Talvez influenciado pelo fato de estar sendo entrevistado
por uma publicação estrangeira - em certos países e organismos
multilaterais se conhece bem os avanços alcançados pelo Brasil nos
últimos anos - o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso afirmou, para a
revista alemã Kapital, que a Presidente Dilma Roussef é
"honrada", e que o ex-presidente Lula é um líder "popular" cuja prisão,
caso viesse a acontecer, poderia dividir o país.
Foi
o que bastou para que fosse imediatamente execrado pela parcela da
opinião pública que ocupa, destilando bílis, os sites e portais mais
reacionários - para dizer o mínimo - da internet brasileira.
O
que importa, não é saber - embora torçamos para que isso tenha ocorrido -
se FHC foi sincero em suas considerações sobre a Presidente Dilma, e,
sim, prestar atenção à verdadeira avalanche de estupidez que suscitaram
suas palavras.
"Doido",
"senil", "demente", "gagá", "caduco", "bipolar" - odioso,
preconceituoso e covarde, o fascismo despreza e confunde a idade com
fraqueza e costuma ser particularmente impiedoso com os mais velhos, as
mulheres e as crianças - "doente de Alzheimer", e o já tradicional apelo
do "morre de uma vez" (como fez o "sutil" internauta que atende por
Paulo Votan, acima, no print que precede este texto) foram alguns
dos epítetos lançados pela malta nos grandes portais da internet,
contra o ex-presidente da República.
Outros
o acusaram de "pateta", "traidor", "idiota", "maconheiro", "THC"-
lembrando sua defesa da descriminalização da Cannabis - e de "cara de
pau", "sem-vergonha", e ladrão - acusando-o de estar "roubando também",
ou de já ter se encontrado secretamente com Lula para conchavos.
E
os mais "espertos", a serviço da nefasta "via alternativa", que
espreita, como hiena, nos meandros da história, os países que se rendem
aos que fomentam o caos e a cizânia, preferiram, como sempre, aproveitar
a oportunidade para intensificar os ataques contra a democracia -
"político é tudo lixo", "farinha do mesmo saco"; defender a violência:
"é preciso amarrar a boca do saco", "matar todo mundo a paulada" e
"jogar o saco no rio"; e propagar a teoria - esse é "esquerda caviar",
"comunista enrustido" - da conspiração, segundo a qual PT e PSDB
representariam, na verdade, duas faces da mesma moeda, da "tática da
tesoura stalinista", de disfarçar parte da esquerda como direita;
tomariam parte da estratégia de conquista da hegemonia, por meios
pacíficos e "gramscianos", do poder, e atuariam seguindo os padrões do
"marxismo cultural", como fantasiam, e pregam certas correntes da
imbecilidade neo-direitista antinacional. Tudo
isso coroado pelos pedidos de instalação no país de nova ditadura -
agora com caráter "policial-jurídico-militar" - e os indefectíveis
slogans da campanha - que já está no ar há muito tempo - de BOLSONARO
2018 para a Presidência da República.
Na
página do ex-capitão do Exército, no Facebook, por exemplo - que,
significativamente, já tem mais de 3 vezes o número de curtidas (1.5
milhão contra 450.000) que a página oficial de FHC, o ex-Presidente
Fernando Henrique Cardoso aparece como defensor das drogas ao lado do
ex-presidente uruguaio José Mujica, em contraponto ao próprio Deputado
Bolsonaro, que se destaca, convenientemente, à direita, ao lado da
figura do Presidente da Indonésia - país que pune o tráfico com a pena
de morte - Joko Vidodo (que é, na verdade, um fabricante e exportador
de móveis) em uniforme militar.
Em
outras páginas - e cabeças - aparecem, como se fosse normal, propostas
de que urnas eletrônicas passem a emitir recibo; de leis antiterroristas
- para se emular gringos - de que se apresente o CPF antes de entrar na
internet; de se identificar e eliminar, no nascimento, no futuro, bebês
que tenham propensão criminosa; de se substituir o povo por "Deus" no
parágrafo único do Artigo Primeiro, que define a fonte do poder do
Estado no texto constitucional; de se punir com até 3 meses de prisão
professores que abordem assuntos políticos na sala de aula; de se
submeter as decisões do Supremo Tribunal Federal a igrejas, depois de já
se ter aprovado a isenção de impostos para "repasses" a pastores, como
se, em pleno século XXI, tivéssemos entrado em uma máquina que nos
teletransportasse para um hospício, ou, de volta, no tempo, para mais ou
menos 100 anos atrás.
