Revoluções de 1848 na Europa, o berço do socialismo |
O socialismo, como força política significativa, surgiu na Europa em meados do século XIX, depois da grande vaga
revolucionária de 1848 e da Comuna de Paris de 1871. O movimento se armou com
as teorias comunistas elaboradas por Karl Marx e Friedrich Engels,
organizando-se em sindicatos e partidos operários, principalmente na Alemanha e
na França, onde se forjaram atuando a duras penas, sob a repressão implacável de
Otto von Bismarck e Napoleão III, respectivamente. O programa original dos
socialistas europeus – já então conhecidos como social-democratas – era revolucionário:
na esteira de Marx e Engels, previa que as contradições internas do capitalismo
abririam o caminho para uma revolução do proletariado e a implantação do
socialismo. Para a social-democracia nascente, a democracia representativa era apenas
um meio de se fortalecer para denunciar o capitalismo.
Karl Marx e Friedrich Engels |
Mas no final do século XIX, ao
perceber que a crise final do capitalismo não acontecia e que as condições
materiais da classe operária melhoravam, principalmente por causa da ação dos
socialistas, teóricos e políticos como Edward Bernstein (Alemanha) e Alexandre Millerand
(França) começaram a pensar que a revolução se tornara impossível e que agora a
tarefa dos socialistas era lutar para reformar o capitalismo, tornando-o mais
humano. Essas teses, chamadas de “revisionistas” e “possibilistas” foram
atacadas pela nata da II Internacional, de Karl Kautsky a Rosa Luxemburgo, passando
por Georg Plekânov e August Bebel. Mas a II Internacional só racharia mesmo com
a Primeira Guerra Mundial, quando seus principais dirigentes decidiram apoiar
seus governos nacionais. Líderes como Rosa Luxemburgo, Karl Liebknecht e Vladimir
Lênin denunciaram o “chauvinismo” das lideranças da organização e romperam com ela.
A Revolução Bolchevique de Outubro de 1917 |
O racha se tornaria
definitivo em 1917, quando Lênin e Trotsky lideraram a revolução bolcheviue (comunista)
na Rússia czarista. A partir de então, o movimento operário se dividiu em duas
alas inconciliáveis: de um lado os social-democratas ou socialistas, que
acabaram adotando as teorias de Bernstein/Millerand, embora, num primeiro
momento, sem abandonar o discurso marxista; de outro, os comunistas, que diziam
que apenas resgatavam a tradição revolucionária abandonada pela II
Internacional. A III Internacional (ou Komintern), com sede em Moscou, surgia
como a sede da revolução socialista internacional, esperando pelo despertar do proletariado
ocidental.
Stálin na Praça Vermelha |
Mas a revolução mundial
faltou ao encontro. Fracassou na Alemanha, na Hungria, na Polônia e na Itália. Os
soviéticos então recuaram a adotaram a ideia – até então estranha ao marxismo –
de “socialismo num só país”. A partir de então, o experimento comunista na União
Soviética, com a perenização de uma ditadura de partido único, parecia indicar
o único caminho possível à esquerda revolucionária mundial – dissidências como
o trotskismo eram marginais. Mesmo com a coletivização forçada entre 1929-1934, a derrota dos republicanos na
guerra civil espanhola de 1936; os sangrentos expurgos de 1936-1938 no PC soviético e o colossal erro de avaliação da
III Internacional, cuja subestimação do perigo nazista na Alemanha impediu a
formação de uma aliança entre comunistas e socialistas. Mas o decisivo
envolvimento do Exército Vermelho na II Guerra na derrota do nazi-fascismo, bem
como a formação de inúmeras guerrilhas comunistas contra os alemães em vários
países europeus (Itália, França, Iugoslávia) levou o prestígio da URSS aos píncaros.
Willy Brandt no Congresso de Bad Godsberg (1959) |
O fim do conflito mundial
trouxe a bipolaridade EUA/URSS e a Guerra Fria. Regimes pró-soviéticos dominaram
o Leste Europeu. E a social-democracia finalmente deu adeus ao marxismo em
1959, quando o Partido Social Democrata Alemão, no Congresso de Bad Godsberg,
abandonou a referência à luta de classes, ao proletariado e à revolução socialista.
Por outro lado, o congresso mudou a relação do partido com a democracia representativa:
de tática para tomar o poder ela virou “valor universal”.
O período de 1950 a 1979 foram os “anos
dourados” da social-democracia europeia. Com ajuda do Plano Marshall, do
keynesianismo e, às vezes, até dos partidos conservadores, a social-democracia construiu
o welfare state na Europa, com pleno
emprego, ampla rede de proteção social e garantias individuais. O preço foi se
alinhar aos Estados Unidos e à OTAN (aliança militar ocidental) contra a União
Soviética. Já esta última, apesar de experimentar grande desenvolvimento econômico
e tecnológico, enfrentou muitas rebeliões em seus satélites do Leste: Belgrado
(1947); Berlim (1953); Budapeste e Varsóvia (1956) e Praga (1968) – todas, à
exceção de Belgrado e Varsóvia, sufocadas com tanques do Pacto de Varsóvia. Mesmo
a vitória dos comunistas na China, em 1949, se revelaria fonte de permanentes
dores de cabeça para Moscou, até o rompimento, em 1961.
Berlinguer, Carrillo e Marchais, os pais do Eurocomunismo |
Os anos 1970 e 1980 trouxeram
mudanças significativas para os grandes partidos comunistas e socialistas da
Europa ocidental. Em primeiro lugar, os maiores PCs do Ocidente (Itália, França
e Espanha) romperam com a tutela de Moscou e fundaram o “Eurocomunismo”, uma tendência
que, de certa maneira, fez o caminho de volta e abraçou as teses reformistas que
o SPD adotara em Bad Godsberb. Entre
as mudanças, a mais decisiva para os comunistas foi a admissão de que a
democracia deixara de ser expediente tático para se tornar “valor universal”,
como para os social-democratas.
Estátua de Lênin retirada |
Estes, por sua vez, viveriam uma
espécie de “reação termidoriana”. Acossados pelos conservadores, que adotaram o
receituário neoliberal para desmantelar o welfare
state, os social-democratas capitularam, copiando a fórmula de seus
inimigos. Começaram na Espanha, com Felipe González; depois na França, com
François Mitterrand; no Reino Unido, com Tony Blair; e finalmente na Alemanha,
com Gerhard Schröder. Ao aplicarem as mesmas políticas de austeridade, arrocho,
corte de impostos e aumento do desemprego de Thatcher e Ronald Reagan, os
social-democratas jogaram a última pá de cal no welfare state, talvez o melhor experimento social da humanidade. A
queda do Muro de Berlim (1989) e a implosão da União Soviética (1991) acabaram
por completar esse desmonte. O resultado é que hoje não apenas a utopia
comunista foi derrotada; também a ideia do capitalismo com face humana morreu. Ficamos
à mercê das teorias liberticidas de Milton Friedman e Friedrich Hayek,
irremediavelmente fadados a viver no mundo hobbesiano do homem como lobo do
homem.
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