Há 71 anos, em 20 de agosto de 1940, Leon Trotsky, um dos líderes da Revolução Bolchevique de 1917, era assassinado no México, onde estava exilado, por um sicário de Stálin, Ramón Mercader (foto acima). Falar de Trotsky ou de Revolução Bolchevique hoje em dia parece ser um convite a contrair irritação nas vias respiratórias depois de ter revirado o pó do baú da vovozinha. Afinal, num mundo onde a ideia de democracia virou consenso, pensar em revoluções socialistas e regimes de partido único soa atualmente tão demodée quanto o absolutismo de Luís XIV. No entanto, até 25 anos atrás, o comunismo ainda era uma força política poderosa e influente em todo o mundo. É verdade que foi uma utopia que se degenerou em regimes totalitários ou semi-totalitários de triste memória na Rússia e na Europa do Leste.
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Uma vez no poder, Trotsky demonstrou um fervor de "cristão novo" na defesa da tese leninista sobre o papel dirigente do partido. E ele se saiu "melhor que a encomenda", enterrando a postura libertária do passado e revelando-se até mais autoritário do que Lênin, como mostram sua condução implacável do Exército Vermelho, a repressão impiedosa que ele dirigiu contra os operários da base naval de Kronstadt – que em 1921 se rebelaram contra a autocracia bolchevique – e a vigorosa defesa que fez da “militarização do trabalho” em plena fase de estabilização política do regime.
Foi como Comissário de Guerra, aliás, que Trotsky mostrou sua impressionante capacidade de organização. Para enfrentar os exércitos de 21 países que, aliados às tropas “brancas” russas da contra-revolução, tentavam derrubar o regime comunista, Trotsky criou, praticamente do nada, o Exército Vermelho. Convencido de que a guerra moderna exigia conhecimentos militares especializados e férrea disciplina, ele ordenou o recrutamento compulsório dos camponeses e não vacilou em pôr no comando antigos oficiais do Exército czarista, embora vigiados por “comissários políticos” do partido. Baixou o centralismo punindo exemplarmente com a pena de morte atos de deserção ou indisciplina. Com isso, entrou em choque com a velha guarda bolchevique, que queria uma milícia popular dirigida por comunistas, com oficiais eleitos pela tropa. “Aviso que se qualquer unidade recuar sem ordens para tal, o primeiro a ser fuzilado será o comissário da unidade, e depois o comandante”, dizia Trotsky em uma de suas ordens. A dramática vitória militar contra os brancos e estrangeiros e o apoio irrestrito de Lênin fizeram triunfar a visão de Trotsky de um Exército não-partidário – mas atraíram a oposição de Stálin e da velha guarda.
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Trotsky defendia a radicalização da revolução no campo, com o fim da NEP, a expropriação dos camponeses e a estatização da propriedade da terra. Em aliança com Nikolai Bukhárin, teórico da "via capitalista" no campo, Stálin manteve a NEP e abraçou a ideia de "socialismo num só país". Uma vez eliminada a "oposição de esquerda", anos depois, o próprio Stálin se voltaria contra Bukhárin, implantando em seguida a política trotsquista. Foi a "coletivização forçada" da agricultura, que, por meio de uma "acumulação primitiva de capital" sui generis, fez da União Soviética uma potência industrial - a ferro e fogo. A Trotsky, expulso do partido, exilado, vagando de país em país até se fixar no México, não restou outra coisa senão teorizar sobre a "Revolução Permanente" e fundar a IV Internacional - um clube de diletantes que fez muito barulho por nada - na esperança de implementá-la. Até ser atingido pelo quebra-gelo de Ramón Mercader.
"O mundo estava saturado de contradições extraordinárias. Em tempo algum o capitalismo esteve tão próximo da catástrofe quanto durante as depressões e colapsos da década de 1930; e em tempo algum mostrou uma elasticidade tão selvagem [...] Nunca tão grandes massas foram inspiradas pelo socialismo; e nunca foram tão impotentes e inermes. Em toda a história do homem moderno, nada é tão sublime e repulsivo quanto o primeiro Estado proletário e a primeira experiência em 'construir o socialismo'. E talvez nenhum homem tenha vivido numa comunhão tão próxima com os sofrimentos e com as lutas da humanidade oprimida e numa solidão tão profunda quanto Trotsky", escreveu Issac Deutscher, o maior biógrafo de Trotsky, em O Profeta Banido.
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