Uma vez fodido...
Em meados dos anos 1990, como repórter da sucursal de
Brasília de O Globo, Leandro Fortes era então chefiado pelo
jornalista Franklin Martins. Por intermédio de um amigo de um amigo, ele havia
conseguido uma entrevista exclusiva com José Carlos Alves dos Santos,
ex-assessor da Comissão do Orçamento do Congresso Nacional. Estopim do chamado
“Escândalo dos Anões do Orçamento”, José Carlos estava preso num quartel da PM,
em Brasília, acusado de ter matado a própria mulher, Ana Elizabeth Lofrano, a
golpes de picareta. Pelo crime, além de ter participado do esquema de corrupção
no orçamento, ele pegou 20 anos de xadrez.
Ele foi à cadeia falar com ele, onde passou uma manhã
inteira ouvindo aquela besta-fera jogar todo tipo de merda no ventilador. Além
dos conhecidos participantes do esquema, José Carlos Alves dos Santos envolveu
mais um bando de gente, sobretudo políticos graúdos àquela altura com cargos
importantes no segundo governo Fernando Henrique Cardoso. Quando voltou à
redação, relatou a entrevista a Franklin que, imediatamente, mandou que ele
jogasse a entrevista no lixo.
- São acusações, sem provas, de um bandido.
Eram outros tempos, pois.
É preciso que se diga que essa matéria do Estadão repercutida
na íntegra até por concorrentes é, do ponto de vista técnico, correta. Se, de
fato, os repórteres tiveram acesso a um depoimento sigiloso de Marcos Valério,
isso é notícia. Não se discute esse aspecto.
O que se deveria discutir é se, do ponto de vista ético, vale a pena
acreditar no depoimento feito depois de Valério ter sido condenado no processo
do mensalão. Trata-se de uma estratégia mais do que previsível de um réu
apavorado diante da perspectiva de voltar para a prisão onde, segundo consta,
sofreu todo tipo de extorsão.
Marcos Valério esperou sete longos anos para revelar que,
após se reunir com José Dirceu e Delúbio Soares, no Palácio do Planalto, foi ao
gabinete presidencial receber um “ok” de Lula. Um réu desesperado por dizer
isso, é um direito dele, é um ato de humanidade aceitá-lo como tal. Mas
acreditar numa coisa dessas, para qualquer repórter que tenha passado mais de
seis meses em Brasília, é quase inacreditável.
Mas, de repente, Marcos Valério, o bandidão que
financiava o PT, passou a ser uma fonte altamente confiável. O depoimento
tardio de um condenado, sem base documental alguma, passou a ser mais uma prova
da participação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no “maior escândalo
de corrupção da história do Brasil”, quiçá de toda a civilização ocidental,
desde sempre.
O depoimento de Marcos Valério foi dado à subprocuradora
Cláudia Sampaio, mulher do procurador-geral Roberto Gurgel, casal responsável
pelo engavetamento da Operação Vegas, da Polícia Federal, que em 2009 detectou
as ligações criminosas entre o ex-senador Demóstenes Torres, do DEM de Goiás,
com o bicheiro Carlinhos Cachoeira.
O marqueteiro João Santana, o inesquecível Patinhas dos tempos
de Leandro Fortes como foca no Jornal da Bahia, talvez tenha cometido um
terrível erro ao aventar a possibilidade de Lula sair candidato ao governo de
São Paulo, em 2014.
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