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quarta-feira, 12 de novembro de 2014

O PT se move contra o oportunísmo pragmático de Eduardo Cunha

Dilma e Kassab
O PSD de Kassab e a frente de esquerda proposta por Cid Gomes conseguirão deter o ímpeto do PMDB?


Reconduzido à liderança do PMDB da Câmara, o deputado federal fluminense Eduardo Cunha tornou-se uma das principais ameaças à governabilidade de Dilma Rousseff em seu segundo mandato. Ainda durante o período eleitoral, o pseudoaliado demonstrou disposição de apoiar um eventual governo tucano, caso Aécio Neves saísse vitorioso nas urnas. 
O lacerdista Eduardo Cunha gosta de fazer o papel de jagunço-chefe da velha mídia. É o congressista mais tucano entre os pmdebistas (Mviva).
Líder de um movimento que impôs duras derrotas ao Planalto nos últimos anos, entre elas a recente derrubada do decreto presidencial que regulamentava a atuação dos conselhos populares, há tempos Cunha amarra uma aliança com setores insatisfeitos da base para lastrear sua candidatura à presidência da Casa Legislativa. Na onda do elevado grau de polarização política da última disputa presidencial, aposta no discurso antipetista para conquistar o apoio dos oposicionistas, que ainda avaliam a viabilidade de apresentar um candidato próprio na disputa.
Diante da ameaça, derrotar Cunha é a prioridade absoluta da bancada do PT, mas não há consenso de como fazer gorar o ovo da serpente. Como o PMDB ainda não oficializou a candidatura do deputado fluminense, alguns parlamentares petistas acreditam que a intervenção do vice-presidente Michel Temer possa surtir efeito, assim como a pressão de governadores peemedebistas que precisam manter boas relações com a União. Começa, porém, a ganhar força uma ideia alternativa para reduzir a dependência do PMDB a partir de 2015.
“O Planalto precisa ter clareza do tamanho e do perfil da bancada que deseja. Talvez esteja na hora de ter uma base mais enxuta, porém mais sólida e confiável”, afirma o petista Marco Maia, que comandou a Câmara em 2011 e 2012. A ideia é estreitar laços com os outros partidos da coligação, entre eles PP, PR, PSD, PROS e PRB, além de cortejar os nanicos e atrair de volta alguns parlamentares do PTB e do próprio PMDB, emenda o deputado cearense José Guimarães, ex-líder do PT na Casa. “O atual modelo de governabilidade faliu. É melhor reduzir o tamanho da base e estabelecer uma carta de compromissos com os aliados.” Na quarta 5, Dilma reuniu-se com Gilberto Kassab e outras lideranças do PSD. A legenda, criada em 2011, sonha em dividir com o PMDB o espectro de centro e se transformar em uma força essencial à governabilidade de qualquer presidente.
Uma proposta apresentada pelo governador do Ceará, Cid Gomes, vai na mesma linha das elucubrações petistas. Filiado ao PROS e ministeriável, Gomes sugeriu a criação de uma frente de esquerda no Congresso para assegurar a governabilidade. Além de seu partido, integrantes de legendas como o PDT, o PCdoB, o PSB e até do PSOL poderiam integrar o bloco. “O ideal seria compor inicialmente uma frente que possa evoluir na sequência para um novo partido, que resulte na fusão de algumas legendas”, afirmou o governador após um encontro com a presidenta na terça-feira 4.
O novo grupo, imagina, poderia reunir ao menos 10% dos parlamentares do Congresso, tamanho semelhante àquele das atuais bancadas do PT, PMDB e PSDB. Seria um importante contraponto ao avanço dos conservadores, que conseguiram ampliar as frentes ruralista, religiosa e militar, à custa de um declínio dos representantes de movimentos sociais, de direitos humanos e sindical. Reeleito, o deputado Jean Wyllys, do PSOL, vê com simpatia a proposta. “Não há outra saída, senão articularmos uma grande frente para apoiar as políticas progressistas do governo e fazer uma contraposição a essa onda reacionária, que por vezes resvala no discurso fascista, como esse delírio de pedir o impeachment de uma presidenta que acabou de ser reeleita.”
