O município de Breves, na Ilha do Marajó, sedia a partir desta quarta-feira (10), o segundo Seminário de Mobilização Social e Capacitação de Combate ao Escalpelamento.
A iniciativa é da Secretaria de Estado de Saúde Pública (Sespa), por meio da Coordenação de Educação em Saúde e Mobilização Social e da Comissão Estadual de Erradicação do Escalpelamento. O objetivo do evento é prevenir e combater esse tipo de acidente, ainda comum em áreas ribeirinhas e que vitima dezenas de mulheres e crianças. O arquipélago do Marajó é a região que registra o maior número de ocorrências de escalpelamento atualmente.
Somente este ano já foram quatro os acidentes deste tipo, ocorridos em Portel, Curralinho, Barcarena e Oriximiná. Em 2009 as ocorrências chegaram a 20, caindo para cinco em 2010. Apesar dessa redução, o Estado e demais entidades que atuam no combate ao problema trabalham intensivamente para eliminar de uma vez por toda essa prática, ainda comum entre alguns condutores de barcos, de navegar sem a proteção do eixo dos motores. Nos últimos 29 anos, a perda parcial ou total do couro cabeludo provocada pela sucção do eixo dos motores - ocorridas por conta da ausência de proteção desse equipamento - já vitimou 250 pessoas.
A coordenadora de Educação em Saúde e Mobilização Social da Sespa, Socorro Silva, explica que a região do Marajó tem sido alvo de ações permanentes voltadas para esse fim. "O governo do Estado tem se esforçado para firmar parcerias com sindicatos de pescadores, barqueiros, pastorais, conselhos tutelares e rádios comunitárias para sensibilizá-los sobre o perigo do escalpelamento", esclarece.
O escalpelamento é conseqüência direta da falta de segurança nas embarcações de menor porte. O motor e o eixo descobertos oferecem risco a quem está próximo, principalmente mulheres e crianças. Quando o motor é ligado, o eixo gira em alta velocidade. Como é comum durante as viagens pelos rios que esses barcos fiquem alagados, alguns passageiros acabam tendo que ajudar a tirar o excesso de água. É nesse momento, ao se aproximarem do equipamento, que muitas meninas têm os cabelos sugados e o couro cabeludo arrancado.
Os participantes do encontro debaterão o Plano Estadual de Erradicação do Escalpelamento. A proposta consiste, ainda, em rearticular os comitês municipais em favor de novas parcerias com a sociedade civil. Profissionais da Santa Casa de Misericórdia do Pará ministrarão, pela primeira vez na região, um minicurso de atendimento às vítimas de escalpelamento.
Serviço: O seminário acontecerá no auditório do Centro de Desenvolvimento e Educação Profissional de Breves (CEDEP).
(Agência Pará)
Escalpelamento é um dos maiores riscos do barco a motor nos rios
Acidentes acontecem, porque muitas embarcações não protegem o eixo do motor. Uma proteção simples pode evitar tragédias que marcam para sempre a vida de meninas e mulheres ribeirinhas.
Um crime contra as mulheres do Amazônia
EIXO DO MOTOR SEM PROTEÇÃO
EIXO DO MOTOR COM A PROTEÇÃO
VÍTIMAS
O perigo de um acidente terrível ronda as mulheres da Amazônia: o escalpelamento. A palavra vem de escalpo, o couro cabeludo arrancado do crânio, que era um troféu de guerra para os índios americanos. Na Amazônia, o que provoca o escalpelamento é um acidente nos barcos. Centenas de mulheres e crianças já foram vítimas. Um drama que a maior parte do Brasil nem sabe que existe.
A lei das águas. É a lei da vida na maior bacia hidrográfica do planeta. Tudo, nesta região da Amazônia, é feito sob o comando de um gigante que rasga o verde da floresta. As pequenas embarcações estão presentes no dia-a-dia do ribeirinho. "Quando não tem barco, embarcação de motor, a gente vai de barquinho, casquinho, embarcação a remo", diz a estudante Luciane Moraes dos Santos.
O tempo parece que custa a passar nessa parte do Brasil. Mas, muitas vezes a tranqüilidade das águas barrentas termina, onde começa esse barulho.No final da década de 60, o progresso trouxe para os ribeirinhos da Amazônia um motor nas pequenas embarcações, mas além de tornar as viagens rápidas, a novidade trouxe também para dentro dos rios um capítulo dramático na história da Amazônia conhecido como escalpelamento.
