“O ao
vivo sem pós-produção da ‘Mídia Ninja’ é capaz de despertar debates sem o
aval da mesma mídia que está, hoje, enxugando suas redações e
precarizando seus funcionários.
Bruno Torturra e Pablo Capilé do Mídia Ninja ,estiveram também no programa Roda Viva |
Em entrevista à ‘Carta Maior’, os ninjas
reclamam da falta de um marco regulatório da mídia e dizem que "a ausência de regulação dificulta o exercício da liberdade de expressão da população."
Por Caio Sarack, no “Carta Maior”
A simultânea crise e consolidação dos veículos tradicionais também recebe no seu seio mídias agora reconhecidas como alternativas. Com modo de expor particular: o fato tal como ele se dá e "se dando". O "ao vivo" sem pós-produção. O debate, então, é aberto obrigatoriamente sem aval da mesma grande mídia que está, hoje, enxugando suas redações e precarizando seus funcionários.
Desponta um grupo dentre estes que são conhecidos como “meios alternativos de informação”: o “Ninja” (Narrativas Independentes, Jornalismo e Ação). O grupo cedeu entrevista por e-mail à “Carta Maior” e nos contou sobre sua configuração e posição políticas.
A iniciativa fala de dar poder aos novos protagonistas da realidade brasileira, mas também o posicionamento do mercado e Estado traz questionamentos que deverão seguir no horizonte dessa mídia que, mesmo incipiente, tem seu importante papel. Aprofundar e efetivar a liberdade de expressão ‘para além do capital’ passa a ser hoje uma das principais pautas da expansão da democracia.
Carta Maior: Quando se iniciaram as atividades do grupo? Quantas
pessoas participam do grupo e como são coordenadas suas atividades?
Mídia Ninja: O ‘Ninja’ surge a partir de um acúmulo de mais de 15 anos de produção midialivrista no Brasil, de experiências que vão desde os fanzines e da blogosfera ao ‘Fora do Eixo’, rede que está em mais de 200 cidade no país e vem desenvolvendo tecnologias de comunicação e produção de conteúdo há 7 anos. Nesse processo, aproximou de si outras redes, coletivos, jornalistas e midialivristas que, juntos, deram início a um projeto que, ao mesmo tempo, conseguiu que se fortalecesse um veiculo independente, como também catalisar uma rede de comunicação autônoma que usufrui dos frutos e ferramentas desenvolvidas durante esse histórico.
Hoje, ele é uma rede descentralizada de comunicadores que buscam novas possibilidades de produção e distribuição de informação. São milhares de pessoas usando a lógica colaborativa de compartilhamento que emerge da sociedade em rede como premissa e ferramenta. A iniciativa veio à tona há meses atrás, durante a cobertura do “Fórum Mundial de Mídia Livre” na Tunísia. Desde então, o “Ninja” vem realizando coberturas por todo Brasil, apresentando pautas e abordagens omitidas na mídia tradicional.
CM: Qual, na opinião de vocês, é a função das narrativas independentes? De que maneira vocês quiseram retratar os atos e protestos dos últimos dois meses?
MN: A função das narrativas independentes é dar poder a cada vez mais gente para contar histórias a partir do ponto de vista do que estão vivendo. Mais do que uma ferramenta, é uma noção que ajuda a dimensionar a comunicação como serviço de utilidade pública.
Além de comunicadores, somos ativistas também. Quando fomos fazer a cobertura da vinda do Papa ao Brasil, por exemplo, direcionamos o nosso olhar para entender quem era contra a visita de Francisco, não contra a religião, mas que protestava pela ausência de um Estado laico.
Logo, as nossas coberturas sempre explicitarão aquilo que, de fato, estamos vendo e vivendo. Nós também tomamos bombas em protesto, dois de nós já foram presos apenas por estar exercendo o direito à comunicação. Quando fazemos a cobertura de um protesto indígena ou quilombola, estamos de fato envolvidos com aquela pauta; não se ganha legitimidade com quem está nas ruas apenas com discurso; a nossa prática de mídia precisa estar com a frequência modulada com o espaço-tempo da nossa geração.
CM: O que pensam do Marco Regulatório da Mídia? Como vocês veem o problema da mídia no Brasil?
MN: A ausência de regulação dificulta o exercício da liberdade de expressão da população, e favorece a existência de oligopólios que tanto comprometem a pluralidade nos conteúdos que são veiculados quanto à independência nas pautas.
