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segunda-feira, 14 de julho de 2014

BRASIL: A URGENTE NECESSIDADE DE UMA "PARANOIA CONSTRUTIVA" NA DEFESA

Brasil, julho de 2014. A presidenta brasileira Dilma Rousseff com o presidente russo Vladimir Putin, depois da assinatura de novos e importantes tratados de interesse mútuo, em especial na  excruciante área da defesa. Os BRICS desejam forçar o surgimento de uma nova ordem mundial, mais justa e menos covarde...

Klemens von Metternich
Em um artigo publicado a alguns anos passados, o jornalista americano Andrés Oppenheimer, referindo-se à sensação de otimismo do Brasil em função de sua pujança econômica atual e da recente projeção internacional, disse que faltava aos brasileiros uma boa dosagem de “paranoia construtiva”. Ele dizia que um comportamento excessivamente otimista e complacente da nossa parte contrasta com a atitude de outros países emergentes, como a China e a Índia, que estão extremamente preocupados pelo fato de não estarem se expandindo tão rapidamente quanto outros países em matéria educação, ciência e setores da tecnologia.

Confesso compartilhar um pouco dessa preocupação, mas numa área não mencionada por Oppenheimer, a diplomacia. Apesar de termos tido, nos últimos dez anos, uma política externa absolutamente assertiva e ousada, eu acredito que o Itamaraty ainda se deixa levar por platitudes idealistas, como a crença na possibilidade de que uma ordem mundial, baseada em certo grau de justiça e na igualdade, possa estar em vias de ser estabelecida por organismo multilaterais como ONU e OMC. Ora, sabemos que a ordem internacional sempre foi tudo, menos igualitária. 

Desde a Paz de Westfália, de 1648, que pôs fim à Guerra dos Trinta Anos e inaugurou o moderno sistema internacional, estão em vigor o conceito de soberania dos Estados-nações e o princípio de raison d’etat. Em conseqüência, o “equilíbrio do poder” entre os Estados – que opõe interesses concretos, não ideais moralistas – é a única forma de balancear o poder imperialista e minimizar os conflitos entre as nações. Nem mesmo a globalização conseguiu alterar essa realidade. O que conta em política internacional, portanto, é a famosa Realpolitik, a postura realista baseada na diplomacia do príncipe austríaco Klemens von Metternich. Me lembro do reação do ex-chanceler Celso Amorim quando eu lhe fiz uma pergunta invocando esse conceito: “Realpolitik? No século XXI?”, espantou-se.


Eduard Leopold von Bismarck 
Mas para poder participar desse concerto das nações, é necessário algum tipo de poder dissuasório. E aqui me valho novamente de outro germânico com fama de reacionário: o chanceler prussiano Otto von Bismarck, que dizia que “a diplomacia sem armas é como a música sem os instrumentos”. Mesmo nestes tempos de hegemonia americana pós-guerra fria, apenas países com poder de dissuasão têm condições de defender seus interesses. 
 
 O Iraque foi invadido não porque tivesse armas de destruição de massa, mas justamente porque não as tinha. Quem duvida deve responder porque então um país muito mais agressivo como a Coréia do Norte não se sente militarmente ameaçado. Outro exemplo: nos anos 1980, a simples pressão diplomática de Washington fazia o Japão voltar atrás na decisão de desvalorizar sua moeda. Se a China hoje pode resistir a pressões semelhantes não é apenas porque os EUA estão economicamente mais débeis, mas principalmente porque Pequim está sentado sobre um arsenal de cerca de 200 ogivas nucleares.
Infográfico publicado pela revista Época

Ao manifestar a alguns anos atrás o apoio à pretensão da Índia de ter uma cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU, os EUA levaram em conta o poderio militar daquele país. De fato, os indianos têm uma das Forças Armadas mais poderosas dos países emergentes, contando inclusive com dissuasão nuclear. Os EUA vêem a Índia como um contraponto militar à China no Sul da Ásia. Já o Brasil, em vias de se tornar a 5ª economia mundial, tem uma diplomacia ativa, mas ainda está longe de ter uma força militar correspondente a esse protagonismo. Por isso ainda não é levado inteiramente a sério na cena internacional. Pode enviar soldados e até comandar Forças de Paz da ONU, como no Haiti, mas falar grosso em outras searas ainda é visto como "petulância" pelas grandes potências –postura, aliás, macaqueada aqui pela velha mídia e pelas “elites” – melhor dizendo, oligarquias mal-pensantes.

Thomas Hobbes 



Felizmente, o atual governo pôs em curso uma Política de Nacional de Defesa que redefiniu o papel das Forças Armadas, submeteu-as de fato ao poder civil e reverteu sua obsolescência via recriação da indústria bélica nacional por meio de transferência de tecnologia. A compra dos caças para a FAB – por mais enrolada que esteja – e, principalmente, a retomada do projeto do submarino nuclear foram passos decisivos nessa direção. Como assinala uma reportagem da revista Época assinada por Roberto Lopes e Maria Helena Passos, "se a Amazônia subiu ao topo das prioridades para as três forças, a proteção a riquezas emergentes no Atlântico tende a mudar radicalmente o perfil modorrento que a Defesa assumiu em décadas recentes. Daí a preocupação do almirante Moura Neto, também, com a vigilância das águas, cuja exploração econômica é reconhecida como de direito do Brasil. São 4,4 milhões de quilômetros quadrados, ou metade do território brasileiro". No que é chamado de "Amazônia Azul" pelos militares, continua a reportagem, figuram "as jazidas submarinas que, entre os litorais do Espírito Santo e de São Paulo, prometem transformar o Brasil em exportador de petróleo. E, também, as rotas dos que atacam as tripulações de barcos mercantes, dos contrabandistas de armas e dos traficantes de tóxicos, sob vigilância dramaticamente precária"


Si vis pacem para bellum (se queres a paz, prepara-te para a guerra), diziam os romanos. Por isso, em política externa, pelo menos, Thomas Hobbes tem mais coisas a nos dizer do que Immanuel Kant.

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