A publicação do texto de Paxton é extremamente oportuna. Terminada a Guerra Fria, desde 1991, e com a recuperação da capacidade de ir além dos termos do debate dos anos 50 e 60 - em especial o beco sem saída da teoria do totalitarismo - o livro se propõe a rever alguns mitos e dogmas da história dos fascismos.
Paxton também se pergunta sobre a extensão e as origens dessa época dos fascismos. Para o autor, pode-se falar em fascismos desde às vésperas da Primeira Guerra (1914-1918), desvinculando o fascismo das analises historicistas que o explicam exclusivamente através da Paz de Versalhes ou da grande crise econômica de 1929. Assim, a primeira Ku Klux Klan, o movimento eugenista norte-americano, e várias versões biologizantes da história, seriam os sinais iniciais da aparição dos fascismos.
O autor dedica-se, de forma vigorosa, a explicitar o debate sobre os fascismos como uma "doença da sociedade liberal". Procura identificar o que é claramente europeu nos fascismos, oriundo da própria cultura européia e não exatamente um corte com esta cultura. Da mesma forma, Paxton é cuidadoso em não construir e, em verdade, negar a existência de uma linearidade entre uma forma qualquer de pensamento (Nietzche) ou uma especificidade histórica (como queria Daniel Goldhagen) e os fascismos. Paxton, com uma grande erudição, passeia por vários autores europeus e nos mostra como a apropriação de textos, temas e autores pelos ideólogos fascistas foi feita a posteriori, de forma parcial e na maioria das vezes inapropriadamente.
Para Paxton, o elemento central da analise dos fascismos seria entender como puderam chegar ao poder. Insiste, de forma correta, nas versões muito comuns na imprensa e entre publicistas desavisados sobre a chegada legal e democrática dos fascismos ao poder. Ao tratar da relação dos partidos e dos movimentos fascistas demonstra, com forte material estatístico, que os fascismos jamais conseguiram a simpatia da metade das populações da Alemanha ou Itália, além de impor guerras e ditaduras para chegar ao poder na Espanha, na Hungria ou na Eslováquia.
O segredo da vitória fascista residiria bem mais no apoio que recebeu das forças tradicionais das sociedades europeias, muito especialmente dos partidos e movimentos conservadores e, mesmo, de liberais. Para explicar tal paradoxo, Paxton busca um criativo conceito de "paixões mobilizadoras" como o clima político, social e mental que permite a ascensão dos fascismos. Para o autor, tais "paixões" implicam no sentimento geral de frustração e perda, no nacionalismo exacerbado e no sentimento de fazer parte de um grupo social vitima de uma injustiça.
Esses são pontos extremamente pertinentes para a discussão dos fascismos, mas também dos sentimentos de perda que embalam vastas camadas sociais na nova ordem mundial.
Por Francisco Carlos Teixeira da Silva
Jornal do Brasil, Caderno Idéias, 27 de outubro de 2007.
FONTE: SILVA, Francisco Carlos Teixeira da. Resenha: A anatomia do Fascismo. Rio de janeiro: Revista Eletrônica Boletim do TEMPO, ano 2, n. 27, 2007.[ISSN 1981-3384]
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