O PT não passou incólume por oito anos no poder e, se não alterar a rota, tende a acumular mais desgastes nos próximos quatro anos. Como já não se imaginava mais, o partido foi engrossado, nas bases, por um contingente de militantes lulistas - o partido de classe média intelectualizada, de esquerda, não apenas capturou eleitores na base da pirâmide social, como incorporou parte desse contigente em sua militância. Esse é o sonho de todo partido de trabalhadores, mas isso acontece no momento em que a legenda, totalmente institucionalizada, consolidou um processo de transferência de lideranças criadas na estrutura burocrática para o Parlamento e elas delimitaram territórios, ungidas por um sistema partidário uninominal que é intrinsicamente personalista. Esse descompasso se mostra mais agudo quando a direção nacional afrouxa e perde capacidade de unir a máquina partidária. As bancadas legislativas tendem a ocupar, então, maior destaque. Se não tomar um rumo, o PT pode perder o que tinha diferente em relação aos demais partidos, e a grande chance colocada, nesse momento, de renovação de quadros partidários.
No início de sua vida, o partido vivia o paradoxo de manter uma grande militância de classe média, de esquerda, nas ruas, mobilizá-la em torno das eleições mas, fechadas as urnas, enquadrar a representação parlamentar obtida ao restante do partido. A bancada parlamentar era o elo menos importante da organização partidária e os eleitos petistas, muitas vezes submetidos a decisões de outras instâncias que não tinham lógica na luta institucional. Essa dificuldade interna foi sendo resolvida aos poucos, na medida em que as lideranças passavam a postular cargos eletivos e se consolidava ideologicamente, no partido, o consenso em torno da via democrática de conquista do poder.
Ainda assim, as disputas ideológicas entre as diversas facções políticas mantinham paralelamente um debate político, ou seja, um confronto no campo das ideias. Oito anos de governo Lula, quatro deles sob intensa investida de seus adversários, neutralizaram as disputas políticas. A unidade passou a ser uma questão de sobrevivência e um quesito de governabilidade a partir do episódio do mensalão, em 2005. Houve uma dissidência, a que resultou na criação do P-SOL. Os grupos que se digladiaram nos momentos seguintes à revelação de um caixa dois do partido se recompuseram em seguida. O último Processo Eleitoral Direto (PED) do partido, embora disputado, esteve longe de ser um grande mobilizador de debate ideológico ou político. A escolha de Dilma Rousseff como candidata para suceder Lula à Presidência, pelo próprio Lula, não provocou discordâncias. Lula, afinal, era o grande bônus eleitoral de um partido já totalmente institucionalizado e livre dos debates intensos sobre a melhor via para o socialismo.
O crescimento parlamentar do PT, embora importante sob o ponto de vista da governabilidade e da convivência com partidos da base aliada de perfil tradicional, ocorreu sob um sistema político que é por definição personalista. Enquanto as disputas ideológicas se reduzem internamente, se acirram as disputas individuais por postos de comando. Na base, o PT vive um momento de grande oportunidade de renovação de quadros. Na cúpula, em especial do Parlamento, uma luta para manter os postos nas mãos de lideranças já consolidadas.
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva sempre teve bom trânsito entre todas as correntes partidárias. No Congresso, a habilidade do deputado João Paulo (SP) também mantinha sob controle as disputas por cargos.
Era mais do que prevista uma reacomodação interna no período pós-Lula. A presidente Dilma, alheia à máquina partidária, tende a colocar as coisas nos seus devidos termos: governo é governo, partido é partido; o partido é do governo mas deve acomodar as suas questões internas no ritmo da dinâmica partidária, e não demandar a mediação do governo para isso.
