A entrevista de Dirceu à Folha mostra que algo de urgente deve ser feito para que o Supremo não fique desmoralizado.
Feliciano pode continuar onde está?
Os brasileiros parecem ter a resposta já consolidada para isso.
E o juiz Luiz Fux, pode?
Esta é outra discussão que deve ser travada em caráter de urgência
pela sociedade brasileira, dada a importância do Supremo Tribunal
Federal, do qual Fux é um dos integrantes.
A entrevista que a Folha publica hoje com José Dirceu, o réu entre os
réus do Mensalão, grita isso – que se verifique se Fux pode permanecer
no Supremo.
Um juiz desmoralizado desmoraliza o STF: este é o ponto.
Na entrevista, Dirceu afirma que Fux o procurou durante seis meses em busca de apoio para sua nomeação para o STF.
Fux estava um degrau abaixo, no STJ. Dirceu era então um homem de
grande influência no governo, e Fux tinha uma ambição desmedida.
Segundo Dirceu, quando o encontro foi enfim realizado, Fux prometeu a ele que o absolveria no julgamento.
Deu no que deu.
As acusações de Dirceu, evidentemente, têm que ser investigadas. Mas
seja lembrado que à mesma Folha ele admitiu já ter sim corrido atrás de
Dirceu na sua louca cavalgada pelo Supremo.
Escreveu a Folha depois de ouvir Fux, há alguns meses: no último ano
do governo Lula, “Fux “grudou” em Delfim Netto. Pediu carta de apoio a
João Pedro Stedile, do MST. Contou com a ajuda de Antônio Palocci.
Pediu uma força ao governador do Rio, Sergio Cabral. Buscou
empresários. E se reuniu com José Dirceu, o mais célebre réu do
mensalão.”
Fux admitiu, para a Folha, a reunião. “Eu fui a várias pessoas de
SP, à Fiesp. Numa dessas idas, alguém me levou ao Zé Dirceu porque ele
era influente no governo Lula.”
O contato mais explosivo, naturalmente, foi o com Dirceu. Na época,
as acusações contra Dirceu já eram de conhecimento amplo, geral e
irrestrito. E Dirceu seria julgado, não muito depois, pelo STF para o
qual Fux tentava desesperadamente ser admitido.
Tudo bem? Pode? É assim mesmo que funcionam as coisas?
Fux afirma que quando procurou Dirceu não se lembrou de que ele era
réu do Mensalão. Mesmo com o beneficio da dúvida, é uma daquelas
situações em que se aplica a grande frase de Wellington; “Quem acredita
nisso acredita em tudo”.
Fux demostra uma falta de equilíbrio inaceitável para o Supremo.
Considere a narração dele próprio do encontro que teve com o ministro da
Justiça, José Eduardo Cardozo, no qual acabaria recebendo a notícia de
que atingira o objetivo: estava no STF.
“Aí eu passei meia hora rezando tudo o que eu sei de reza possível e
imaginável. Quando ele [Cardozo] abriu a porta, falou: “Você não vai me
dar um abraço? Você é o próximo ministro do Supremo Tribunal Federal”.
Foi aí que eu chorei. Extravasei.”
Fux, no julgamento, chancelou basicamente tudo que Joaquim Barbosa
defendeu, para frustração e raiva das pessoas que ele procurara para
conseguir a nomeação, a começar por Dirceu.
Fux é, em si, uma prova torrencial de quanto o STF está longe de ser o
reduto de Catões que muitos brasileiros, ingenuamente, pensam ser.
O caso Fux tem outros desdobramentos, naturalmente.
O país tem que encontrar, urgentemente, fórmulas para desvincular a Justiça e o Executivo.
Se com sua espantosa fraqueza emocional Fux chegou afinal ao STF não
foi por ter impressionado pela obra, pelo saber e pelo caráter.
Foi — como sugerem fortemente os depoimentos à Folha de Dirceu e dele
mesmo, Fux — por ter dito o que os que definiriam a escolha queriam
ouvir.
Não é um bom critério. Não é um critério justo.
A Justiça tem que manter distância altiva da política — e da mídia,
igualmente. As fotos de alegre cumplicidade de integrantes do STF com
jornalistas como Merval Pereira e Reinaldo Azevedo são moralmente
repulsivas. Que isenção se poderia esperar do STF ao julgar eventuais
causas que envolvam não exatamente tais jornalistas, peixes pequenos,
mas as empresas para as quais trabalham? E que tipo de tratamento
jornalístico os leitores devem esperar de uma relação tão camarada?
Como Feliciano em outra esfera, Fux representa, hoje, uma crise moral na justiça brasileira, um embaraço.
Como ele não se autonomeou, é preciso não esquecer que para
consolidar a justiça brasileira – e a democracia — os métodos de
nomeação devem ser urgentemente aprimorados.
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