Conceição Tavares quer participar do debate. Será que Dilma ouvirá apenas o mercado?
Viomundo da Redação
Primeiro, logo depois do primeiro turno, tratou-se de desqualificar
os votos de Dilma Rousseff. Nisso, a mídia contou com o inestimável
apoio do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que definiu o PT como o
partido dos grotões.
Repetiu-se a estratégia depois do segundo turno, com o mesmo
objetivo: a tese do “país dividido”, azul e vermelho, servia à oposição,
ainda que baseada em estatísticas enganosas.
O retorno “triunfal” de Aécio Neves ao Senado foi combinado com duas novas palavras no léxico dos colunistas: bolivarianismo e estelionato.
A derrubada do projeto da Política Nacional de Participação Social na
Câmara teria sido reação ao primeiro, quando foi muito mais que isso:
deveu-se à estratégia de emparedamento praticada pelo PMDB, que sempre
antecede a barganha por cargos no Executivo. Neste caso, nenhuma
novidade no front.
A tese do “estelionato eleitoral” não se refere ao fato de que
Geraldo Alckmin sempre disse que estava tudo bem na crise hídrica
paulista — e agora, pós-eleição, a Sabesp anuncia planos para reutilizar
água do esgoto, enquanto o governador pede ajuda em Brasília.
Ela — tese do estelionato — cabe apenas no aumento da gasolina. Coisa de Dilma.
Desqualificar para enquadrar, é o que está em andamento.
Objetivo: forçar a adoção da plataforma eleitoral dos derrotados.
Por que?
Para conquistar a austeridade que garanta o pagamento dos juros. Para
garantir que o peso da crise não ameace os banqueiros, mas recaia sobre
os assalariados.
É incrível como a matriz se repete. Teríamos um apagão elétrico. A Copa do Mundo seria um fracasso retumbante.
O segundo mandato de Dilma, antes mesmo de começar, está inapelavelmente fadado a sucumbir. Basta ler os jornais para constatar.
Tem até gente fugindo do Brasil para evitar o naufrágio de uma economia com pleno emprego!
A pergunta que cabe fazer, agora, é a que Ricardo Melo fez hoje. Dilma vai mesmo se render às manchetes?
Acompanhem:
Dilma e seus dilemas
Manchete de alguns dos principais veículos de comunicação do mundo, o
esquema de sabotagem tributária praticado por bancos e multinacionais
dá ideia dos desafios colocados para governos como o de Dilma Rousseff.
A reportagem é produto de uma ação colaborativa de jornalistas de diversos países.
No Brasil, Fernando Rodrigues, do UOL, orientou o trabalho
investigativo e a publicação da papelada. O resultado mostra números
estarrecedores, com a licença do adjetivo tão caro à presidente.
Para falar apenas daqui, em 2008 e 2009 os bancos Itaú e Bradesco
“economizaram” R$ 200 milhões em impostos graças a um esquema montado
num paraíso fiscal europeu “Luxemburgo”. Formalmente, a negociata atende
pela rubrica de elisão fiscal, eufemismo usado por bilionários para
explorar brechas da lei com o objetivo de fugir de tributos. A sutileza
obviamente não está ao alcance da maioria trabalhadora e assalariada:
esta é mordida pelo Leão diretamente no holerite.
A essência da jogatina é declarar lucros muito menores do que os
obtidos. Uma imoralidade completa. Para “lavar” a mentira, os grupos
entram em acordo com empresas de auditoria para desbravar os caminhos da
“elisão fiscal”.
No momento seguinte, as mesmas firmas de controle endossam os
balanços dos clientes. A promiscuidade lembra a tabelinha entre agências
de risco, auditorias e a banca internacional que desembocou na crise de
2008. Vários nomes, aliás, aparecem nos dois momentos. Uma diferença:
enquanto em países como os Estados Unidos e Grã-Bretanha a banca tem
sido obrigada a devolver ao menos parte dos prejuízos, por aqui nada
acontece.
Os sonegadores, claro, juram respeitar a Justiça. É o cinismo vendido
como verdade. Citam em sua defesa uma lei escrita a quatro mãos com o
paraíso fiscal justamente para atender a interesses do tubaronato
multinacional. “Trata-se de mais um planejamento tributário
internacional abusivo, com o único propósito de gerar redução dos
impostos”, resumiu o subsecretário de Fiscalização da Receita, Iágaro
Martins (Folha de S.Paulo, 06/11).
Além de mostrar o tamanho do problema, semelhante avaliação de uma
autoridade oficial torna ainda mais incômodo o silêncio dos altos
escalões do governo Dilma diante destes descalabros. Pior.
Em vez disto, a presidente reeleita e seus auxiliares vêm entoando
músicas para agradar o tal mercado. Fala-se em cortar gastos, em ampliar
a fiscalização sobre benefícios da Previdência e reduzir a ação de
bancos públicos.
Nada se ouve nos altos escalões a respeito de demandas sociais e, por
exemplo, da cobrança de multas bilionárias como a devida pelo Itaú por
conta da fusão com o Unibanco. Já os bancos continuam batendo recordes
de lucratividade enquanto a economia do país patina.
O Planalto pode tentar fazer os malabarismos habituais para adiar
medidas a favor do povo que o elegeu. Invocar a governabilidade, a
necessidade de acordos com a base aliada etc. são platitudes habituais.
Tampouco imagina-se que a montagem de um governo seja simples como a
troca de diretoria de clube de futebol.
Mas os sinais são importantes, sobretudo na política. E é impossível
manter compromissos com a maioria mais pobre sem que os ricos aceitem
abrir mão de ganhos imorais. A conta não fecha. Na sua estreia, o maior
risco da nova administração não é o de desagradar a oposição. É o de
perder o pé da situação.
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