Deborah Secco e Zezé Perrella: carona no helicóptero
A família Perrella tem negócios em Minas Gerais que vão da produção
de carne e cultivo de sementes de feijão, arroz e milho a negociação no
mercado de futebol profissional.
Donos de avião e de helicóptero, mantêm amizades com famosos e são conhecidos pelas festas que oferecem na Fazenda Guará, propriedade cinematográfica no município de Morada de Minas.
A família tem poder e dinheiro, mas, analisada a declaração de bens
do senador Zezé Perrella, disponível na Justiça eleitoral, o que se vê é
um cidadão de patrimônio relativamente pequeno: R$ 490 mil.
Ele tem cotas de empresas, conta em bancos e um Mereces Benz, seu
maior patrimônio declarado, no valor de R$ 180 mil reais. Zezé não
declara nem casa para morar.
Mas promotores de Minas Gerais descobriram que o senador mora num
imóvel registrado em nome da Limeira Agropecuária e Participações Ltda.,
empresa que é uma das chaves para entender os segredos das finanças da
família Perrella.
A Limeira Agropecuária é também titular do contrato de leasing do
helicóptero Robinson 66, apreendido pela Polícia Federal no município de
Afonso Cláudio, no Espírito Santo, em novembro do ano passado, com 445
quilos de pasta base de cocaína.
A empresa Limeira, fundada pelo senador Perrella e hoje sob controle
acionário de dois filhos, é proprietária da Fazenda Guará, que, além das
festas, proporcionou à família um contrato milionário com o governo de
Minas Gerais, através de uma empresa de pesquisa agropecuária, a Epamig.
A Epamig deu à Limeira sementes de feijão, arroz, milho e sorgo, com
garantia de compra de toda a produção para o Programa Minas Sem Fome,
uma versão local do Fome Zero.
Zero era o risco da Limeira nesse contrato. Não houve licitação e, em
quatro anos, a empresa recebeu mais de R$ 14 milhões do governo do
Estado.
Segundo o Ministério Público, não se sabe quanto da produção foi
efetivamente entregue ao Programa Minas Sem Fome. Na única vez em que
houve fiscalização, descobriu-se que, numa safra em que se esperavam
quase 200 toneladas de grãos, a fazenda entregou efetivamente 27
toneladas.
O caso resultou numa ação por improbidade administrativa movida
contra o senador Perrella, o filho Gustavo e os ex-presidentes da
Epamig.
Na ação, o Ministério Público afirma: “Suspeita-se que o preço da
produção tenha sido superestimado. É desconhecida, ainda, a forma de
controle da distribuição dos produtos agrícolas adquiridos e destinados
ao programa Minas sem Fome.”
Outra grave irregularidade desse contrato é o fato de que a Limeira
não poderia ter contratos com o governo do Estado, por ter, primeiro, o
senador Zezé e, depois, Gustavo entre seus acionistas.
A Constituição do Estado de Minais Gerais proíbe contratos entre o
governo do Estado e empresas que tenham deputados estaduais entre seus
controladores, como é o caso da Limeira.
Em Minas Gerais, o sobrenome Perrella aparece em outros negócios suspeitos com o governo.
Dois dos restaurantes que servem à Cidade Administrativa, vitrine do governo Aécio Neves, foram concedidos sem licitação ao senador Zezé Perrella.
Ao investigar a denúncia, o Ministério Público descobriu que, na área de alimentação, as irregularidades eram bem mais graves.
Alvimar de Oliveira Costa, que sucedeu o irmão Zezé na presidência do
Cruzeiro, é um dos proprietários da Stillus Alimentação, a principal
fornecedora de refeições para os presídios.
Em dois desses presídios, a empresa cobrava pelo transporte do
marmitex, mas a comida era feita na própria cadeia, em cozinhas
clandestinas.
O caso resultou em duas ações na Justiça, uma na área civil, em que o
Ministério Público pede a devolução de mais de R$ 80 milhões, e outra
na esfera criminal, em que Alvimar é um dos denunciados por corrupção e
fraude em licitação.
Em Minas Gerais, até os gandulas do Cruzeiro sabem que Alvimar agiu
sempre à sombra do irmão. Por conta dessas ações, os bens da família
foram bloqueados, em decisões recentes da Justiça, tomadas depois da
apreensão do helicóptero com cocaína. Coincidência?
