Uma nação não deve sentir vergonha, mas, sim, orgulho de colocar a casa em ordem
O artigo abaixo foi publicado originalmente no site da BBC Mundo
HAVANA - Cuba é um país de boatos, a Rádio Rumor – a transmissão oral de um
cubano para outro, em toda a ilha, é o meio pelo qual os cidadãos se
mantêm informados e, por vezes, desinformados sobre os mais delicados
assuntos da realidade nacional.
Nos últimos anos, relatos conflitantes circulam sobre personalidades
importantes. As histórias vão desde casos de corrupção grave até de
políticos recrutados pela CIA.
“Você não pode acreditar em ninguém”, disse um antigo professor sobre
o desvio de recursos que teria ocorrido em várias das empresas ligadas
ao historiador de Havana Eusebio Leal, um dos intelectuais mais
respeitados dentro e fora de Cuba.
Diz um velho ditado que “onde há fumaça, há fogo”, mas isso em Cuba
equivale a um incêndio. A mídia do exterior sugeriu imediatamente que
Leal é cúmplice da corrupção de seus subordinados.
Até mesmo os funcionários do governo têm-me perguntado o que eu
conheço da matéria, não sei se por estarem realmente interessados em
obter informações ou para “testar” o público, embora seja provavelmente
uma soma de ambos.
Outro boato que viaja o país é sobre o presidente do parlamento
cubano, Ricardo Alarcón, um comunista histórico que não está mais na
lista dos membros nomeados para as próximas eleições sem nenhuma
explicação até agora.
Coincide com a prisão de seu braço direito Miguel Alvarez. Não há
qualquer informação oficial, mas a história nas ruas é que “Miguelito”
foi recrutado pela CIA e estaria enviando informações através de sua
esposa.
Muito antes, o general cubano Rogelio Acevedo, veterano de Sierra
Maestra, foi removido de seu posto de chefe da Aviação Civil. Pouco
tempo depois se descobriu que se tratava de um sério caso de corrupção.
A luta contra a corrupção nas altas esferas está produzindo efeitos,
com dezenas e dezenas de dirigentes na prisão, removidos e substituídos.
Ministros, vice-ministros, diretores de grandes empresas, gestores e
administradores sentem que as coisas mudaram, finalmente, e as armas
estão apontadas para os “filhinhos de papai” ou para os próprios pais.
No entanto, a falta de transparência do governo nesses casos aumenta o
fluxo de rumores que circulam em todo o país e é ampliado em Miami,
criando a impressão de que todos são corruptos e não se pode confiar em
ninguém.
Um trabalhador que faz uma besteira pode ser admoestado publicamente.
Por que não aplicar a mesma política para aqueles que fizeram muito
mais dano para a economia nacional?
A corrupção não é exclusiva de Cuba e do socialismo. Ela está
presente em todos os países de qualquer ideologia. Ninguém está imune.
Aparece entre empresários, políticos, advogados, juízes, banqueiros,
construtores, soldados, jornalistas e bilionários.
Eu não acho que estejamos testemunhando em Cuba o aumento da
corrupção de “colarinho branco”. Uma nação não deve se sentir
envergonhada, mas orgulhosa de colocar a casa em ordem e lavar a
sujeira.
Mas uma maior transparência nesses processos envia uma mensagem mais
clara para aqueles que gerenciam recursos públicos. Isso elimina rumores
maliciosos, protege a integridade das pessoas inocentes e dá a
verdadeira dimensão do problema.
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