O que as agruras de um “herói” americano dizem sobre os Estados Unidos.
A Esquire
deste mês publicou um belo perfil do soldado que diz ter assassinado
Osama Bin Laden no Paquistão. A matéria é assinada por Phil Bronstein,
do Centro de Reportagem Investigativa (é um suspiro de bom jornalismo
numa revista que foi, nos anos 60, sob o editor Harold Hayes, talvez a
melhor do mundo. Já faz algum tempo que ela se tornou irrelevante, com
suas fórmulas batidas e o espaço cada vez maior para a estupidez dos
editoriais de moda).
Para manter seu anonimato, Bronstein chama o assassino de “Shooter”
(atirador). Ele está saindo do time dos SEALs, a elite militar
americana, depois de 16 anos. Há relatos incríveis na matéria, do tipo
que os roteiristas de Zero Dark Thirty dariam o fígado para obter. No
mais emocionante, o Shooter conta que derrubou Bin Laden com dois tiros
na testa quando ele estava em seu quarto no terceiro andar de um prédio
em Abbotabad.
A história é diferente da que foi contada por Mark Owen no best-seller No Easy Way. Owen, pseudônimo de Matt Bissonette, também esteve na operação.
Mas o que chama mesmo a atenção não são as aventuras do marine, mas
a, digamos, inutilidade de sua façanha. Não apenas porque o mundo não
está mais seguro, mas porque o “herói” que o matou o facínora está
ferrado.
Para começar, ele está na lista negra dos jihadistas.
Sua família estará sempre em risco.
Ele perdeu parte da visão e tem uma lesão permanente no pescoço, além de artrite, tendinite, dores no corpo e hérnia de disco.
Por ter saído antes de completar 20 anos de serviço, não tem direito à
pensão. Não tem dinheiro para pagar um dos caríssimos convênios médicos
americanos.
Tentou uma vaga de consultor de games de guerra, mas os fabricantes
não dão conta do número de ex-militares que os procuram. Um videogame
chamado Medal of Honor Warfighter está utilizando os serviços de trinta soldados, alguns na ativa e outros recentemente aposentados.
Ele não ganhará um centavo dos 25 milhões de dólares que o governo
prometeu pagar pela cabeça de Bin Laden. Ninguém vai ganhar, aliás.
Segundo Washington, a tecnologia foi mais importante que as pessoas (sem
contar a tortura, claro).
Ele vive com medo. Seus filhos foram treinados para se esconder na
banheira ao primeiro sinal de problema. Sua mulher aprendeu a atirar.
Uma faca fica no closet em caso de necessidade.
Ele está legalmente separado, embora ainda more com a mulher. Ela
está mudando de nome, assim como as crianças. “Estamos apagando o nome
dele das nossas vidas, mas por razões de segurança”, diz ela.
O “Shooter” não é lá muito inteligente. Ao desertar antes do tempo,
não haveria como obter os benefícios. Ou ele achou que merecia um
tratamento especial? Ele acredita que foi posto na Terra para realizar
uma missão – que foi cumprida. Se alguém se deu bem com a morte de Bin
Laden foi Obama. Todo o discurso do diretor da CIA, Leon Panetta, de que
Bin Laden era “o terrorista mais infame de nosso tempo”, era, afinal de
contas, grito de torcida. OBL era o inimigo da vez. Agora que ele foi
eliminado, podemos passar para o próximo vilão.
O homem que matou OBL não pretende organizar protestos em frente à
Casa Branca ou lançar um livro contando seus feitos. A ver. Mas ninguém
pode se surpreender totalmente se, dia destes, ele entrar num Wall Mart e
disparar seu AR15 sobre os pobres coitados que ele achava que tinha
salvado.
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