sexta-feira, 7 de novembro de 2014

CIRO GOMES: "DILMA PRECISA DE MELHORES COMPANHIAS"



Ex-ministro Ciro Gomes (Pros) se diz surpreso como a presidente Dilma Rousseff conseguiu se 
reeleger com a equipe que montou no governo: 'E o problema não é a conciliação com picaretas 
bem-recomendados pela “base”, enquanto a presidenta faz, repleta de sinceridade, um discurso 
moralista. 


É incrível que ela tenha escapado da derrota com a equipe que montou no governo
O submundo do mercado e da política não deram à reeleita Dilma Rousseff nem 24 horas de trégua. 
E não haverá paz. Isso significa duas coisas neste momento: há muito pouco tempo para o novo 
governo se iniciar (o calendário gregoriano pouco importa aqui) e tudo o que ela não deve nem pode 
fazer, sob pena de se desconstituir muito rapidamente, é tomar iniciativas atabalhoadas que simbolizem 
uma rendição deslegitimadora a uns ou a outros. A alta dos juros básicos da economia, estabelecidos 
pelo Banco Central, na quarta-feira 29 foi péssimo sinal.
Aumentar a gasolina neste contexto, fatal. Negociar com a escória que vota contra o governo na 
Câmara dos Deputados, e, logo, logo, no Senado, em seus termos e por meio da pedagogia da 
chantagem, será mortal.
Não creio exagerar em nenhum desses argumentos. Dilma Rousseff só venceu as eleições pelo fato de 
a maioria precária de nós, brasileiros, perdoarmos as graves contradições de sua governança e, 
especialmente, de sua condução da economia. E o fizemos por argumentos de duas ordens: confiamos 
em sua boa-fé e decência pessoal, vis-à-vis a crônica de desmandos e escândalos magnificados pelos 
sócios majoritários da imoralidade pátria, especialmente na grande mídia. 
E, acima de tudo, penso eu, por percebermos que, por trás de tudo, é possível enxergar que a “turma” 
que Dilma de fato representa, apesar de sua mania de andar mal-acompanhada, os valores mais 
importantes para o povo: o compromisso nacional, o trabalho como bem central em uma nação 
civicamente sadia, o compromisso moral com a superação da vergonhosa desigualdade que nos aparta 
(de um lado, uma elite minúscula, mas aferrada a uma cultura escravocrata, de outro, imensas maiorias 
excitadas com informação globalizada de um padrão de consumo ao qual não conseguem ascender 
com o pouco que evoluíram).
Não é o suficiente para sustentar um novo governo com os problemas graves e urgentes no horizonte, 
mas é suficiente para recomendar: nesses valores, e não naqueles dos reacionários, Dilma precisa 
escorar-se para enfrentar a difícil tarefa que lhe espera.
Algumas obviedades, outras nem tanto: equipe, agenda, foco, amor ao resultado, urgências. Nada disso 
caracterizou o governo que se “encerrou”. Na verdade é incrível que Dilma tenha escapado da derrota 
com a equipe (salvemos as raríssimas exceções) inacreditável com que governou. E o problema não é a 
conciliação com picaretas bem-recomendados pela “base”, enquanto a presidenta faz, repleta de 
sinceridade, um discurso moralista. 
O pecado do pecador é desculpável, o do pregador, nunca. Ou bem se reproduz a moralidade 
FHC/lulista de que “é assim ou não se governa”, ou conheçamos o exemplo recente de Itamar Franco, 
que governou sem conciliar com a ladroagem. Dando ao intermédio a condição de se entender aqui, 
em outra linguagem, na nossa: 36 anos de experiência me autorizam a afirmar, assim se obtém a 
maioria. O oposto levaria a uma crise de legitimidade e sinceramente não sei se Dilma teria condições 
de administrá-la.
Crise mesmo não é, porém, aquela essencialmente política, embora possa ser igualmente complexa. 
A crise potencialmente explosiva é a econômica. O País tem sido administrado da mão para a boca e 
nossas margens se estreitam de forma muito grave. Também aqui não creio exagerar. O ano de 2015 já 
será difícil se for feito tudo o que é preciso. E será pior se nada for feito.
Alguns números para embasar as minhas preocupações: o desequilíbrio nas contas correntes do Brasil 
com o exterior é o maior da história e tende a aumentar (86 bilhões de dólares). A balança comercial de 
produtos manufaturados (diferença entre o que compramos e vendemos no mercado internacional no 
setor industrial) alcança 106 bilhões de dólares. 
As contas fiscais se deterioraram aceleradamente nos últimos meses e a reversão pela via conservadora 
e não seletiva levará inevitavelmente à recessão.
Do câmbio vem uma pressão inflacionária, da área fiscal, uma pressão recessiva. Primeiro efeito: 
estagflação. Resultados mais graves: o estreitamento da margem para os ganhos salariais e, no médio 
prazo, para a manutenção do nível de emprego. Se acontecer, os fundamentos centrais do novo e 
precário contrato político de Dilma Rousseff com a maioria será atingido.
Para tudo há solução. Nenhuma delas mágica, acredito. Mas nenhuma produzida a partir da prostração 
ideológica que caracterizou a campanha eleitoral. Fora do trivial cardápio moralista, discutiram-se 
apenas as nuances de conservadorismo.
A presidenta precisa desinterditar o debate, chamar a inteligência brasileira e pedir que todos deixem 
suas certezas na porta de entrada e, livres de preconceitos, produzam uma ideia comovente ao País.
Uma economia política inteligente guiada pelo pragmatismo na superação de nossos desequilíbrios. 
Um projeto de nação que coloque todo e qualquer sacrifício na perspectiva de uma construção de 
futuro.Não duvide: se Dilma temer os riscos e preferir as acomodações que se planejam para ela e seu 
tempo precário...
Bem, Deus proteja o Brasil.

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