Outro ponto: a falta de um marco regulatório não condiz com o contexto político, que apresenta o empoderamento de uma nova geração de protagonistas. As possibilidades que temos com a tecnologia disponível hoje em dia e as possibilidades de democratização da produção de conteúdo também não são contempladas.
É dever do Estado também promover a diversidade de opiniões. Uma lei contribuiria necessariamente para a não criminalização dos movimentos sociais, por exemplo. Além de garantir a diversidade e o direito de manifestação e liberdade de expressão, distribuindo de forma mais equânime e democrática o recurso público ou o espectro eletromagnético.
Da forma que está hoje, a “Globo” recebe uma porcentagem gigantesca das verbas de publicidade do governo e uma emissora como a “Jovem Pan” ocupa uma faixa de espectro equivalente a de centenas de rádios comunitárias.
CM: De que maneira vocês se colocam no debate político hoje?
MN: A mídia livre é um ato político, e todo ato precede necessariamente de um debate. Tomar uma posição diante do que estamos cobrindo sem vestir o manto da falsa imparcialidade da grande mídia já é uma forma de se colocar.”
Por Caio Sarack, no “Carta Maior”
A simultânea crise e consolidação dos veículos tradicionais também recebe no seu seio mídias agora reconhecidas como alternativas. Com modo de expor particular: o fato tal como ele se dá e "se dando". O "ao vivo" sem pós-produção. O debate, então, é aberto obrigatoriamente sem aval da mesma grande mídia que está, hoje, enxugando suas redações e precarizando seus funcionários.
Desponta um grupo dentre estes que são conhecidos como “meios alternativos de informação”: o “Ninja” (Narrativas Independentes, Jornalismo e Ação). O grupo cedeu entrevista por e-mail à “Carta Maior” e nos contou sobre sua configuração e posição políticas.
A iniciativa fala de dar poder aos novos protagonistas da realidade brasileira, mas também o posicionamento do mercado e Estado traz questionamentos que deverão seguir no horizonte dessa mídia que, mesmo incipiente, tem seu importante papel. Aprofundar e efetivar a liberdade de expressão ‘para além do capital’ passa a ser hoje uma das principais pautas da expansão da democracia.
Bruno Torturra e Pablo Capilé, do Mídia Ninja |
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Mídia Ninja: O ‘Ninja’ surge a partir de um acúmulo de mais de 15 anos de produção midialivrista no Brasil, de experiências que vão desde os fanzines e da blogosfera ao ‘Fora do Eixo’, rede que está em mais de 200 cidade no país e vem desenvolvendo tecnologias de comunicação e produção de conteúdo há 7 anos. Nesse processo, aproximou de si outras redes, coletivos, jornalistas e midialivristas que, juntos, deram início a um projeto que, ao mesmo tempo, conseguiu que se fortalecesse um veiculo independente, como também catalisar uma rede de comunicação autônoma que usufrui dos frutos e ferramentas desenvolvidas durante esse histórico.
Hoje, ele é uma rede descentralizada de comunicadores que buscam novas possibilidades de produção e distribuição de informação. São milhares de pessoas usando a lógica colaborativa de compartilhamento que emerge da sociedade em rede como premissa e ferramenta. A iniciativa veio à tona há meses atrás, durante a cobertura do “Fórum Mundial de Mídia Livre” na Tunísia. Desde então, o “Ninja” vem realizando coberturas por todo Brasil, apresentando pautas e abordagens omitidas na mídia tradicional.
CM: Qual, na opinião de vocês, é a função das narrativas independentes? De que maneira vocês quiseram retratar os atos e protestos dos últimos dois meses?
MN: A função das narrativas independentes é dar poder a cada vez mais gente para contar histórias a partir do ponto de vista do que estão vivendo. Mais do que uma ferramenta, é uma noção que ajuda a dimensionar a comunicação como serviço de utilidade pública.
Além de comunicadores, somos ativistas também. Quando fomos fazer a cobertura da vinda do Papa ao Brasil, por exemplo, direcionamos o nosso olhar para entender quem era contra a visita de Francisco, não contra a religião, mas que protestava pela ausência de um Estado laico.
Logo, as nossas coberturas sempre explicitarão aquilo que, de fato, estamos vendo e vivendo. Nós também tomamos bombas em protesto, dois de nós já foram presos apenas por estar exercendo o direito à comunicação. Quando fazemos a cobertura de um protesto indígena ou quilombola, estamos de fato envolvidos com aquela pauta; não se ganha legitimidade com quem está nas ruas apenas com discurso; a nossa prática de mídia precisa estar com a frequência modulada com o espaço-tempo da nossa geração.
