O dia de fúria de Elliot Rodger é mais uma cena típica de uma
tragédia americana. Aos 22 anos, ele matou seis pessoas perto do campus
da Universidade da California, na bonita Santa Barbara, e feriu mais
sete. Morreu em seguida, perseguido pela polícia, com um tiro na cabeça,
aparentemente suicídio.
Elliot planejou o massacre. As três primeiras vítimas foram
esqueadas. Horas antes, postou um vídeo horripilante no YouTube chamado
“Retribution”, em que detalha seu plano. Fala em “punir as mulheres”
pelo que elas lhe fizeram.
“A faculdade é o momento em que todos experimentam coisas como sexo,
diversão e prazer”, diz. “Mas naqueles anos eu tive que apodrecer na
solidão. Não é justo. Vocês, garotas, nunca se sentiram atraídas por
mim.”
Elliot estava sendo tratado por vários terapeutas. Deixou muitas
pegadas na web. Fazia parte de um fórum chamado PuaHate.com, que se
dedica a detectar fraudes em “técnicas utilizadas por gurus de sedução”.
Um mês antes do ocorrido, a polícia o procurou, por insistência de sua
família. Oficiais conversaram com ele e não viram nada errado. Elliot
teria dito a amigos que, se os policiais tivessem realizado uma busca em
seu quarto, encontrariam suas armas.
Escreveu um manifesto de 141 páginas, uma espécie de nota de suicida
transformada em autobiografia, explicitamente misógino. O nome era “Meu
Mundo Distorcido”. Seu pai era o diretor de cinema Peter Rodger,
assistente do blockbuster “Jogos Vorazes”. Foi quem primeiro o
identificou para as autoridades.
Esse horror já está se tornando tão comum nos Estados Unidos que até a
cobertura da mídia passou a ser menos intensa. Segundo o site
especializado shootingtracker.com, houve 365 assassinatos em massa em 2013 — um para cada dia do ano.
O depoimento mais preciso sobre a loucura de Elliot Rodger foi dado
pelo cineasta Michael Moore, autor de “Tiros em Columbine”, o
documentário ganhador do Oscar que aborda a chacina em uma escola
acontecida em 1999.
Moore é um ativista do desarmamento da sociedade americana. “Eu não
tenho mais nada a dizer sobre o que é agora parte da vida normal”,
escreveu. “Tudo o que eu tinha a falar eu falei há 12 anos”.
Para Moore, enquanto os EUA não admitirem seu problema com a
violência e o governo não aprovar leis de porte de armas mais rigorosas,
a história está condenada a se repetir indefinidamente.
Eis seu testemunho:
Com o devido respeito àqueles que estão me pedindo para comentar
sobre o tiroteio de ontem à noite na UCSB em Isla Vista – Eu não tenho
mais nada a dizer sobre o que agora faz parte da vida americana normal.
Tudo o que tenho a falar sobre isso eu falei há 12 anos: somos um povo
facilmente manipulado pelo medo, que nos leva a colecionar um quarto de
bilhão de armas em nossas casas, muitas vezes facilmente acessíveis para
jovens, assaltantes, doentes mentais ou qualquer um que se encaixe no
momento.
Somos uma nação fundada na violência, aumentamos nossas
fronteiras por meio da violência e permitimos que os homens no poder
usassem a violência em todo o mundo para promover nossos chamados
“interesses (corporativos)”.
A arma, não a águia, é o nosso verdadeiro símbolo nacional.
Enquanto alguns países têm um passado mais violento (Alemanha, Japão),
mais armas per capita em casa (Canadá), e as crianças na maioria de
outros países assistam aos mesmos filmes violentos e joguem os mesmos
videogames, ninguém chega perto de matar o número de seus próprios
cidadãos em uma base diária como fazemos – e ainda assim nós não nos
fazemos essa pergunta simples: “Por que nós? Por que os EUA??”
Quase todos os nossos fuzilamentos em massa são cometidos por
homens brancos com raiva ou perturbados. Nenhum deles é cometido por
mulheres. Hmmm, por que isso? Mesmo quando 90% do público americano pede
leis de armas mais fortes, o Congresso se recusa – e, então, as pessoas
se recusam a removê-los do cargo.
Assim, a responsabilidade recai sobre nós, todos nós. Não vamos
aprovar as leis necessárias, mas o mais importante é que não vamos
considerar por que isso acontece aqui o tempo todo. Quando a Associação
Nacional do Rifle diz: “As armas não matam pessoas – pessoas matam
pessoas”, ela está certa até a metade.
Só que eu iria alterar isso para o seguinte: “As armas não matam
pessoas – americanos matam pessoas”. Aproveite o resto do seu dia e
tenha a certeza de que tudo isso vai acontecer de novo muito em breve.
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