São
auspiciosas as manifestações da molecada contra os torturadores da
ditadura militar. Como lembrou o Rodrigo Vianna, a maioria dos
manifestantes do movimento Levante da Juventude não tinha nascido quando
a ditadura acabou, em 1985.
Os jovens brasileiros se inspiraram no
“escrache” dos argentinos para fazer o nosso “esculacho” contra os
torturadores, escrachando essa escória que se crê acima do bem e do mal.
É uma resposta da juventude aos generais de pijama que se
insubordinaram contra a Comissão da Verdade. Só senti falta de
manifestações contra outros facínoras notórios, como o coronel Carlos
Alberto Brilhante Ustra, ex-chefe do DOI-Codi em São Paulo, o capitão
Benone de Arruda Albernaz e o “Carlinhos Metralha” (delegado Carlos
Alberto Augusto) que, salvo engano, não foram alvo dos manifestantes.
Mas, não importa; é apenas o começo.
Reproduzo aqui
a entrevista do ex-preso político Ivan Seixas, presidente do Conselho
Especial de Defesa dos Diretos da Pessoa Humana (Condepe-SP), publicada
pelo blog Viomundo, do Luiz Carlos Azenha.
Do blog Viomundo:
Do blog Viomundo:
"'Capitão Lisboa’ deu a paulada final que matou meu pai”
por Conceição Lemes
Nesta
segunda-feira, jovens do Movimento Levante da Juventude fizeram
protestos em várias cidades brasileiras para escrachar ex-agentes da
ditadura militar. Em São Paulo e no Rio de Janeiro, o alvo foi David dos
Santos Araújo. Aqui e lá, as manifestações ocorreram, respectivamente,
na frente da sede e da filial da sua empresa de segurança privada
David
dos Santos Araújo, nas ações de repressão do DOI-Codi, utilizava o nome
de Capitão Lisboa. Ele está envolvido na tortura e morte de Joaquim
Alencar de Seixas. Ainda torturou Ivan e abusou sexualmente de Ieda,
filhos de Joaquim. Na ação civil pública movida pelo Ministério Público
Federal de São Paulo contra vários ex-torturadores, essas atrocidades
estão detalhadas.
Em
função das manifestações dessa segunda-feira do Levante da Juventude,
Ivan Seixas acabou “reencontrando” o seu torturador, um dos assassinos
de seu pai e abusador sexual de sua irmã. Resolvi revistá-lo então.
Tentei ouvir também David Araújo sobre tudo isso. Liguei para a sua empresa, a Dacala, deixei recado, mas não houve retorno.
Atualmente, Ivan Seixas preside o Condepe-SP (Conselho Especial de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana).
Viomundo — Como foi ver os jovens se manifestando na frente da empresa do policial que o torturou, matou o seu pai e abusou sexualmente da sua irmã?
Ivan Seixas – Uma emoção muito grande ver a juventude do meu país outra vez nas ruas por uma causa tão justa. Emocionei-me muito vendo o rosto de meu pai sendo empunhado por gente com a idade que eu tinha quando vi meu pai nas salas de tortura antes de ele ser assassinado pelo “Capitão Lisboa”. E, como é característica dos covardes, David dos Santos Araújo se escondeu, agora, dos jovens.
Viomundo — Você sabia do paradeiro dele e o que fazia?
Ivan Seixas – Sabia que era dono de uma empresa de segurança privada, mas nunca tive a preocupação de saber mais sobre ele ou sobre os outros do naipe dele. Sei que ele é o mantenedor do advogado do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, como noticiaram os jornais. Essa gente se lambuzou de dinheiro dos empresários que financiaram as torturas e com o sangue de brasileiros e brasileiras.
Viomundo – Sabe como ele matou seu pai?
Ivan Seixas – Outros torturadores me disseram depois que o “Capitão Lisboa” deu a paulada final que matou meu pai. Foi ele também que cometeu violência sexual contra minha irmã mais velha, que foi presa junto com minha mãe e minha outra irmã.
Viomundo – Como ele te torturou?
Ivan Seixas - Ele se revezava com os outros torturadores para torturar meu pai ao mesmo tempo que me tortu ravam. Ele me torturou muito, ficou em pé sobre meu peito quando eu estava pendurado no pau-de-arara e quebrou uma vértebra de minha coluna com uma paulada.
Viomundo — Depois que saiu da prisão, você já esteve cara a cara com ele?
Ivan Seixas – Em 1990, durante os interrogatórios da CPI das Ossadas de Perus, na Câmara de Vereadores de São Paulo, eu e a Amelinha Teles fomos colocados frente a frente com esse cara para reconhecer o tal “Capitão Lisboa”, visto que ele negava.
O torturador David dos Santos Araújo, o "capitão Lisboa" |
Quando
a Amelinha Teles disse que o reconhecia como sendo o torturador
“Capitão Lisboa”, sua resposta cínica: ”Eu não conheço essa mulher. Eu
nunca torturei mulher feia“.
Depois
foi minha vez. Ele ficou furioso quando eu disse que ele era o
torturador e me conhecia, pois eu tinha dado um murro em sua cara e o
jogdo longe. Ele ficou furioso e acabou por reconhecer que tinha
interrogado meu pai.
Viomundo — Agora que David Araújo/Capitão Lisboa está escrachado, qual a tua expectativa?
Ivan Seixas – Acho ótimo que os jovens saiam às ruas para fazer, mais uma vez, a boa política dos indignados. Não podemos aceitar o esquecimento como norma. Não podemos deixar que o massacre de “hoje” tome o lugar dos de “ontem”, e o esquecimento os apague. Isso não faz bem ao país.
Postado por Cláudio Camargo
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