O motor do progresso vem mutilando o corpo e alma dos ribeirinhos. Estas meninas vão carregar um drama para o resto da vida. Elas são vítimas de escalpelamento. Tiveram o couro cabeludo arrancado do crânio e nunca mais terão os cabelos de volta.
Vítima 1 - "Meu cabelo era tudo pra mim"
Vítima 2 - "Já foram 16 cirurgias e continuo em tratamento"
Vítima 3 - "Tem vezes que eu choro, às vezes eu tô no espelho é horrível a situação"
O escalpelamento acontece dentro dessas embarcações sem segurança nenhuma. O motor e o eixo são descobertos pondo em risco quem se aproxima. Veja agora como acontece o acidente: Quando o motor é ligado, o eixo gira em alta velocidade. Durante a viagem, é comum o barco ficar alagado e os passageiros têm que tirar o excesso d'água. Ao se aproximar do eixo, centenas de meninas e crianças da Amazônia foram sugadas e tiveram o couro cabeludo arrancado.
"Eu me abaixei e o motor pegou, o eixo do motor pegou o meu cabelo eu desmaiei imediatamente", conta Tássia Souza, uma das vítimas. "Eu fui me abaixar pra pegar a vasilha pra tirar água", diz Delziane Pantoja, outra vítima. A repórter pergunta: Com você foi mais grave porque o cabelo estava preso no momento do acidente? "Foi escalpe total, porque aí pega tudo, quando tá solto não, tem a possibilidade de pegar só a metade", explica a vítima.
Esta garota, de apenas sete anos, perdeu o couro cabeludo e teve uma orelha decepada. Joice se aproximou do motor do barco do pai dela e foi arrastada pra baixo do eixo. Ela conta que tinha os cabelos compridos que nem a boneca. E, por ironia do destino, foram os cuidados com o cabelo que causaram o acidente. "Eu fui pegar uma escova". Pele morena. Cabelos negros, compridos. É a aparência da mulher ribeirinha. A mistura que vem da miscigenação entre índios e europeus. A ribeirinha é também o alvo mais comum dessa tragédia amazônica, 80% das vítimas do escalpelamento são do sexo feminino. Na maioria dos acidentes o escalpelamento é total, quer dizer, todo couro cabeludo é arrancado e os cabelos não voltam a crescer.
O tratamento é doloroso e dura mais de dez anos.
A lei das águas. É a lei da vida na maior bacia hidrográfica do planeta. Tudo, nesta região da Amazônia, é feito sob o comando de um gigante que rasga o verde da floresta. As pequenas embarcações estão presentes no dia-a-dia do ribeirinho. "Quando não tem barco, embarcação de motor, a gente vai de barquinho, casquinho, embarcação a remo", diz a estudante Luciane Moraes dos Santos.
O tempo parece que custa a passar nessa parte do Brasil. Mas, muitas vezes a tranqüilidade das águas barrentas termina, onde começa esse barulho.No final da década de 60, o progresso trouxe para os ribeirinhos da Amazônia um motor nas pequenas embarcações, mas além de tornar as viagens rápidas, a novidade trouxe também para dentro dos rios um capítulo dramático na história da Amazônia conhecido como escalpelamento.
O motor do progresso vem mutilando o corpo e alma dos ribeirinhos. Estas meninas vão carregar um drama para o resto da vida. Elas são vítimas de escalpelamento. Tiveram o couro cabeludo arrancado do crânio e nunca mais terão os cabelos de volta.
Vítima 1 - "Meu cabelo era tudo pra mim"
Vítima 2 - "Já foram 16 cirurgias e continuo em tratamento"
Vítima 3 - "Tem vezes que eu choro, às vezes eu tô no espelho é horrível a situação"
O escalpelamento acontece dentro dessas embarcações sem segurança nenhuma. O motor e o eixo são descobertos pondo em risco quem se aproxima. Veja agora como acontece o acidente: Quando o motor é ligado, o eixo gira em alta velocidade. Durante a viagem, é comum o barco ficar alagado e os passageiros têm que tirar o excesso d'água. Ao se aproximar do eixo, centenas de meninas e crianças da Amazônia foram sugadas e tiveram o couro cabeludo arrancado.
