
Faça sua lista e não esqueça de incluir as usinas nucleares que, de uma forma ou de outra, asseguram 
energia para a maioria das sociedades desenvolvidas, inclusive aquelas que financiam milionárias 
entidades ecológicas abaixo da linha do Equador. Não pense em teorias da conspiração.
É disputa de interesses, pura e simplesmente, tão antiga como a história do capitalismo. Falando na 
forma de caricatura, apenas para tornar as questões mais claras: houve uma época na qual as potências 
mundiais usavam a religião para submeter os povos da América e da Ásia com a ameaça do inferno 
cristão. Hoje, a ameaça de destruição da Terra serve como argumento ideológico para manter tudo 
como está — e azar de quem ainda não possui aquilo que necessita e tem direito.
É claro que Marina Silva tem explicações a dar nesse debate, vamos combinar. Suas responsabilidades 
são óbvias, ainda mais como candidata presidencial, que se apresenta como porta-voz da natureza 
ameaçada. Emprestou um prestígio adquirido na luta popular para causas que nada têm a ver com a 
melhoria no bem-estar das maiorias. Ajudou a dividir a resistência brasileira para defender o direito ao 
desenvolvimento. Mas não só.
Esse discurso só tem ressonância porque expressa interesses muito maiores, que nada têm a ver com os 
brasileiros que lutam dia e noite por um destino melhor na floresta — mas às grandes forças que 
sempre governaram o mundo e trabalham diariamente para manter tudo como está. Não foi por acaso 
que o esforço do PSDB para ampliar nosso parque energético esteve perto da nulidade.
Não se trata de negar a importância de medidas preservacionistas. Elas podem e dever ser estimuladas. 
A questão é de prioridade: preservar a natureza ou o status quo? Para quem? Para beneficiar o que?
O debate é este.

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