A França está assassinando os ideiais democráticos republicanos a pretexto de defender os valores da República. A proibição do uso do véu muçulmano, que entrou hoje em vigor em todo o país, representa uma punhalada nos ideais do Iluminismo e da Revolução Francesa e a volta dos fantasmas da França de Vichy. Ao determinar o veto ao uso público do niqab e da burca, o governo de Nicolas Sarkozy encampa as teses da direita xenófoba de Jean-Marie Le Pen na esperança de lhes reconquistar os votos. A ideia de que a proibição do véu islâmico é uma defesa do laicismo e da sociedade aberta é temerária: e se as mulheres muçulmanas usarem o véu por opção própria, contra a resistência de pais e maridos?
"Frequentemente, elas definem o uso do niqab ou da burca como parte de uma jornada espiritual, aproximadamente nos mesmos termos com que devotas cristãs ou judias de outros tempos talvez explicassem sua decisão de 'tomar o véu'", diz o escritor Timothy Garton Ash. É claro que existem muitas mulheres muçulmanas que usam essas vestes por pressão de pais, irmãos ou maridos. Mas neste caso, o Estado deveria dar condições para que elas pudessem denunciar a violência. Ao determinar a interdição ao uso dos trajes muçulmanos, o Estado francês está sendo tão intolerante quanto os extremistas islâmicos que se insurgiram contra a publicação de caricaturas de Maomé.
"Podemos não gostar de sua escolha. Podemos achá-la preocupante e ofensiva. Mas, à sua maneira, ela é uma forma de liberdade de expressão como os quadrinhos sobre Maomé - que estas mulheres, por sua vez, acham preocupantes e ofensivos. E este é o acordo tácito numa sociedade livre: a mulher que usa a burca precisa tolerar os quadrinhos; o quadrinista precisa tolerar a burca", continua Ash.
A verdade é que a sociedade europeia, e a França em particular, jamais conseguiu integrar os "condenados da Terra" de suas antigas colônias que vieram para a metrópole. Uma concepção dita politicamente correta, mas na verdade estúpida, o multiculturalismo, trocou a integração dos imigrantes nessas sociedades pela "preservação de seus valores tradicionais", confinando-os em guetos culturais, numa forma não-assumida de apartheid. Com isso, foi reforçado o domínios de clãs e famílias sobre os indivíduos e fechadas as portas da integração.
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