Esses paradoxos vão se revelar com clareza na hora do debate sobre reforma partidária. A avaliação de um integrante do partido é que se perdeu muito tempo nas disputas internas, quer por cargos no Congresso, quer por posições de governo. Enquanto isso, o vice-presidente Michel Temer, do PMDB, tomou a liderança do debate sobre reforma política, impondo à agenda a ideia do "distritão", que tem o poder de demolir eleitoralmente o PT. Ao mesmo tempo, a grande bandeira do partido, que é o voto em listas partidárias, perde interesse interno na medida em que tem o poder de acabar com os redutos pessoais de votos que foram se criando em torno de políticos petistas, e que produziram votos suficientes para elegê-los e mais alguns de seus colegas, pelo sistema de voto proporcional. O financiamento público de campanha, que é outra bandeira do partido, também interfere no equilíbrio de forças interno de hoje, já que tendem a adquirir muita influência aqueles políticos com maior capacidade de captar recursos financeiros para a sua campanha e para a dos candidatos majoritários do partido num sistema em que o financiamento de campanha é privado.
Se o PT não assumir o debate sobre reforma política, ele ficará restrito a uma bancada no Congresso que foi eleita sob as regras atuais e, como os parlamentares de outros partidos, terá problemas de sobrevivência com as mudanças. A direção das negociações ficará também a cargo das lideranças que se lançaram na disputa inicial por cargos no Poder Legislativo, fortalecendo a burocracia partidária deslocada para o parlamento. O debate ideológico, orgânico, ficará muito prejudicado com isso.
Repostado do Zcarlos
É tempo de discutir reforma política no Brasil.
ResponderExcluirEu, desde muito tempo ,formei minha opinião que o parlamentarismo é um sistema de governo mais consistente que o presidencialismo. Tirante os EUA e os países da América Latina, a maior parte dos países do mundo mais desenvolvido já segue o parlamentarismo.
Nesta hora de discussão da reforma, alguns dirão que o parlamentarismo já foi derrotado no Brasil e que não há mais volta. Porém, considerando que é importante essa discussão, para o aprimoramento do sistema político nacional, o parlamentarismo, estará na ordem do dia.
Olhando para o passado, tudo levava a crer que em 1988 seria implantado no Brasil o parlamentarismo, tanto assim que muitas cláusulas da constituição são tipicamente parlamentaristas. O PT que, como os demais partidos de esquerda, tinham posição pro-parlamentarismo, porém, por questão de estratégia de poder, naquela época, optou pelo presidencialismo, dado que Lula, apresentava todas as condições favoráveis para ser Presidente, o que aconteceu 12 anos depois.
Como o momento é outro, cabe a discussão, e por isso gostaria de fazer algumas reflexões, sobre o presidencialismo no Brasil comparado parlamentarismo lista fechada, mas considerando a observação de que, independente do sistema adotado, a participação ativa da sociedade organizada é fundamental em todo o processo de representação política.
1. Visão do governante:
No Presidencialismo, geralmente o personalismo é muito forte. Até parece que é uma representação do tirano, do príncipe, do salvador da pátria; O governante é o super-poderoso, é o chefe do governo e do estado;
No parlamentarismo, dá-se a escolha na negociação, conduzida pelos partidos hegemônicos (maioria). O parlamento é a base do governo e há o chefe do estado, que representa a nação e o chefe do governo que administra e governa;
2. Crises:
No presidencialismo, quando não há maioria, instala-se logo uma crise, e algumas vezes essa crise vai até o fim do mandato, com engessamento no processo de decisão, com perdas significativas para a sociedade;
No parlamentarismo, quando o governante perde a credibilidade ou o apoio da maioria, o gabinete cai, e novo dirigente é escolhido. Ou quando, não há maioria faz-se nova eleição. Portanto, no parlamentarismo o processo de governança se torna mais lógico, flui com tranqüilidade;
3. Máquina pública:
No Presidencialismo, geralmente a entrada do novo governante é acompanhada de uma multidão de assessores, que não pertencem à máquina, nem se habilitaram por concurso público. Também, representa a demissão de igual número de assessores do governo antigo, quando se dá a alternância de poder. Isto quase sempre provoca a descontinuidade no processo de gestão.
No Parlamentarismo, por ser um governo de maioria negociada, a tendência é de valorizar os componentes da máquina pública e os assessores necessários são de lá oriundos. Normalmente a máquina é aperfeiçoada e sua eficiência é sempre cobrada. Ela serve todos os governos, independente da coloração política.
