"O ódio à democracia", livro de Jacques Rancière
por Renato Janine Ribeiro
Hoje, ninguém disputa o Poder Executivo atacando os programas de inclusão social. Eles se tornaram um consenso junto à grande maioria dos eleitores. Entretanto, um número expressivo de membros da classe média os desqualifica, alegando diversos pretextos. Para eles, o Brasil era bom quando pertencia a poucos. Assim, quando os polloi – a multidão – ocupam os espaços antes reservados às pessoas de “boa aparência”, uma gritaria se alastra em sinal de protesto.
O que é isso, senão o enorme mal-estar dos privilegiados quando se
expande a democracia? Democracia é hoje um significante poderoso,
palavra bem-vista e que agrega um número crescente de possibilidades,
indo da eleição pelo povo até a igualdade entre os parceiros no amor.
Mas essa expansão da democracia incomoda. Daí, um ódio que domina nossa
política, tal como não se via desde as vésperas do golpe de 1964,
condenando medidas que favorecem os mais pobres como populistas e
demagógicas.
Por isso são relevantes ensaios sustentando que a democracia não é um
Estado acabado, nem um estado acabado das coisas; que ela vive constante
e conflitiva expansão; que não se reduz ao desenho das instituições, ou
à governabilidade, ou ao jogo dos partidos, mas é algo que vem de
baixo, desdenhado desde os gregos como o empenho insolente dos pobres em
invadir o espaço que era de seus melhores, de seus superiores. Porque a
ideia de separação social continua presente e forte. Se as ditaduras
deixaram, desde os anos 1980, de tutelar a maior parte da humanidade, se
governos eleitos proliferam, se a orientação sexual dissidente é mais
bem aceita hoje, isso não significa que se tenha completado a democratização
das formas de convivência social.
E é justamente essa recusa da hierarquia que tem a ganhar com a leitura deste livro de Jacques Rancière que, à luz dos clássicos como da experiência francesa e mundial, continua um trabalho sempre renovado, jamais concluso, de afiar o gume da democracia.
E é justamente essa recusa da hierarquia que tem a ganhar com a leitura deste livro de Jacques Rancière que, à luz dos clássicos como da experiência francesa e mundial, continua um trabalho sempre renovado, jamais concluso, de afiar o gume da democracia.
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