CM: O que pensam do Marco Regulatório da Mídia? Como vocês veem o problema da mídia no Brasil?
MN: A ausência de regulação dificulta o exercício da liberdade de expressão da população, e favorece a existência de oligopólios que tanto comprometem a pluralidade nos conteúdos que são veiculados quanto à independência nas pautas.
Outro ponto: a falta de um marco regulatório não condiz com o contexto político, que apresenta o empoderamento de uma nova geração de protagonistas. As possibilidades que temos com a tecnologia disponível hoje em dia e as possibilidades de democratização da produção de conteúdo também não são contempladas.
É dever do Estado também promover a diversidade de opiniões. Uma lei contribuiria necessariamente para a não criminalização dos movimentos sociais, por exemplo. Além de garantir a diversidade e o direito de manifestação e liberdade de expressão, distribuindo de forma mais equânime e democrática o recurso público ou o espectro eletromagnético.
Da forma que está hoje, a “Globo” recebe uma porcentagem gigantesca das verbas de publicidade do governo e uma emissora como a “Jovem Pan” ocupa uma faixa de espectro equivalente a de centenas de rádios comunitárias.
CM: De que maneira vocês se colocam no debate político hoje?
MN: A mídia livre é um ato político, e todo ato precede necessariamente de um debate. Tomar uma posição diante do que estamos cobrindo sem vestir o manto da falsa imparcialidade da grande mídia já é uma forma de se colocar.”
zz2bULeia Mais: http://www.meioemensagem.com.br/home/meio_e_mensagem/blog_regina_augusto/2013/08/06/Post-Midia-Ninja-e-narrativas-inadequadas.html#ixF2j7Ce
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FONTE: escrito por Caio Sarack, no site “Carta Maior”
MATÉRIA COMPLEMENTAR .
Mídia Ninja é uma espécie de Davi contra o Golias |
O MVIVA foi buscar no Estadão esta matéria publicada em 06 de junho de 2013, pouco antes das grandes manifestações de rua que varreram o Brasil, para dar um pouco mais de informação sobre esta nova realidade, que empareda a velha grande mídia corrupta que, de rabo preso, perde bastante o seu antigo poder.
No meio do redemuinho
O Mídia Ninja não tenta explicar ao espectador o que está acontecendo. Com seu material bruto, prefere levar o próprio público ao centro da ação
Camila Hessel - O Estado de S. PauloUma mochila. Um laptop. Partindo do laptop, um cabo
conectado ao iPhone. O sinal da rede 3G. Ou o wi-fi de alguém da
redondeza. Às vezes um modem 4G conectado ao mesmo laptop. Está armada a
“unidade móvel” do Mídia Ninja.
Mídia Ninja
Para entrar no ar, um dos vários canais gratuitos de transmissão de
vídeo na internet. Para atrair espectadores, um post no Facebook, outro
no Twitter. A dinâmica de compartilhamentos das redes sociais se
encarrega de avisar que ela está lá.
Lá mesmo, no fim da Paulista, às últimas horas da terça, 18/6, bem no
momento em que um pequeno grupo decide atear fogo ao painel da Copa das
Confederações. Lá na M’Boi Mirim, no meio de manifestantes sentados em
círculos, que repetiam num jogral a pauta das reivindicações a serem
levadas ao subprefeito na quarta seguinte.
O Mídia Ninja (uma abreviação livre de Narrativas Independentes
Jornalismo e Ação) não obedece à formalidade nem aos rituais da mídia
tradicional. Suas imagens são transmitidas em tempo real, sem nenhuma
edição. Não há vistas aéreas, não há tomadas a partir de postos de
observação: é rua o tempo inteiro, e o ponto de vista é o mesmo do
manifestante. Daí as imagens tremidas em meio à correria e os longos
trechos de caminhada em busca dos pontos onde se reagrupam os
dispersados. A narrativa é crua. Não tenta (nem seria capaz de) explicar
ao espectador o que está acontecendo. Com seu material bruto, coloca o
público no centro da ação.
Mas a quem pertencem as mochilas? A um grupo de ativistas que, depois
de fazer uma cobertura ao vivo da Marcha da Liberdade, realizada em São
Paulo em 28 de maio de 2011, lançou uma série de programas de debates
transmitidos pela internet em um canal batizado de PósTV. Ligados a
diferentes grupos militantes, a maioria deles fazia parte do Movimento
Fora do Eixo, coletivo cultural fundado em 2005 por produtores de Campo
Grande, MT, Rio Branco, AC, Uberlândia, MG, e Londrina, PR, com o
objetivo inicial de promover músicos e bandas de todas as regiões do
Brasil, em especial as situadas além do eixo Rio-São Paulo. Presente em
25 cidades, agora também se ocupa da organização de festivais e eventos
no Brasil e no exterior, novamente fora do circuito comercial
tradicional.