"Eu me abaixei e o motor pegou, o eixo do motor pegou o meu cabelo eu desmaiei imediatamente", conta Tássia Souza, uma das vítimas. "Eu fui me abaixar pra pegar a vasilha pra tirar água", diz Delziane Pantoja, outra vítima. A repórter pergunta: Com você foi mais grave porque o cabelo estava preso no momento do acidente? "Foi escalpe total, porque aí pega tudo, quando tá solto não, tem a possibilidade de pegar só a metade", explica a vítima.
Esta garota, de apenas sete anos, perdeu o couro cabeludo e teve uma orelha decepada. Joice se aproximou do motor do barco do pai dela e foi arrastada pra baixo do eixo. Ela conta que tinha os cabelos compridos que nem a boneca. E, por ironia do destino, foram os cuidados com o cabelo que causaram o acidente. "Eu fui pegar uma escova". Pele morena. Cabelos negros, compridos. É a aparência da mulher ribeirinha. A mistura que vem da miscigenação entre índios e europeus. A ribeirinha é também o alvo mais comum dessa tragédia amazônica, 80% das vítimas do escalpelamento são do sexo feminino. Na maioria dos acidentes o escalpelamento é total, quer dizer, todo couro cabeludo é arrancado e os cabelos não voltam a crescer.
O tratamento é doloroso e dura mais de dez anos.
A primeira etapa é repor a pele do crânio com enxertos retirados das pernas. "Eu espero que eu fique boa pra poder voltar logo pra minha casa, pra estudar". Quando o acidente não é tão grave, há uma possibilidade de se recuperar o couro cabeludo. Os médicos recorrem ao expansor, uma espécie de bolsa, que é colocada por baixo da pele do paciente. Toda semana, a prótese recebe soro fisiológico e vai enchendo. O objetivo é esticar a pele e aumentar o couro cabeludo. "É como se eu causasse o que? Uma gravidez nesse couro cabeludo, e essa gravidez causada no couro cabeludo, mais tarde quando eu tirar, esse aparelho vai me sobrar bastante tecido", explica o cirurgião plástico Victor Aifa.
O escalpelamento no norte do país é mais comum do que se imagina. Santarém, Altamira e Barcarena são os municípios que registram mais acidentes deste tipo. Nos últimos 20 anos, quase 200 vítimas foram atendidas na Santa Casa de Belém, 5% morreram. A cada mês, dois acidentes em média são registrados no Pará.
Da cidade de Belém seguimos para o furo do maracujá, perto da capital. Logo na primeira abordagem já verificamos a falta de segurança. O motor e o eixo deste barco estão sem proteção. Mas o dono diz que não tem perigo viajar assim. "Entrou criança aqui é tudo pra frente, não deixa passar aqui pra trás"
As embarcações sem proteção tiveram as habilitações suspensas. Mas a capitania dos portos admite a dificuldade para fiscalizar os barcos por causa da geografia da região. Outro problema é a falta de registro dos casos de escalpelamento. "As embarcações são de caráter familiar e os proprietários das embarcações, portanto, os responsáveis são familiares das vítimas isso gera uma séria dificuldade para que o acidente chegue até a capitania", diz o Sargento da Capitania dos Portos, Daniel de Oliveira Lima.
Durante a viagem pelos rios do Pará nós encontramos este metalúrgico que faz a cobertura dos eixos com aço. "Proteção do volante e do eixo, kit completo".
A cobertura custa R$ 90. Mas os ribeirinhos, que geralmente montam os próprios barcos, não têm dinheiro para comprar o kit. Uma ONG, fundada por este médico, quer levar o serviço de forma gratuita aos moradores das regiões mais pobres e já fez parcerias com o governo e a iniciativa privada.
O cirurgião plástico Claudio Brito criou a ONG Sarapó depois de conhecer de perto o drama das escalpeladas. Desde 2001, ele presta assistência às vítimas. "O sofrimento dessas meninas não se resume ao acidente. Depois vêm inúmeros curativos, cirurgias e não é só isso, um momento mais difícil é esse, a hora de encarar o espelho, sempre cruel e implacável ao revelar as mutilações do escalpelamento", diz.