No rastro da apreensão de cocaína em Afonso Cláudio, o Ministério Público confirmou, numa inquérito civil público, que o combustível da aeronave foi pago pela Assembleia Legislativa, através de reembolsos solicitados pelo deputado Gustavo Perrella.
Em um ano, a conta ficou em R$ 15 mil. Seria uma despesa legal, não
fosse o fato de que o helicóptero era usado para serviços extraoficiais,
como viagem para festas na fazenda e passeios em Vitória e Rio de
Janeiro.
“Transportei muitos amigos e artistas”, contou o piloto Rogério
Almeida Antunes, num depoimento prestado em Minas Gerais, depois que ele
foi solto da prisão no Espírito Santo por tráfico de drogas.
Na conversa com os promotores, ele contou que uma das passageiras
mais frequentes é a atriz Deborah Secco, que foi namorada do jogador
Roger, ambos amigos do senador Perrella.
O inquérito civil público, em fase final, deve resultar em uma denúncia contra o deputado Gustavo Perrella.
“Ele pode pedir reembolso pelo combustível, desde que o helicóptero
seja usado em viagens exclusivamente a serviço do mandato. Está evidente
que este não era é o caso”, diz o promotor Eduardo Nepomuceno.
A Assembleia legislativa também pagou por outros voos particulares do
senador Zezé Perrella. Quando ele era deputado estadual, entre 2007 e
2011, recebeu mais de R$ 100 mil como reembolso de despesas com
combustível de seu avião.
Na prestação de contas de Zezé, o Ministério Público encontrou até
uma nota do aeroporto de Salvador, num dia em que a capital baiana
realizava o seu Carnaval fora de época.
Zezé Perrella deixou a Assembleia em 2011, depois que se elegeu
primeiro suplente na chapa ao Senado encabeçada pelo ex-presidente
Itamar Franco.
Itamar estava no PMDB e Perrella, no PDT, mas ambos eram aliados de Aécio Neves. Amigos de Itamar contam que ele tentou resistir à inclusão de Perrella na sua chapa, mas cedeu à vontade de Aécio Neves, também candidato ao Senado e, como ex-governador, o principal chefe político do Estado.
Octogenário ao se eleger, Itamar morreu pouco tempo depois de eleito, abrindo espaço para o suplente Perrella.
O promotor Eduardo Nepomuceno diz que não pedirá apenas o reembolso
das despesas de combustível tanto de Gustavo quanto de Perrella, mas a
condenação de ambos por improbidade administrativa.
Em Belo Horizonte, eu procurei o gabinete do deputado Gustavo e pedi
para falar tanto com ele quanto com o senador. Apresentei a lista de
assuntos, incluindo o caso da cocaína encontrada no helicóptero da
família.
O assessor de imprensa, Davi Teodoro, me recebeu na recepção e, em pé, disse que o deputado não tinha tempo para dar entrevista.
Deixei o telefone para que ele agendasse uma reunião. Não tive
retorno. Insisti no tema do helicóptero e a resposta de Davi: “Esse
caso está encerrado. A Polícia Federal inocentou o deputado”.
No dia em que procurei Gustavo, ele tinha participado da convenção do
seu partido, o Solidariedade. Quando estourou o caso do helicóptero, o
pai de Gustavo, o senador Perrella, chegou a dizer que a família pensava
abandonar a política, com frases como “não precisamos disso para
viver”.
Passados sete meses da apreensão do helicóptero e com os traficantes
soltos e o processo na Justiça Federal do Espírito Santo caminhando para
o arquivo, a família decidiu não só permanecer na política como buscar
cargos mais elevados
Na convenção do Solidariedade, decidiu-se fechar aliança com o grupo político de Aécio Neves e reservar para Gustavo a legenda de candidato a deputado federal. Ele pretende deixar a Assembleia Legislativa de Minas para ir a Brasília. Por enquanto, sem o helicóptero.
A aeronave continuará no Espírito Santo até que o Tribunal Regional Federal do Rio de Janeiro julgue o pedido de devolução da máquina aos Perrella.
O candidato a governador de Aécio Neves em Minas Gerais é o tucano
Pimenta da Veiga, numa coligação de vinte partidos, entre os quais o
Solidariedade de Gustavo e o PDT de Zezé.
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