Os autointitulados ninjas, que sempre mostram a cara, expandiram sua
grade de programação no primeiro turno das eleições municipais no ano
passado, realizando programas diários que discutiam as diferentes
candidaturas em 20 cidades do País. Para tanto, se valeram da
capilaridade – e dos recursos – do Fora do Eixo. No começo deste ano,
visitaram aldeias dos guaranis-caiovás no Mato Grosso do Sul para uma
série de reportagens e cobriram o Fórum Social Mundial na Tunísia.
Quando se preparavam para discutir linhas de pauta, alternativas de
financiamento e os próximos passos da iniciativa, os 20 centavos
explodiram nas ruas e os ninjas se jogaram de cabeça nos protestos.
A maioria deles não tem formação jornalística. O chamado núcleo duro,
responsável pelas transmissões que ajudaram a dar visibilidade ao
coletivo, é formado por cerca de dez jovens, quase todos com menos de 25
anos. A exceção é Bruno Torturra, de 34, que trabalhou na revista Trip
por 11 anos como repórter, editor e diretor de redação. Ele, que ficou
nos bastidores coordenando as coberturas, orientando quem estava na rua,
afirma que a cobertura era guiada por instinto, por um “espírito de
perdigueiro sem muito adestramento, sem processos e técnicas que são,
sim, muito valiosos”.
Um exemplo dessa falta de “adestramento” foi dado durante a
transmissão do dia 18 de junho. Filipe Peçanha, carioca de 24 anos que
estudou audiovisual, acompanhava a manifestação desde a porta da
Prefeitura. Depois de quase quatro horas no ar, de ter percorrido 4,5
quilômetros e ser atingido pelo gás lacrimogêneo, ele não se conteve
quando o policial militar sem identificação no uniforme ordenou que
desligasse a câmera. Correndo atrás do oficial para fazer com que
dissesse o próprio nome, desferiu palavrões do mesmo naipe daqueles de
torcedor contra juiz. Como esse formato de transmissão permite uma
intervenção imediata do público por meio da seção de comentários, logo
ficou claro: boa parte dos espectadores não gostou da atitude. Para
Peçanha, é o preço do ao vivo – e de um novo jornalismo. Ele reconhece
que, no calor do momento, qualquer um pode perder a cabeça. E atribui a
reação do público a uma visão “antiquada”, a de que o repórter tem de
ser imparcial, sempre. “Não estamos cobrindo um ato, estamos nele. As
reações do repórter podem ter um efeito importante de denúncia.”
O calor que vem das redes, principalmente na forma de comentários, é
objeto de trabalho de uma parcela da equipe fincada no QG. Dríade
Aguiar, de 22 anos, faz parte dela. Se estivéssemos falando de uma
emissora de TV tradicional, Dríade seria chamada de produtora. Na PósTV,
ela ajuda a delimitar as coberturas mapeando atos e manifestações pelo
País, identificando fotógrafos e repórteres que possam cuidar de cada um
desses eventos e, uma vez com as transmissões em curso, triando os
comentários e repassando dicas de furos e alertas de quem está nas ruas.
Assim como Peçanha, Dríade, cuiabana que mora em São Paulo desde o fim
de 2010, faz parte do Movimento Fora do Eixo. Ela se juntou a eles aos
16 anos, quando cobria eventos culturais para redes sociais. Cursou
apenas três meses da faculdade de história, que abandonou para se
dedicar integralmente às atividades do coletivo.
O trabalho de base, feito por jovens como Dríade, ajuda a estabelecer
uma conversa entre espectadores e emissores e também a entender a
simpatia com que os ninjas vêm sendo recebidos pelas ruas. Comerciantes
emprestam tomadas para recarregar as baterias dos laptops, admiradores
enviam mensagens colocando carros e equipamentos à disposição das
equipes, moradores do entorno dos atos compartilham senhas de wi-fi e
chegam a abrir suas casas para que os repórteres possam tomar banho ou
descansar sem precisar se afastar dos centros nervosos. O calor da ação
empolga até profissionais experientes, como o correspondente da Globo
News em Nova York Jorge Pontual. Na noite do dia 18/6, quando Filipe
Peçanha corria com seu iPhone pela Avenida Paulista, Pontual indicava o
link da transmissão aos seus seguidores: “Se a bateria do ninja não
morrer, eu não durmo essa noite”.