Enquanto
o setor de óleo e gás - de alta tecnologia - corre o risco de
desmantelamento, a indústria naval é destruída, com o fechamento de
vários estaleiros, a indústria de defesa se desarticula, com seus
principais projetos sendo ameaçados, e as maiores empresas do Brasil são
arrebentadas, milhares de seus fornecedores quebram, e se pretende
impor a elas multas absurdas de bilhões de reais - para que não sobre
pedra sobre pedra - eliminando-se milhares de empregos, brasileiros que
fazem questão de ignorar que ainda somos - apesar de tudo - a oitava
economia do mundo e o terceiro maior credor individual externo dos
Estados Unidos, e que o nosso desemprego é de um terço de países como a
Espanha, e nossa inflação a metade do que era há pouco mais que uma
década, comemoram em grupos como o Direitas Já, Direita Brasil, Direita
Conservadora, Direita Realista, Direita Política, Tradutores de Direita,
Direita Forte, Rede da Direita Nacional, Canal de Direita, Professores
de Direita, Direita Atual, Direita Ocidental, Extrema Direita
Nacionalista Brasileira, Linhas Direitas, Jovens de Direita, Militantes
de Direita, Garotas Direitas, Sou de Direita, Extrema-Direita, Direita
Unida, Direita Única, Direita Blindada, Direita Conservadora, Direita
Brasil, Rua Direita, Direita Nacional Brasileira, Vem pra Direita
Brasil, Skins Direitista (sic) e dezenas de outras comunidades menores,
os problemas do país, torcendo, muitas vezes abertamente, pela derrocada
da Nação, a quebra do Estado de Direito e a inviabilização da economia e
da governabilidade.
É principalmente quado o tufão se aproxima, que é preciso escutar a voz da razão.
A
reação - nos dois sentidos - contra as declarações de Fernando Henrique
Cardoso na internet é apenas a ponta do iceberg de um quadro claro, para
o qual os setores mais influentes da sociedade brasileira ainda não
acordaram - ou só estão começando - talvez tardiamente - a atentar.
O
PSDB corre grandes riscos se não souber corrigir o rumo de sua nau em
meio à tempestade que ele mesmo ajudou a conjurar, e mesmo com
o risco de perder o mandato, já existe quem esteja, como a Senadora
Lúcia Vânia, de Goiás, tomando a decisão de abandonar esse barco no meio
do caminho, alegando não acreditar em uma "oposição movida a ódio", e
fazendo apelo a mais "equilíbrio e sensatez", diante da gravíssima
situação política que está sendo enfrentada pelo país.
Ao
embarcar na "direitização" da classe média, e endossar, de forma
atravessada, indireta, e, eventualmente, interesseira, o discurso da
exageração da crise, da criminalização dos políticos, da judicialização
da política, e da repetição da irresponsável e continua multiplicação, à
estratosfera, de cifras (da ordem de dezenas, centenas, de bilhões de
reais) em pseudo prejuízos da corrupção que não correspondem aos fatos
nem às provas efetivamente, inequivocamente, colhidas até agora, o PSDB -
deixando-se seduzir pelas perspectivas do caos - está brincando de
afagar as cabeças de Cérbero - o cão mitológico que guarda a saída - e a
entrada de Hades - na ante-sala do inferno.
Mais importante do que se haverá ou não impeachment, do ponto de vista histórico, é o Brasil que ficará desse processo.
A
História avança em ciclos, e entre eles há aqueles que, depois de
iniciados, dificilmente são detidos, e que cobram pesados tributos em
atraso e em sangue, antes de que venham a se encerrar.
É
preciso que as lideranças do PSDB percebam - e há outras personalidades
na legenda que foram lembradas - e muitas vezes virulentamente
criticadas - nos ataques contra FHC na semana passada - que o
imponderável é - por sua própria natureza - incontrolável e voraz. E
que, ao abrir a porta para o desconhecido, o PSDB poderá não voltar ao
poder em 2018.
Pelo contrário.
Existe
uma grande chance de que venha a entregar o país - ou boa parte dele -
ao fascismo. E de que venha a ser vitimado, mais cedo do que tarde, pelo
fascismo, como ocorre com o PT.
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