"Esse
nobre rei era chamado Gengis Khan, que em seu tempo tinha tal renome
que não havia em lugar algum, em região alguma, um soberano tão eminente
em todas as coisas"
Geoffrey Chaucer,
O Conto do Fidalgo, in Os Contos da Cantuária (c. 1395)
Não
me recordo quem cunhou a expressão - talvez tenha sido o Paulo Francis -
"Fulano está à direita de Gengis Khan", significando que esse alguém
tinha pendores togloditas e psicotapas, tipo Hitler, Videla, Pinochet,
Stálin ou Pol Pot. Isso porque o líder mongol Gengis Khan
(1162-1227) frequentemente foi associado à barbárie, à violência e à
crueldade, como Átila, o Huno.
Essa visão foi sedimentada no século XVIII pela percepção europeísta dos iluministas franceses. Estudos recentes, contudo, mostram uma realidade muito diferente: Gengis Khan criou um império que, embora feito à base de conquista - mas qual império poderia atirar a primeira pedra impunemente? -, unificou tribos nômades, favoreceu o comércio, criou o papel moeda e praticou a tolerância religiosa. O historiador e antropólogo Jack Weartherfod, de Minnesota, pesquisou profundamente a história de Gengis Khan e do império mongol e resgatou as conquistas dos mongóis para a civilização:
Essa visão foi sedimentada no século XVIII pela percepção europeísta dos iluministas franceses. Estudos recentes, contudo, mostram uma realidade muito diferente: Gengis Khan criou um império que, embora feito à base de conquista - mas qual império poderia atirar a primeira pedra impunemente? -, unificou tribos nômades, favoreceu o comércio, criou o papel moeda e praticou a tolerância religiosa. O historiador e antropólogo Jack Weartherfod, de Minnesota, pesquisou profundamente a história de Gengis Khan e do império mongol e resgatou as conquistas dos mongóis para a civilização:
"Em
uma conquista após a outra, o exército mongol transformou a guerra em
um acontecimento internacional de múltiplas frentes, que se estendiam
por milhares de quilômetros. As técnicas de luta inovadoras de Gengis
Khan tornaram obsoletos os cavaleiros da Europa medieval com suas
armaduras pesadas, substituídos por uma cavalaria disciplinada que se
movimentava em unidades coordenadas. Em vez de confiar em fortificações
defensivas, Gengis Khan fez uso brilhante da velocidade e da surpresa no
campo de batalha, bem como aperfeiçoou a guerra de sítio a ponto de
acabar com a era das cidades muradas. Gengis Khan não apenas ensinou seu
povo a lutar através de distâncias incríveis, mas a manter a campanha
por anos, décadas e, finalmente por mais de três gerações de luta
incessante.
Em
25 anos, o exército mongol subjugou mais terras e povos do que os
romanos em 400. Gengis Khan, justamente com seus filhos e netos,
conquistou as civilizações mais densamente povoadas do século XIII.
[...] O império de Gengis Khan conectou e amalgamou as várias
civilizações em torno de si em uma nova ordem mundial. Quando de seu
nascimento em 1162, o Velho Mundo consistia numa série de civilizações
regionais, cada uma podendo afirmar desconhecer virtualmente qualquer
civilização além de sua vizinha mais próxima. Ninguém na China havia
ouvido falar da Europa, e ninguém na Europa havia ouvido falar da China
e, até onde se sabe, nenhuma pessoa havia feito a jornada de um país ao
outro. Quando da sua morte, em 1227, Gengis Khan havia ligado essas
áreas por meio de contatos diplomáticos e comerciais que permanecem
intactos até hoje.
À medida que destruía o sistema feudal de privilégio aristocrático e linhagem, Gengis
Khan construía um excepcional sistema baseado no mérito individual, na
lealdade e competência. Encontrou cidades mercantis desarticuladas e
langorosas ao longo da Rota da Seda e organizou-as na maior zona de
livre comércio da história. Baixou os impostos para todos e aboliu-os
completamente para médicos, professores, padres e instituições
educacionais. Estabeleceu um censo regular e criou o primeiro sistema
postal internacional. Seu império não era de acumulação de riquezas e
tesouros; em vez disso, distribuía amplamente as mercadorias obtidas em
batalha para que pudessem retornar para a circulação comercial. [ ...]
Em uma época em que a maioria dos governantes considerava-se acima da
lei, Gengis Khan insistia em que as leis considerassem os governantes
tão responsáveis quanto o pastor mais simples. Concedeu libertade
religiosa dentro de seus domínios; no entanto demandou lealdade
absoluta dos indivíduos conquistados de todas as religiões. Insistiu na
soberania da lei e aboliu a tortura, mas armou campanhas importantes
para encontrar e matar salteadores e assassinos terroristas. Gengis
recusou-se a manter reféns e, em vez disso, instituiu a prática original
de conceder imunidade diplomática para todos os embaixadores e
emissários, incluindo aqueles de nações hostis contra as quais ele
estava em guerra. [...]
The ocidental soldier - Mantos, túnicas e meiões, foram substituídos |
Aparentemente
todos os aspectos da vida europeia - tecnologia, técnicas de guerra,
roupas, comércio, alimentação, literatura e música - mudaram durante a
Renascença como resultado da influência mongol. Além das novas
formas de combate, novas máquinas e novos alimentos, mesmo os aspectos
mais rotineiros da vida cotidiana mudaram na medida em que os europeus
passaram a usar os tecidos mongóis, vestindo calças e casacos em vez de
túnicas e mantos, tocar seus instrumentos musicais com o arco da estepe
em vez de dedilhá-los e pintar seus quadros com um novo estilo. Os
europeus chegaram a usar a exclamação mongol hurray como uma expressão entusiasmada de bravata e encorajamento mútuo. [...]
Com
a passagem dos séculos, os acadêmicos ponderaram as atrocidades e
agressões cometidas por homens como Alexandre, César, Carlos Magno ou
Napoleão contra suas realizações ou sua missão especial na história. No
caso de Gengis Khan e os mongóis, entretanto, suas realizações foram
esquecidas, enquanto que seus alegados crimes e brutalidade foram
exagerados. Ele se tornou o estereótipo do bárbaro, do selvagem
sanguinário, do conquistador implacável que apreciava a destruição por
si só. Gengis Khan, a sua horda mongol, e em grande parte o povo
asiático em geral tornaram-se criaturas unidimensionais, o simbolo de
tudo que está além dos limites civilizados."
Kublai Khan, neto de Gengis Khan, com Marco Polo |
Jack Weatherford, Gengis Khan e a Formação do Mundo
Postado por Cláudio Camargo, em seu Blog
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