O domínio sobre a tecnologia é outro aspecto que intriga os
espectadores do Mídia Ninja. Que operadora de telefonia usam? Como
conseguem sinal no meio da multidão? Que telefones e computadores são
esses cujas baterias parecem imortais? São os mesmos nossos de cada dia.
Mas os ninjas se valem de gambiarras e jeitinhos que foram aprendendo
na produção dos festivais de música da Fora do Eixo. Até fevereiro deste
ano, as transmissões fora do estúdio ou de um espaço para shows tinham
mobilidade limitada. Eles se muniam de cabos de até 300 metros para
conectar as câmeras à internet e tinham de se restringir a esse raio de
ação. Foi durante o carnaval que, em conjunto com o coletivo Tanque Rosa
Choque, da USP, criaram seu caminhão link. A ideia era construir um
minitrio elétrico para animar os blocos de carnaval que inundaram os
quarteirões de diferentes regiões da cidade. Em um carrinho de
supermercado, reuniram duas caixas de som, um gerador, uma mesa de som e
laptops.
Quando, meses mais tarde, se preparavam para cobrir os protestos,
devolveram o carrinho ao asfalto, turbinado com uma câmera Go Pro e uma
torre improvisada. Para garantir internet móvel pelo percurso, visitaram
apartamentos e estabelecimentos comerciais ao longo do trajeto das
manifestações pedindo acesso às suas redes de internet sem fio. Também
perceberam que o melhor momento para fazer transmissões via rede 3G é
quando a polícia entra com a força para dispersar os manifestantes.
“Quando todo mundo guarda os celulares no bolso para sair correndo, é
hora de sacar os nossos”, diz Torturra.
Boa parte do tal núcleo duro mora na Casa Fora do Eixo (R. Escuvero,
282, Cambuci), onde até o guarda-roupa é compartilhado. Celulares,
computadores, câmeras e planos de internet são, portanto, bancados pelos
recursos do Fora do Eixo. Pablo Capilé, principal porta-voz do
movimento, diz que a força de trabalho, composta por gente jovem,
altamente qualificada e que se envolve nos projetos como militante, é a
principal força mantenedora. E os festivais e eventos que produzem
(alguns deles realizados em 300 cidades simultaneamente), a principal
fonte de renda. Dinheiro público? Capilé diz que não passa de 3% do
total.
A dúvida que paira sobre a evolução e o futuro de um veículo de mídia
alternativa como a Ninja é o que fazer para financiar sua expansão sem
cair no modelo tradicional das empresas jornalísticas, que passam por
crises no mundo todo. A ambição declarada é fugir de formatos padrão e
evitar clichês. Mas o caminho para colocar na rua uma grande equipe de
reportagem que teria como elemento central células temáticas tocadas por
editores mais experientes está longe de ser pavimentado. Eles são
completamente avessos à ideia de um conglomerado com fins lucrativos.
Acreditam que esse modelo é o responsável pelo abalo da imprensa.
Rechaçam também uma organização hierárquica. Defendem um sistema
horizontal, sem sócios, sem chefes, em que as decisões são tomadas por
consenso. E veem nas ferramentas de financiamento coletivo
(crowdfunding) a principal alternativa. “O leitor, o espectador, se
sente diretamente responsável pelo que é produzido. Cria-se uma relação
interessante”, diz Torturra.
Outro elemento importante é delimitar o foco da cobertura quando as
ruas se aquietarem. Eles dizem que a agenda atual já dá mostras desse
futuro. Além das manifestações, os jovens vêm cobrindo aulas abertas que
ajudam a aprofundar temas dos protestos, como modelos alternativos de
transporte, e ações de movimentos sociais, como ocupações e assembleias.
Nesse cenário, a veia militante dos ninjas pode ameaçar a qualidade do
jornalismo produzido? Eles acreditam que a disputa por narrativas criou
novos parâmetros e demandas. “A melhor forma de nossa militância não
significar perda de qualidade é não esconder nada”, diz Torturra. “É
preciso não tentar vê-la como antítese da objetividade. Só é fundamental
que o posicionamento fique claro.” Quanto ao surgimento de outros
ninjas em novas redes – e às críticas de que estariam mais interessados
em construir uma marca do que um novo modo de narrativa – os ninjas
originais dizem o seguinte: o objetivo final é perder o controle. É ver
surgir muitos novos clãs inspirados por eles – e que os inspirem também.
.
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