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Susan Sontag (1933-2004) |
"Se
os intelectuais das décadas de 1930 e de 1960 mostravam-se muitas vezes
demasiados crédulos, demasiado suscetíveis a apelos ao idealismo para
entender o que de fato se passava em determinadas sociedades sitiadas,
recém-radicalizadas, que eles podiam ou não ter visitado (brevemente), os
intelectuais rancorosamente despolitizados de hoje em dia, com o seu
cinismo sempre a postos, com o seu apego ao entretenimento, com a sua
relutância a se incomodarem com qualquer causa, com a sua dedicação à
segurança pessoal, parecem no mínimo igualmente deploráveis [...]
De maneira geral, o punhado de intelectuais que se considera pessoas
conscientes só pode agora ser mobilizado para ações restritas - contra,
digamos, o racismo ou a censura -, no âmbito de seus próprios países. Só
parecem plausíveis, agora, os compromissos políticos domésticos. Entre
intelectuais outrora dotados de preocupações internacionais, os apreços
nacionalistas recuperaram o prestígio. (Devo sublinhar que isso parece
mais verdadeiro em relação aos escritores do que aos médicos, cientistas
e atores). Houve uma implacável decadência da própria noção de
solidariedade internacional"
Não
foi só o bilateralismo global ('eles' contra 'nós'), característico do
pensamento político no decurso de todo o nosso breve século XX, desde
1914 até 1989 - fascismo contra democracia, o império americano contra o
império soviético - que desmoronou. O que se seguiu após 1989 e após o
suicídio do império soviético constitui a vitória final do capitalismo e
da ideologia do consumismo, que acarreta o descrédito do 'político'
como tal. A única coisa que faz sentido é a
vida privada. O individualismo e o culto de si mesmo e do bem-estar
privado - em que figura, acima de tudo, o ideal de 'saúde' - são os
valores mais aptos a receberem o aval dos intelectuais. ("Como você pode
passar tanto tempo num lugar onde as pessoas fumam o tempo todo?",
perguntou alguém aqui em Nova York ao meu filho, o escritor David Rieff,
referindo-se a suas frequentes viagens à Bósnia.)
George Orwell na Espanha |
[...]
Nas
palavras de Emile Durkheim, 'a sociedade é acima de tudo a ideia que
forma a respeito de si mesma'. A ideia que a sociedade próspera e
pacífica da Europa e da América do Norte formou a respeito de si mesma -
mediante as afirmações e as ações de todos os que poderiam chamar-se de
intelectuais - é de confusão, de irresponsabilidade, de egoísmo, de
covardia... e de busca da felicidade.
A nossa, não a deles. Aqui, não lá."
(Por Susan Sontag, "Lá" e "aqui", in Questão de Ênfase)
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