Presidente usa seu quinto pronunciamento sobre o Estado da Nação para
tentar se aproximar do eleitorado ao dar destaque à desigualdade social.
Entre as principais promessas, legislar sem o Congresso se necessário.
O quinto discurso de Barack Obama sobre o Estado da Nação, na noite de
terça-feira (29/01), foi o mais longo e o mais difícil desde que ele
chegou à Casa Branca. Apesar do bom desenvolvimento econômico e da queda
no índice de desemprego, sua aprovação entre os americanos é baixa,
enquanto o número de projetos de lei fracassados é alto.
"Viu-se um presidente que sabe que tem sérios desafios", diz Matthew Duss, do think tank
Centro do Progresso Americano. "Ele revelou sua frustração com o
Congresso. No entanto, vimos um presidente que quer continuar tentando
cooperar com o Legislativo, mas que também deixou claro que vai dar
prosseguimento à sua agenda, mesmo sem o Congresso."
Nos últimos dias, porta-vozes de Obama haviam despertado altas
expectativas em torno do discurso. Mas, apesar da conhecida maestria
retórica do presidente americano, no final seu pronunciamento à nação
não teve grandes surpresas. Da educação acessível, lei de imigração,
Guantánamo, proteção ambiental até o aumento do salário mínimo – Obama
falou de tudo um pouco.
"Se falarmos da possibilidade de muita coisa acontecer devido a esse
discurso, eu devo dizer que as chances são poucas", afirma Stephen Hess,
do Instituto Brookings. "Ele está diante de um Congresso que deixou
claro que não vai lhe dar nada e que também não vai apoiá-lo."
Posição difícil para governar
Segundo o jornal Washington Post, desde seu discurso do ano
passado, somente cinco das 24 iniciativas do presidente foram
implementadas. As outras fracassaram no Congresso. Não é de admirar que
Obama tenha forçosamente se repetido este ano. Para estar em situação
melhor em 2015, ele pretende agora mostrar capacidade de ação – se
necessário, mesmo sem o apoio dos legisladores.
"Acho que ele não tem escolha", diz Stephen Hess. "No ano passado, ele
sentiu o impulso de sua vitoriosa reeleição. Fez grandes propostas, e o
resultado foi um ano terrível. Sua esperança por uma nova lei de armas
de fogo, sua nova lei de imigração, tudo fracassou. E ainda por cima a
má implementação da reforma do sistema de saúde. Ele não pode contar com
o Congresso. Se quiser conseguir algo, ele deve fazê-lo sozinho."
Um dos destaques do discurso foi dedicado à luta contra a crescente
desigualdade social. Ele anunciou que vai elevar, por decreto
presidencial, o salário mínimo para firmas contratadas pelo governo.
Futuramente, zeladores e operários da construção civil vão receber 10,10
dólares por hora de trabalho em vez dos atuais 7,40 dólares.
Para Matthew Duss, do Centro do Progresso Americano, Obama está
perseguindo, conscientemente, uma agenda diferente e, em ano de
eleições legislativas, está deixando o centro e dando uma guinada
política à esquerda. "O foco na desigualdade econômica é um tema
importante da esquerda progressista. Assim, ele se encaixa fortemente na
tradição histórica progressista", opina.
Segundo o ex-diplomata Frank Loy, o objetivo do discurso teria sido
"inspirar" os próprios apoiadores antes das importantes eleições de
novembro. Para Loy, Obama foi relativamente bem-sucedido em alguns
temas. "A elevação do salário mínimo, a improvável mudança da lei de
armas de fogo, a sua forte declaração sobre a mudança climática e também
a ênfase na diplomacia com o Irã se enquadram nessa categoria", diz.
Republicanos preocupados
Obama dedicou grande parte de seu discurso às regiões de conflito
Afeganistão, Síria, Irã e Iraque. Para o Afeganistão, ele anunciou o fim
da missão militar para dezembro de 2014. Ele assegurou, no entanto, a
permanência de um pequeno contingente. A defesa de Obama pela primazia
de soluções diplomáticas não encontrou o apoio de muitos republicanos.
Em entrevista à Deutsche Welle na véspera do discurso, o senador
republicano John McCain acusou o presidente de falta de liderança.
"No tocante à segurança da nação, ela é inexistente", disse McCain.
"Tudo o que ele diz é: ele quer partir. Ele disse que quer deixar o
Iraque. Ele disse que quer ir embora do Afeganistão." Segundo o
republicano, até agora Obama não revelou, porém, quantos soldados devem
permanecer no país. "Não existe liderança. Este é um capítulo vergonhoso
da nossa história."
Frank Loy, no entanto, defende outra posição. Em relação ao Afeganistão,
no entanto, ele vê outro risco: "Retiramos nossa tropa, e o caos vai se
instaurar em algumas partes do país, porque as forças de segurança
afegãs não estão em condição de assumir o controle."
Loy afirma, no entanto, que daqui a cinco anos esse risco ainda estaria
lá. Na passagem do discurso sobre o Irã, ele disse ver uma das
afirmações mais "corajosas", ou seja, a ameaça de veto por parte de
Obama no caso de o Congresso aprovar novas sanções contra o Irã.
Em seu discurso, a Europa e as relações transpacíficas foram mencionadas
por Obama com uma única frase, da mesma forma que o caso de espionagem
pela NSA. Com isso, ele ignorou as preocupações europeias a essa
respeito – o que, afinal, deve desencadear ainda mais ceticismo no
continente.
Internamente, por outro lado, Obama parece ter atingido os nervos dos
seus adversários políticos. Os republicanos demonstraram abertamente
temerem as consequências dos anúncios feitos. Pela primeira vez, não só
um político da oposição respondeu ao discurso – como é praxe – mas
quatro juntos.
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