A TECNOCRACIA NO COMANDO OU DE COMO AS BANANAS COMEM OS MACACOS
“Tecnocracia
e democracia são antitéticas [..] A democracia sustenta-se sobre a
hipótese de que todos os cidadãos podem decidir a respeito de tudo. A
tecnocracia, ao contrário, pretende que sejam convocados para decidir
apenas aqueles poucos que detêm conhecimentos específicos”
(Norberto Bobbio, O futuro da democracia)
Buenos Aires, ano de 2009, a presidenta da Argentina, Cristina Kirchner, destituiu o presidente do Banco Central, Martín Redrado,
por ele se recusar a cumprir a decisão do governo de criar um fundo
fiscal com reservas do BC.
A exoneração soou como um acinte para a "pátria financeira"; segundo alguns jornais, essa foi mais uma manifestação autoritária e populista - eles adoram essa palavra! - da Casa Rosada. Cristina Kirchner pode ser populista e ter pendores autoritários, mas ela foi eleita democraticamente. Como bem lembrou o Clóvis Rossi, não vem ao caso se a decisão presidencial é melhor ou pior para o país do ponto de vista técnico; o que interessa é que, politicamente, como presidente da República, Cristina tem legitimidade para tomá-la. Ao subalterno - no caso o presidente do BC - caberia obedecê-la. Mas na Argentina uma lei dos tempos de Menem concede independência ao BC para formular a política monetária. A Justiça, que já restituiu o presidente do BC ao seu cargo, deu a palavra final.
Sem entrar na discussão técnica da questão - a utilização das reservas é um problema
de ordem fiscal e não monetária - cabe lembrar que a idéia da
independência do BC foi gerada pelo malfadado "Consenso de Washington" e
adotada por vários países, alguns de maneira informal, como o Brasil,
outros explicitamente, como a Argentina. Que tal preceito tenha virado
lei no país vizinho não muda em nada o fato de que ele subverte
completamente o conceito de democracia, pois admite que técnicos sem
mandatos tenham mais poder que o mandatário legitimamente eleito. É a
"ditadura dos técnicos" na definição de Luiz Carlos Bresser-Pereira. De
maneira mais macunaímica, poderíamos dizer que é como se a banana
estivesse comendo o macaco.
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