Minha citação é: “Não julgue para não ser julgado.”
Penso, especificamente, nas grandes empresas de jornalismo.
A Globo, por exemplo. Acaba de sair a notícia de que o Jornal
Nacional bateu na histórica marca de 20 pontos de Ibope – uma migalha
para quem já teve duas, três vezes isso.
Abaixo dos 20, o dilúvio.
Nos mesmos dias, soube-se que Babilônia, a nova novela, caiu vertiginosamente no espaço de uma semana.
E o BBB, como desgraças andam juntas, teve na semana passada a pior sexta de sua existência no Brasil.
A Globo bate sucessivos recordes negativos.
E então vamos a meu ponto: de quem é a culpa?
Se você julgar a Globo como seus comentaristas julgam o governo, a culpa é exclusivamente da própria Globo.
O diretor de telejornalismo Ali Kamel e o apresentador William Bonner
teriam que ser impiedosamente despedidos pelos números catastróficos da
audiência em sua gestão.
Na área de entretenimento, demissões sumárias teriam também que
ocorrer. Novelas que se esfolam para bater em 30 pontos são uma vergonha
para quem chegou a ter 100% dos televisores em últimos capítulos, como
Selva de Pedra.
Feitas as demissões, os irmãos Marinhos teriam que se
auto-substituir, como fez um jogador africano na Holanda depois de uma
vaia interminável de sua própria torcida.
Atribuir a outras coisas?
Veja como a Globo lida com isso quando Dilma coloca o Brasil dentro de um contexto de crise global.
Pergunte a Kamel, ou a Bonner, ou a Míriam Leitão, ou a Merval, ou a
quem for, qual a causa da derrocada das audiências da Globo – não apenas
na tevê, mas em mídias como jornal, revista e rádio.
Ninguém, com certeza, dirá que a responsabilidade é da própria Globo.
Ninguém admitirá falta de qualidade nos telejornais, ou nas novelas, ou
na falta de capacidade de inovar na administração e nos produtos.
A culpa está lá fora.
Da mesma forma, pergunte aos Civitas como a Abril, em tão pouco tempo, se tornou uma empresa morta em vida.
Gestão ruinosa? Conteúdos desvinculados do espírito do tempo? Más escolhas, como Fabio Barbosa?
Mais uma vez, o problema está lá fora.
Muito bem. Por que circunstâncias externas valem para as empresas, e só para elas?
Todos sabem as restrições editoriais que faço à Globo e à Abril, e trabalhei nelas tempo suficiente para saber que não
são administradas com excelência. (É o lado B de empresas que gozam de
reserva de mercado e outras mamatas. Como filhos mimados, têm
dificuldade em se virar fora de ambientes protegidos.)
Mas, com tudo isso, é inegável que o mundo externo responde e muito pela crise que Globo e Abril enfrentam.
A internet transformou seus produtos em velharias.
Mesmo que a Globo fizesse o melhor jornalismo do mundo, uma coisa do
padrão da BBC, e ainda que a Abril fosse administrada por Rupert
Murdoch, as coisas continuariam complicadas, dado o poder disruptivo da
internet.
A situação do Brasil é bem menos grave do que a da Abril e a da
Globo. Como a agência de avaliação de risco S&P avaliou ontem, o
Brasil continua a ser um bom porto para os investidores.
A economia, previu a S&P, deve ter um soluço em 2015, uma queda de 1% no PIB, para voltar a crescer 2% em 2016.
Se Dilma for hábil em poupar os mais desfavorecidos, não haverá grandes problemas sociais – ou mesmo pequenos.
De novo: as empresas de mídia enfrentam desafios imensamente maiores
que os do Brasil. A rigor, o cemitério as aguarda, a alguns quarteirões
de distância.
Tudo isso considerado, seria uma injustiça atribuir o drama delas apenas a elas mesmas.
É o que elas fazem ao examinar as dificuldades econômicas do momento. Tudo culpa do governo, segundo elas.
Isso mostra cinismo, falta de visão e – a palavra é dura, mas não há
outra mais precisa – um tipo de canalhice que faz você não lamentar o
estado terminal em que elas se encontram.
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