Enxergando-se como principal beneficiário das manifestações de rua que
renegam o establishment, mesmo fazendo parte e sendo beneficiário do
poder constituído, Joaquim Barbosa defende junto à presidente Dilma
Rousseff a liberação de candidatos avulsos para as eleições
presidenciais de 2014; ele sairia ganhando com a nova regra; "É
excelente para o meu histórico pessoal ser lembrado nessas
manifestações", regozija-se; sozinho acima e à frente dos partidos
políticos, o presidente do STF poderia surgir, com o apoio inconfessável
de grupos radicais, como o nome capaz de higienizar todo o sistema
político brasileiro, com poderes até mesmo para revogá-lo; um pai; um
salvador; um ditador?
26 DE JUNHO DE 2013
247 – O presidente do STF, Joaquim Barbosa, parecia extremamente
satisfeito, no final da tarde da terça-feira 25, ao falar aos
jornalistas na sede do Conselho Nacional de Justiça.
Exibia, sempre em
pé, abraçado à cadeira mais alta da sala de entrevistas, aquele sorriso
de canto de boca, sem aparentar o menor sinal de preocupação com as
manifestações de rua que, de outro modo, têm deixado a presidente Dilma
Rousseff com os olhos fundos e a face tensa. É que Joaquim sabe que as
marchas o beneficiam.
"A democracia brasileira está madura para não se deixar abalar por este
tipo de manifestações", celebrou ele, deixando em seguida um alerta:
"Mas é preciso tomar as decisões certas diante delas".
E quais são, do ponto de vista de Barbosa -- nome citado por mais de 30
por cento dos manifestantes ouvidos pelo Instituto Datafolha como o
homem em que gostariam de votar para presidente da República – essas
"decisões certas"?
Uma delas, sem dúvida a mais importante para os planos pessoais do
próprio Barbosa, ele não revelou aos jornalistas, mas explicitou a
Dilma: a liberação para candidatos avulsos, não filiados a partidos
políticos, concorrerem às eleições de 2014 e a todas as próximas.
"É excelente para o meu histórico pessoal ser lembrado dessa maneira,
mas já tenho 41 anos de vida pública. Chega, né?", disse ele aos
jornalistas, deixando uma resposta aberta no ar. Chega mesmo? Está
cansado ou pode, a depender das circunstâncias, ficar um pouco mais?
As dúvidas lançadas naquele instante, na simples interrogação, somadas à
defesa feita à Dilma sobre o estabelecimento de candidatos avulsos nas
regras eleitorais, mostram que Barbosa está acelerando seu jogo. Ele
percebeu que pode pessoalmente emergir das marchas como a resultante que
refletiria os desejos generalizados de varrição da corrupção política,
ultrapassagem das estruturas partidárias e tornar-s o repositário de
esperanças num Brasil higienizado. O pai.
Não interessa a Barbosa, para manter-se no coração de uma boa parte dos
que protestam, associar-se a qualquer estrutura política, exatamente
para ter a liberdade de expor numa nova esfera, como vem fazendo no STF,
seu personalismo. Essa esfera seria a chefia do Poder Executivo.
No STF, Joaquim Barbosa acostumou-se a ser promotor e juiz ao mesmo
tempo, acusando e julgando, humilhando e ironizando, enfeixando plenos
poderes para fazer valer sua vontade para além do colegiado. Tem sido
assim também no exercício da presidência do Conselho Nacional de
Justiça, onde ele vive às turras com as estruturas formais,
apontando-lhes defeitos e mazelas, mas sem jamais abrir mão dos
galhardões e mordomias que elas lhe oferecem, como choferes, carrões e
até banheiros reformados ao seu feitio.
O estabelecimento de candidaturas avulsas a cargos eletivos,
especialmente o de presidente da República, é a chave para que Barbosa
possa exibir a todo Brasil, à frente e acima do "tudo o que está aí",
seu perfil de paladino da moralidade e dos bons costumes. Ele estaria
liberado, a partir do que poderá alegar como sendo o chamamento das
massas revoltadas, para empreender uma cruzada contra todo o
establishment, mesmo sendo parte e beneficiário dele. Havendo uma
situação de convulsão social, risco inerente à dimensão que as
manifestações estão alcançando, ele seria o elemento de pacificação. O
salvador.
Numa eleição presidencial, as aparências são o que importam. E,
aparentemente, Barbosa é o sujeito que fala grosso com os poderosos, o
pobre que chegou lá para agir como fariam seus iguais. Acima dos
partidos, das classes sociais, das categorias profissionais e das
diferenças regionais, ele poderia encarnar como candidato de si mesmo e
das massas agitadas a higienização das instituições democráticas sob o
manto – ou melhor, a toga – da restituição e da renovação. Um passo
perigosamente na direção, até mesmo, da sua revogação.
Passa a existir, com a candidatura avulsa, o risco Joaquim. O atual
presidente do STF seria o ponto de encontro entre os que gostariam de
ultrapassar os partidos políticos como etapa necessária para a chegada
ao poder. Uma espécie de 'vamos direto ao ponto' pelo qual, no momento
seguinte à superação das legendas, se demonstraria que os partidos não
mais serviriam como organizações de expressão de ideias e programas
determinados, retirando-lhes toda importância. Casse-se. Estaria aberto,
então, o caminho para o retorno do autoritarismo, no qual um único
iluminado, como Barbosa ou outro qualquer, agiria em nome de massas
disformes e numerosas, barulhentas e com nichos de violência e
discriminação dentro de si, cujas reais dimensões vão sendo conhecidas
aos poucos, até um limite ainda não claramente delineado.
"O povo unido não precisa de partido", gritam manifestantes. Não
precisam de "par-ti-do", frisam, no que soa como música de primeira
linha aos ouvidos de Barbosa. Sem os partidos, na base do avulso, alguém
terá de se apresentar para personificar esse brado – e lá estará o
heróico JB para unificar essa força e ser a sua mais perfeita tradução.
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