Deu na Bloomberg, agência de notícias americana ligada à área de economia e negócios.
Mitt Romney, o candidato republicano à presidência dos Estados
Unidos, deu um jeito de transferir dinheiro graúdo para seus herdeiros
pagando uma taxa muito abaixo do que a legislação estipula.
Ele se valeu de um mecanismo que os especialistas americanos em planejamento fiscal – leia-se evasão – apelidaram de “I Dig It”, uma expressão associada a trapaça. É algo intensamente usado por milionários americanos. Você cria uma empresa para os herdeiros, transfere ativos para ela e, assim, evita os impostos habituais. Como escreveu a Bloomberg, é uma coisa complicada, aparentemente, mas que quase todos os superricos americanos dominam à perfeição – eles e seus advogados.
“Romney usa toda espécie de truque que existe nos livros para pagar menos impostos”, disse à Bloomberg Stephen Breiststone, especialista em tributação. “Mas estão sendo jogadas tantas luzes sobre o assunto agora que, daqui por diante, as coisas vão ficar mais complicadas para gente como Romney.”
Obama tem explorado ao máximo a esperteza fiscal de seu oponente, e é possível que sua reeleição derive disso.
Romney é o multimilionário típico americano. Nas últimas três
décadas, abriram-se aos ricos e às grandes corporações – e não apenas
nos Estados Unidos – múltiplas oportunidadades de evitar impostos
devidos.
Os paraísos fiscais são a maior delas. Milionários e empresas
brasileiras, como mostrou um levantamento recentemente do TJN, um órgão
internacional baseado na Inglaterra e dedicado à justiça fiscal, colocam
maciçamente dinheiro nestes paraísos.
Não me surpreende que a mídia brasileira não tenha feito uma única reportagem sobre o Brasil no esplêndido estudo do TNJ. Assim como não me surpreende a copiosa quantidade de matérias pedidas pelos donos das empresas de mídia a respeito do assim chamado “Custo Brasil” – uma falácia que tenta colocar os empresários brasileiros, exímios planejadores fiscais, sob a aura de “vítimas do Leão”.
O que surpreende, negativamente, é o silêncio e a falta de
transparência da Receita Federal. Recentemente, a revista Veja publicou
que a Receita está cobrando na justiça uma dívida bilionária da Globo,
que parece ser mais criativa na contabilidade que no conteúdo.
É um tema de alto interesse público. Dinheiro de imposto constrói
escolas, hospitais, estradas etc. A Receita vai manter essa disputa – a
Globo alega que não deve – nos subterrâneos?
Mais que um erro, é um pecado.
Estas questões têm que vir à tona. Veja o que aconteceu dias atrás nos Estados Unidos. O Senado acusou,
publicamente, a Microsoft e a HP de usar táticas moralmente
indefensáveis para evitar impostos. Segundo um comitê do Senado que
investiga o comportamento das empresas americanas na questão das taxas,
apenas entre 2009 e 2011 a Microsoft, com o uso de paraísos fiscais,
deixou de recolher 4,5 bilhões de dólares em impostos.
Enquanto isso, Bill Gates faz fama de filantropista. Alguém deveria
dizer para ele: “Ei, Bill, preferimos que você pague impostos
direitinho, ok?”
Grandes corporações e bilionários se adestraram na arte do planejamento fiscal. O problema é que, como mostra a Grécia, quando não pagar impostos se entranha na cultura de uma sociedade, o país quebra.
Por que a Escandinávia vai bem enquanto o resto vai mal? Porque se
estabeleceu lá um consenso segundo o qual quem tem mais tem que pagar –
direito – o imposto devido.
O que não dá para aguentar é o cinismo de Romney e congêneres mundo afora. Eles atacam o “Nanny State”, o Estado Babá, aquele que protege os interesses da sociedade como um todo. Mas, ao mesmo tempo, eles criam um Estado que os trata como babá.
É por coisas assim que você tem visto a onda de protestos que varre o
globo. Vi uma reportagem sobre manifestações na França. Uma mulher de
uns 40 anos que marchava contra o pacote de austeridade afirmou: “Eles
querem cortar nossos benefícios, mas não fazem nada para taxar os ricos
que colocam seu dinheiro nos paraísos fiscais”.
Em sua simplicidade franciscana, a revoltada francesa disse tudo. Os
governos dos países desenvolvidos nada fizeram para proteger seus cofres
do planejamento fiscal predador. Depois querem cobrar a conta das
viúvas e dos aposentados?
O povo é bom, mas não é burro – e a paciência tem limites
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