Mark Dowd, ex-dominicano, hoje ativista e jornalista
A visão de um ex-frei dominicano, abertamente gay, sobre a crise no Vaticano que levou à renúncia do papa.
Um ex-frei dominicano deu uma entrevista à veterana jornalista
Christane Amanpour, da CNN. Disse ele que a homossexualidade é uma bomba
relógio na igreja. Seu nome é Mark Dowd.
Dowd é gay assumido. Expulso de sua congregação, trabalha como
jornalista free lancer e documentarista. Tem uma coluna no jornal inglês
The Guardian. Segundo ele, os homossexuais são “amplamente
representados na igreja. Cerca de metade das pessoas que entram em
seminários são gays”.
Dowd falou depois que, na segunda-feira, o Vaticano anunciou a
renúncia do arcebispo da Escócia, Keith O’Obrien, na esteira de
denúncias de que ele havia tido relacionamentos impróprios com outros
colegas. Jornais italianos vem dando matérias sobre uma rede de
chantagens envolvendo uma certa “cabala gay”. Ela é um dos itens citados
nos Vati-leaks, os documentos que mostram corrupção, disputas entre
cardeais, transações financeiras mal explicadas e o diabo. Seria uma das
causas de Bento XVI ter saído. Em seu último pronunciamento na Praça
São Pedro, Ratzinger declarou que enfrentou “águas agitadas e vento
contrário”, mas que tem fé que Deus não vai deixar “a igreja afundar”.
É claro que a história não contada da aposentadoria do papa envolve
muito mais do que uma grande conspiração homossexual. Mas, numa
instituição que vive do segredo e da culpa, segundo Dowd, você tem as
condições ideais para o crescimento da extorsão e da manipulação.
A igreja tem uma expectativa absurda dos padres no que tange ao sexo.
O celibato foi sacramentado no Quarto Concílio de Latrão, de 1215 e no
Concílio de Trento, entre 1545 e 1563 (antes disso, conta-se que no
Concílio de Constança, em 1418, 700 prostitutas atenderam os clérigos
que debatiam o assunto). Alguns conseguem lidar com ele. Um bom pedaço –
como se tem visto – não consegue.
Dowd é um militante da causa. Fez um documentário, Queer and Catholic,
em que entrevistou dois sacerdotes que se apaixonaram e tentaram levar
adiante essa questão com seus superiores. Foram rechaçados sumariamente.
Um deles revelou que seus chefes mais homofóbicos eram os mesmos que
procuravam parceiros no Monte Capitolino, famoso parque em Roma. (O
cardeal O’Brien, antes de dar o fora, afirmou que o casamento entre
pessoas do mesmo sexo era “uma tentativa de agradar um pequeno grupo de
ativistas em detrimento de toda a sociedade. Eliminaria a ideia básica
de que toda criança precisa de um pai e de uma mãe”.)
A homofobia não é exclusividade do Vaticano (vide, para ficar num
exemplo recente, o nosso querido pastor Malafaia). Agora, a pressão para
que seus líderes finjam ignorar sua sexualidade é injusta, sem sentido –
e tem consequências. Como a igreja católica é medieval e pequenas e
eventuais mudanças ocorrem a cada 500 anos, é altamente improvável que
algo vá acontecer. Enquanto isso, os seminários continuarão cheios. Como
diria Libaninho, o beato de O Crime do Padre Amaro, de Eça de Queiroz, com as mãos na cabeça: “Nossa Senhora das Dores, que até pode cair um raio!”.
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