"Não consegui, não gostava, dava vontade de quebrar o espelho, ficou muito feia, mas agora já passou". "Eu quebrava o espelho, chorava, passava, eu sofria muito, fiquei com depressão", dizem as vítimas.
Além da dor e do sofrimento estas meninas têm que enfrentar outro drama: o preconceito. "Eu sabia que as pessoas iam olhar pra ti assim nossa olha só aquela garota não tem cabelo, não tem orelha, isso foi difícil pra mim, pelo comentário das pessoas". "Os pivetes puxaram o boné da minha cabeça, aí todo mundo achando graça, foi muito triste, muito triste mesmo". "Muita gente vinha em casa, queria ver, dizia que tava feio, sofri demais, mas me recuperei disso", contam as meninas.
Depois de tanto sofrimento, essas meninas pensam agora no futuro. E elas têm muitos planos. Joice, que traz no rosto e no pescoço as marcas do escalpelamento, está na segunda série e passa as tardes brincando com os amiguinhos. Ela vai ser dama de honra no casamento de uma tia e diz que precisa ensaiar para a cerimônia. Enquanto ensaia Joice sonha com um presente. "Eu quero uma peruca".
O escalpelamento no norte do país é mais comum do que se imagina. Santarém, Altamira e Barcarena são os municípios que registram mais acidentes deste tipo. Nos últimos 20 anos, quase 200 vítimas foram atendidas na Santa Casa de Belém, 5% morreram. A cada mês, dois acidentes em média são registrados no Pará.
Da cidade de Belém seguimos para o furo do maracujá, perto da capital. Logo na primeira abordagem já verificamos a falta de segurança. O motor e o eixo deste barco estão sem proteção. Mas o dono diz que não tem perigo viajar assim. "Entrou criança aqui é tudo pra frente, não deixa passar aqui pra trás"
As embarcações sem proteção tiveram as habilitações suspensas. Mas a capitania dos portos admite a dificuldade para fiscalizar os barcos por causa da geografia da região. Outro problema é a falta de registro dos casos de escalpelamento. "As embarcações são de caráter familiar e os proprietários das embarcações, portanto, os responsáveis são familiares das vítimas isso gera uma séria dificuldade para que o acidente chegue até a capitania", diz o Sargento da Capitania dos Portos, Daniel de Oliveira Lima.
Durante a viagem pelos rios do Pará nós encontramos este metalúrgico que faz a cobertura dos eixos com aço. "Proteção do volante e do eixo, kit completo".
A cobertura custa R$ 90. Mas os ribeirinhos, que geralmente montam os próprios barcos, não têm dinheiro para comprar o kit. Uma ONG, fundada por este médico, quer levar o serviço de forma gratuita aos moradores das regiões mais pobres e já fez parcerias com o governo e a iniciativa privada.
O cirurgião plástico Claudio Brito criou a ONG Sarapó depois de conhecer de perto o drama das escalpeladas. Desde 2001, ele presta assistência às vítimas. "O sofrimento dessas meninas não se resume ao acidente. Depois vêm inúmeros curativos, cirurgias e não é só isso, um momento mais difícil é esse, a hora de encarar o espelho, sempre cruel e implacável ao revelar as mutilações do escalpelamento", diz.
"Não consegui, não gostava, dava vontade de quebrar o espelho, ficou muito feia, mas agora já passou". "Eu quebrava o espelho, chorava, passava, eu sofria muito, fiquei com depressão", dizem as vítimas.
Além da dor e do sofrimento estas meninas têm que enfrentar outro drama: o preconceito. "Eu sabia que as pessoas iam olhar pra ti assim nossa olha só aquela garota não tem cabelo, não tem orelha, isso foi difícil pra mim, pelo comentário das pessoas". "Os pivetes puxaram o boné da minha cabeça, aí todo mundo achando graça, foi muito triste, muito triste mesmo". "Muita gente vinha em casa, queria ver, dizia que tava feio, sofri demais, mas me recuperei disso", contam as meninas.
Depois de tanto sofrimento, essas meninas pensam agora no futuro. E elas têm muitos planos. Joice, que traz no rosto e no pescoço as marcas do escalpelamento, está na segunda série e passa as tardes brincando com os amiguinhos. Ela vai ser dama de honra no casamento de uma tia e diz que precisa ensaiar para a cerimônia. Enquanto ensaia Joice sonha com um presente. "Eu quero uma peruca".
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