Criança é tão criminosa quanto um adulto?
Recife (PE) - Chega a ser irônico. Neste 18 de abril, temos o Dia
Nacional do Livro Infantil, uma homenagem ao dia de nascimento de
Monteiro Lobato. Mas ontem veio a público uma pesquisa do Datafolha
sobre a redução da maioridade penal.
Por que fenômenos tão diferentes
se avizinham? Um calendário não se explica, pois na véspera do Dia do
Livro Infantil soubemos que 93% dos moradores da cidade de São Paulo
querem a prisão para menores a partir de 16 anos. Noventa e três por
cento são quase uma unanimidade.
O que é isso? Por experiência, acredito que a pesquisa espelha um dado
real. Em um programa de direitos humanos no rádio, o Violência Zero,
travamos com travo esse conhecimento. No estúdio da Rádio Tamandaré, no
fim dos anos 80, sentíamos a disputa de ideias na sociedade do Recife
entre punir sem medida e o direito à justiça. Mas não com esses
números. Ainda que sem método científico, pelos telefonemas dos
ouvintes, notávamos que a divisão entre os mais bárbaros e civilizados
era quase meio a meio. O que houve agora para esse assalto de vingança?
Segundo o Datafolha, foi a maior aprovação à proposta de redução
penal. Em 2003 e 2006, o apoio foi de 83% a 88%.
É claro que a última pesquisa espelha um instante de abalo emocional
na população. Ela veio depois do assassinato do universitário Victor
Hugo Deppman. O suspeito pelo crime é um jovem que estava a três dias de
fazer 18 anos. Isso foi repetido à náusea. Naquele tempo do
Violência Zero no rádio, não sofríamos o massacre de imagens repetidas
na televisão. Melhor dizendo, sofríamos, mas a doutrinação não atingia
os noticiários mais “educados”, como o Jornal Nacional, Jornal da Band e
outros. Antes, as insinuações do “só vai matando” ficavam restritas
aos guetos dos programas policiais. No entanto, consideremos.
Ainda que sinta a batalha perdida diante do clamor, é um dever de
consciência não seguir a onda do momento. Está certo, é justo,
criminosos têm que ser punidos. Se possível, com algo exemplar, que
iniba e reprima o crime. Mas para a maioridade penal que deveria cair,
levanto algumas perguntas:
Qual seria o limite da redução? 12 anos, 11 anos, 10,9, 8, 7 anos?
Bebês? Qual o limite? Sintam que a cada redução devem ocorrer novos
crimes que estarão no limite da punibilidade. Mais: com o necessário
aumento da população carcerária, que já é um inferno e um fracasso do
sistema, não estaríamos dando ótimas escolas do crime aos meninos?
Já imagino que os reformadores do Código Penal podem argumentar que
teríamos alas de criminosos de 16, outra de 15, mais outra de 14, até
atingir um berçário... mas tudo dentro das mais perfeitas condições de
higiene e cura da perversão. Diante do crime que ameaça e atinge a
própria casa, já existe quem declare pérolas do gênero “sou de opinião
que não deveria haver nenhuma idade mínima na lei”. Salve, daí
partiremos fácil fácil para a pena de morte aplicada aos diabinhos mais
precoces.
Enquanto isso, não vemos, ou fingimos não ver a exclusão social e
humana que cobre as cidades. Comemos, bebemos, vestimos, vamos aos
shoppings sem olhar para os lados. E depois nos surpreendemos o quanto o
mundo pode ser cruel quando atinge a estabilidade – porque nos
julgamos estáveis em chão sólido -, ou a estabilidade sagrada – por
tudo quanto mais é santo e elevado acima da animalidade dos outros, que
não somos nós mesmos - a estabilidade sagrada dos nossos lares – pois
somos aqueles que temos casa, enquanto os outros, ah, eles dormem na
rua, que casa podem ter? Seria até uma questão de justiça, nós os
humanos temos que destruir e tirar dos olhos a mancha da escória.
Lembro que uma vez perguntei a idade a um menino que cheirava cola nas
ruas do Recife. “Onze anos”, ele me respondeu. E eu, com minhas
exatidões burras de classe média: “Vai fazer, ou já fez?”. Silêncio. Eu
insisti, crente de que não havia sido entendido. “Você faz anos em que
mês?”. Então ele me ensinou, antes de correr até a esquina:
- Tio, eu não tenho aniversário.
Todos não notamos que vem dessa exclusão o alimento e sangue para o
horror. Enquanto fazemos de conta que nada temos a ver com isso, crescem
os comentários com que termino a coluna, no Dia do Livro Infantil: se
os Direitos Humanos criarem caso, prendam ou os arranquem para fora do
Brasil ! Temos que punir duramente quem mata, sequestra, seja quem
for. Com a idade de treze anos sabem muito bem o que estão fazendo. Se
não melhorarem com novas leis, pena de morte.
Por Urariano Mota No Direto da Redação
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