4. Investimentos e Obras públicas:
No Presidencialismo, obras são marcadas como se pertencessem ao gestor e quando a obras estão inacabadas, em caso de alternância do poder, essas obras se tornam aos olhos do novo governante não prioritárias, e muitas vezes permanecem inconclusas;
No parlamentarismo, todos os investimentos são considerados como do governo, da sociedade, e não há problemas personalísticos que venham a prejudicar sua conclusão;
5. Partidos:
No Presidencialismo, como o voto é individual, é em pessoas, no candidato, o partido é pouco valorizado. No Brasil em razão disso temos aproximadamente 30 partidos, e a cada dia verifica-se que mais partidos estão se formando. Esses partidos são artificiais, pois os seus programas são próximos ou mesmo idênticos a outros;
No parlamentarismo, no geral, o voto é no partido, e portanto o partido é valorizado. Nesse caso a tendência é a quantidade menor de partidos, com mais afirmação ideológica e programática.
Continua .... AFP
É tempo de discutir reforma política no Brasil.
ResponderExcluir.........
6. Financiamento de campanha:
No Presidencialismo, como o voto é diretamente no candidato, este vai buscar seus financiadores e muitas vezes passa a ser o advogado do grupo que o financiou. Da mesma forma o partido, que se vê envolvido nessa teia.
No parlamentarismo, no geral, como o voto é no partido, o financiamento público é o caminho natural.
7. Efeito Tiririca:
No Presidencialismo, como o voto é diretamente no candidato, o partido busca pessoas nem sempre habilitadas para a função, mas que são puxadores de votos. Aí entram, artistas, futebolistas, radialistas, etc. e com isso o partido consegue eleger uma bancada maior, a custa dessa distorção.
No parlamentarismo, há uma maior seleção dos candidatos. Dificilmente, um partido vai colocar na lista dos candidatos um elemento “ficha suja” ou inabilitado. Ao contrário, busca sempre a excelência.
8. Corrupção Eleitoral:
No Presidencialismo, como o voto é diretamente no candidato, há uma maior chance de corrupção eleitoral. Nos rincões mais afastados, ou periferias das cidades é comum observar a compra de votos, feitas pelos candidatos, das mais variadas formas. Há um movimento das autoridades que visa coibir essa prática, mas essa atuação não consegue inibir nem a 5% do que ocorre. Há lugares em que supermercados estão envolvidos na distribuição de cestas básicas 2 ou 3 dias antes das eleições.
No parlamentarismo, ante a forma de votação que é no partido e não nas pessoas a corrupção será reduzida significativamente.
9. Consciência política e voto:
No Presidencialismo, com a existência de partidos para todos os gostos, o povo não Sabe o que pensa cada parlamentar, o que ele defende, e isto considerando um mesmo partido. A maior parte dos partidos poderia se fundir em um que tivesse as posições programáticas semelhantes, sem que isso significasse qualquer prejuízo para o eleitor ou para a sociedade. Essa situação causa problemas sérios e para a maior parte da sociedade, que passa a ter a idéia de que todos os partidos são iguais, não conseguindo estabelecer as diferenças.
No parlamentarismo, há a tendência de redução dos partidos para uma quantidade razoável, de acordo com o espectro programático ideológico. O cidadão aos poucos vai conhecendo as posições políticas ideológicas que defende cada partido e ai vai se posicionando de forma racional.
10. Fidelidade partidária:
No Presidencialismo, com tantos partidos, a fidelidade partidária não é algo natural, mesmo sendo estabelecida por lei, pois o foco é sempre no candidato, no político, não na estrutura partidária. Assim vamos ver sempre a mudança de partidos por parte dos políticos. Kassab, por exemplo deve sair do DEM e ir para o PSB.
No parlamentarismo, a mudança de partido é algo impensável, pois os políticos estão vinculados a idéias e a programas, que o partido representa.
AFP