A MÍDIA E OS JUÍZES
"A mídia e o STF estabeleceram uma parceria. Uma pauta o outro, que
fornece à primeira novos argumentos. Vão
se alimentando reciprocamente,
como se compartilhassem as mesmas intenções."
Por Marcos Coimbra*
Ainda há quem duvide quando ouve que a mídia brasileira é
partidarizada. Que tem posição política e a defende com unhas e dentes.
Por opção ideológica e preferência político-partidária,
ela é contra o PT. Desaprova os dois presidentes da República eleitos
pelo partido e seus governos. Discorda, em princípio, do que dizem e
fazem seus militantes e dirigentes.
A chamada “grande imprensa” é formada por basicamente
quatro grupos empresariais.
Juntos, possuem um vasto conglomerado de
negócios e atuam em todos os segmentos da indústria da comunicação. Têm
um grau de hegemonia no mercado brasileiro de entretenimento e
informação incomum no resto do mundo. É coisa demais na mão de gente de
menos.
Afirmar que ela faz oposição ao PT e a seus governos não é uma denúncia vazia, uma “conversa de petista”.
Ficou famosa, pela sinceridade, a declaração da presidente
da Associação Nacional de Jornais (ANJ) e diretora-superintendente do
Grupo Folha, Judith Brito, segundo quem “(...) os meios de comunicação
estão fazendo de fato a posição oposicionista deste País, uma vez que a
oposição está profundamente fragilizada”.
Disse isso em março de 2010 e nunca se retratou ou foi
desautorizada por seus pares ou empregadores. Pelo contrário. Cinco
meses depois, foi reconduzida, “por aclamação”, à presidência da ANJ.
Supõe-se, portanto, que suas palavras permanecem válidas e continuam a
expressar o que ela e os seus pensam.
A executiva falava de maneira concreta. Ela não defendia
que a mídia brasileira fizesse uma oposição abstrata, como a que aparece
no aforismo “imprensa é oposição, o resto é armazém de secos e
molhados”. Propunha que atuasse de maneira tipicamente política: contra
uns e a favor de outros.
O que dizia é que, se a oposição partidária e institucionalizada falha, alguém tem que “assumir a responsabilidade”.
O modelo implícito no diagnóstico é o mesmo que leva o
justiceiro para a rua. Inconformado com a ideia de que os mecanismos
legais são inadequados, pega o porrete e vai à luta, pois acha que “as
coisas não podem ficar como estão”.
Se os políticos do PSDB, DEM, PPS e adjacências não
conseguem fazer oposição ao PT, a imprensa toma o lugar. Proclama-se
titular da “posição oposicionista deste País”, ainda que não tenha voto
ou mandato.
Enquanto o que estava em jogo era apenas a impaciência da
mídia com a democracia, nenhum problema muito grave. Por mais que seus
editorialistas e comentaristas se esmerassem em novas adjetivações
contra o “lulopetismo”, pouco podiam fazer.
Como dizia o imortal Ibrahim Sued, “os cães ladram e a
caravana passa” - entendendo-se, por caravana, Lula, Dilma, o PT e sua
ampla base na sociedade, formada por milhões de simpatizantes e
eleitores.
Aí veio o julgamento do “mensalão”.
A esta altura, devem ser poucos os que ainda acreditam que
a cúpula do Judiciário é apolítica. Os que continuam a crer que o
Supremo Tribunal Federal (STF) é uma corte de decisão isenta e razoável.
Desde o início do ano, seus integrantes foram pródigos em
declarações e atitudes inconvenientes. Envolveram-se em quizílias
internas e discussões públicas. Mostraram o quanto gostavam da
notoriedade que a aproximação do julgamento favorecia.
Parece que os ministros do STF são como Judith Brito:
inquietos com a falta de ação dos que têm a prerrogativa legítima,
acharam que “precisavam fazer alguma coisa”. Resolveram realizar, por
conta própria, a reforma da política.
O STF não é o lugar para consertá-la e “limpá-la”, como
gostam de dizer alguns ministros, em péssima alusão a noções de
higienismo social.
Mas o mais grave é a intencionalidade política da “reforma” a que se propuseram.
A mídia e o STF estabeleceram uma parceria. Uma pauta o
outro, que fornece à primeira novos argumentos. Vão se alimentando
reciprocamente, como se compartilhassem as mesmas intenções.
A pretexto de “sanear as instituições”, o que desejam é atingir adversários.
O julgamento do “mensalão” é tão imparcial e equilibrado
quanto a cobertura que dele faz a “grande imprensa”. Ela se apresenta
como objetiva, ele como neutro. Ambos são, no entanto, essencialmente
políticos.
As velhas raposas do jornalismo brasiliense já viram mil
vezes casos como o do “mensalão”, mas se fingem escandalizadas. Vivendo
durante anos na intimidade do poder, a maioria dos ministros presenciou
calada esquemas para ganhar mais um ano de governo ou uma reeleição, mas
agora fica ruborizada.
O que ninguém imaginava era quão simples seria para a mídia ter o Supremo a seu lado. Bastavam algumas capas de revista.
E agora que se descobriram aliados, o que mais vão fazer juntos?
*Via sítio www.brasil247.com
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