João Goulart (ao lado da mulher, Maria Thereza): opção pela não-resistência |
Há 49 anos, no dia da
mentira, as mesmas forças econômicas e políticas que hoje fazem feroz oposição
ao governo de Dilma Rousseff e ao ex-presidente Lula se articularam com a
grande mídia (como hoje...), setores de direita das Forças Armadas e a cúpula
da Igreja Católica para desfechar um golpe de Estado contra o presidente João
Goulart.
Esses setores estavam inconformados com as “reformas de base”, prometidas
por Jango, e com a ascensão ao primeiro plano da vida política do país dos segmentos
historicamente excluídos: operários, camponeses e soldados. Para ganhar a
classe média, os conservadores manipularam habilmente o temor do “perigo
comunista” e da instalação de uma “república sindical” no país.
General Olympio Mourão, a "vaca fardada" |
Mas, articulado desde 1954
contra Getúlio Vargas, o golpe só saiu porque um general de três estrelas tresloucado,
Olympio Mourão Filho – que mais tarde se autodenominaria uma “vaca fardada” –
se precipitaria fazendo seus recrutas, sediados em Minas Gerais,
marcharem contra o Rio de Janeiro, então a sede do poder central. Dois ou três caças
da FAB teriam resolvido o problema, se o presidente Goulart estivesse disposto
a resistir, como fizera Leonel Brizola em 1961, quando os comandantes militares
tentaram impedir a posse de Jango depois da renúncia de Jânio Quadros. Mas
Jango preferiu deixar o poder para evitar uma guerra civil, que provocaria,
segundo ele, “derramamento de sangue de brasileiros”. No entanto, é certo que,
se houvesse resistência, o golpe seria apenas adiado, já que a ruptura entre Jango
e a cúpula militar se tornara irreversível desde que o presidente prestou sua
solidariedade aos marinheiros amotinados e aos sargentos reunidos no Automóvel
Clube às vésperas da quartelada. De qualquer forma, a resistência tornaria as
coisas bem mais difíceis para os golpistas.
A ausência de resistência
teve conseqüências trágicas. Em primeiro lugar, levou parte da esquerda que
antes orbitava em torno do Partido Comunista Brasileiro (PCB) a optar pela luta
armada contra o regime, num momento de ampla desmobilização e desorganização
dos trabalhadores e dos camponeses. O resultado foi uma repressão brutal e
feroz, particularmente depois do AI-5, que transformou a tortura em instrumento
de Estado e provocou centenas de mortos e “desaparecidos” políticos. Em segundo
lugar, a ausência de resistência ao golpe permitiu que, quando o regime
finalmente se exauriu, tivesse condições de promover a transição controlada – a
tal “abertura lenta, segura e gradual” – na qual os militares bloquearam toda
possibilidade de investigação dos crimes da ditadura.
Os chefes da ditadura e da repressão: Castello, Costa e Silva e Geisel |
Agora, com a Comissão da
Verdade, teremos condições de começar a escrever essa história, apesar do
pessimismo de muito na esquerda. Estão vindo à tona as circunstâncias da prisão
e morte de Rubens Paiva e Vladimir Herzog, entre outros, bem como as ligações
perigosas entre os empresários e os porões da ditadura, e entre os diplomatas
americanos e os generais brasileiros. Essa discussão está se tornando pública.
É o primeiro passo para incriminar os responsáveis pelos crimes da ditadura, apesar
da decisão do STF contra a punição aos repressores. Temos que criar condições
para responsabilizar os chefões, e não apenas a parte inferior da cadeia de
comando. Brilhante Ustra; Carlinhos Metralha; o capitão Albernaz; Fleury; o
brigadeiro Burnier, mas também Médici, Costa e Silva, Geisel, Castello e
Figueiredo. Que sejam postumamente expulsos do Exército e desonrados, como
aconteceu com Jorge Videla ainda em vida.
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