A proposta de uma base mais enxuta esbarra em dificuldades práticas. Com maioria simples, é possível aprovar projetos de lei e medidas provisórias. Mas para emplacar emendas à Constituição seriam necessários ao menos 308 votos favoráveis, número que parece inviável sem o respaldo dos peemedebistas. “É preciso deixar claro que não descartamos o PMDB de forma alguma. A postura de Eduardo Cunha é que suscita tantas dúvidas e gera desconfiança”, afirma Vicentinho, líder do PT na Câmara. “Insisto sempre neste ponto: o PMDB não é um partido da base aliada, é governo. Somente após aprofundar o diálogo com o vice Michel Temer e com os novos deputados e governadores eleitos, teremos um cenário mais claro. Cunha pode até ter certo controle sobre a bancada de deputados, mas imagino que não tenha a totalidade.”
Após reunir parlamentares e governadores eleitos no Palácio do Jaburu, Temer evitou endossar a candidatura de Cunha à presidência da Câmara. “É um assunto do Congresso, e não ainda do partido”, despistou. Durante o encontro, lideranças peemedebistas criticaram a articulação “independente” do deputado fluminense. “Se o PMDB agir no Congresso em meio a interesses fragmentados de grupos e alas não terá como ocupar o espaço que é do tamanho do PMDB”, avaliou o governador de Sergipe, Jackson Barreto. “Ou você é da base, ou não é. Esse negócio de independência não existe”, emendou o vice-governador eleito de Minas Gerais, Antônio Andrade.
Para minar as resistências, Cunha tem ajustado seu discurso. “Quando a gente fez o blocão não era contra o governo, e sim contra a hegemonia do PT”, afirmou em entrevista recente. Composto das bancadas do PMDB, PTB, PR, PSC e Solidariedade, o chamado “blocão” reúne cerca de 160 parlamentares que, em diferentes momentos, se rebelaram contra o governo. Essa é a principal base de apoio do deputado, que costura suas alianças de baixo para cima e por vezes surpreende os líderes partidários.
Não se trata, contudo, de um grupo tão coeso como gosta de propalar. Candidata mais votada para a Câmara em todo o Brasil, Clarissa Garotinho, do PR, filha do ex-governador Anthony Garotinho, promete seguir os passos do pai e fazer renhida oposição ao líder do PMDB. “O meu voto ele não vai ter. Vou trabalhar para que a bancada do PR esteja no campo de oposição a Cunha. Não concordo com os métodos. O Congresso precisa ter autonomia, independência e harmonia com o governo federal, mas de maneira alguma devemos ter no comando um chantageador-geral da República.”
Desde 2006, um acordo garante o revezamento das duas maiores bancadas, PT e PMDB, na presidência da Câmara. Após a gestão do peemedebista Henrique Eduardo Alves, os petistas reivindicam o posto. Os nomes mais cotados são de Arlindo Chinaglia e Marco Maia, que já comandaram a Casa e têm boa interlocução com a base. Uma ala do partido defende a candidatura de Guimarães. “Nada está definido”, diz Maia. “Uma das possibilidades é o PT abrir mão do posto por dois anos, para o PMDB ou para outra legenda aliada. Na medida em que Cunha rejeita qualquer diálogo conosco, entendo que estamos liberados para outras alianças.”
Na quinta-feira 6, Vicentinho reuniu a bancada petista para uma consulta sobre as diferentes alternativas na sucessão. À noite, Dilma os receberia num jantar de confraternização, assim como os novos parlamentares e governadores eleitos do partido. A estratégia da legenda, espera-se, deve ser definida até 13 de novembro, quando o PT realizará um seminário em Brasília.
“Precisamos de um nome capaz de unir a base, seja ele petista ou não. Na verdade, estamos bastante atrasados. Cunha constrói sua plataforma há tempos. Cresceu muito por assumir o papel de porta-voz dos insatisfeitos da base e peitar o governo num momento em que as relações entre o Executivo e o Legislativo estavam estremecidas”, afirma Chinaglia. “O jogo está no começo, e será disputado entre os incluídos. Muita gente se esquece, mas cerca de 40% dos atuais deputados não estarão mais aqui em 2015”.


*Reportagem publicada originalmente na edição 825 de CartaCapital, com o título “Correlação de forças”

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